O verdadeiro valor da abstenção

Não aceitem acriticamente os resultados oficiais e adoptem uma metodologia que lhes permita obter resultados mais próximos da realidade.

De acordo com os dados oficiais do Ministério da Administração Interna (MAI), o número de abstencionistas, em Portugal continental e ilhas, nas recentes eleições para a Assembleia da República, teria sido de 4.059.250, a que corresponderia uma taxa de abstenção de 43%. Estes números estão, a nosso ver, fortemente sobrestimados, como consequência de permanecerem nos cadernos eleitorais inúmeros indivíduos já falecidos ou emigrados. Apenas o número de votantes, 5.380.451, é credível, porque efectivamente contado. Persistem, no entanto, nos órgãos de informação, e não só, comentários acríticos sobre os valores oficiais da abstenção, como se estes traduzissem a realidade.

Qual terá sido então, e a nosso ver, o verdadeiro valor da abstenção?

Para chegar a um número mais próximo da realidade, socorremo-nos de algumas estatísticas do Instituto Nacional de Estatística, do Ministério da Administração Interna e da Pordata. Para maior simplicidade e mais fácil leitura, e também porque alguns valores que apresentamos são estimativos, ainda que baseados em números oficiais, assumimos a opção de arredondar todos os números à casa dos milhares.

De acordo com o Censo 2011, a população de nacionalidade portuguesa, residente em Portugal, continental e ilhas, seria, no final desse ano, de aproximadamente 9.690.000 indivíduos;

Desse número haveria cerca de 7.874.000 indivíduos, com idade igual ou superior a 18 anos, ou seja, potenciais eleitores nessa data;

Desde 2011 até à data das recentes eleições legislativas, ocorreu um forte surto de emigração de que estimamos a perda de cerca de 250.000 votantes;

Ainda desde final de 2011 até às eleições de Outubro de 2015, o saldo entre a entrada de novos eleitores, por terem entretanto atingido os 18 anos de idade, e o número de óbitos registado, no mesmo período de tempo, foi relativamente equilibrado, pelo que o dispensamos no nosso cálculo dado ser praticamente neutro;

O número de pessoas, habitando em Portugal, em condições de poder exercer o seu direito de voto, seria assim de  7.874.000 - 250.000 = 7.624.000;

Sendo 5.380.000 o número de votantes efectivos nas legislativas de 2015, o número de abstencionistas tomaria o valor de: 7.624.000 - 5.380.00 = 2.244.000. No entanto, o número oficial de abstencionistas indicado pelo MAI foi de 4.050.000, ou seja, quase o dobro;

Temos assim uma taxa de abstenção de (2.244.000/ 7.624.000) x100 = 29,4%. Curiosamente, ao aplicar a mesma metodologia na determinação da taxa de abstenção, nas anteriores eleições legislativas de 2011, o valor da referida taxa é exactamente idêntico ao das eleições de 2015, contrariando assim as afimações veiculadas pelos media de que, de 2011 para 2015, a abstenção teria aumentado.

Nas estatísticas oficiais, o número de inscritos sobe continuamente, ano após ano, devido às deficiências que anteriormente apontámos na elaboração dos cadernos eleitorais, o que origina também, por si só, a contínua subida da taxa oficial de abstenção.

O que se exige a jornalistas, comentadores, técnicos de sondagens e outros intervenientes é que não aceitem acriticamente os resultados oficiais e adoptem uma metodologia que lhes permita obter resultados mais próximos da realidade. Poupar-nos-iam a uma informação que tende a transformar-se no mito de que a abstenção não pára de aumentar.

Engenheiro civil

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