Portugal tornou-se no primeiro país a falhar entrega de plano orçamental

Comissão Europeia insiste que Portugal deve apresentar sem mais demoras um projecto provisório de orçamento para o próximo ano.

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Maria Luís Albuquerque e Pedro Mota Soares reagiram aos mais recentes números do INE Enric Vives Rubio

Portugal foi o primeiro país a não apresentar atempadamente em Bruxelas o projecto orçamental desde a entrada em vigor do duplo pacote legislativo de reforço da supervisão orçamental na área euro, indicou esta sexta-feira a Comissão Europeia.

"Desde a introdução do 'two-pack', em 2013, todos os Estados-membros que tinham de apresentar os planos orçamentais até 15 de Outubro fizeram-no", confirmou a porta-voz dos Assuntos Económicos, durante a conferência de imprensa diária da Comissão, quando questionada sobre se o atraso de Portugal verificado este ano era inédito.

Annika Breidthardt realçou que a insistência no cumprimento do calendário "não se trata de a Comissão ser burocrática", mas sim ter "dados comparáveis para poder determinar as tendências orçamentais subjacentes, estabelecer a situação orçamental na zona euro como um todo, e assegurar igualdade de tratamento para todos". 

A porta-voz acrescentou, todavia, que Bruxelas está "em contacto próximo (com as autoridades portuguesas) para resolver o assunto". "Sempre encontrámos soluções práticas no passado", referiu a porta-voz, reiterando a possibilidade prevista na legislação comunitária de um Governo que não está no uso pleno dos seus poderes orçamentais submeter apenas um plano orçamental baseado num cenário de políticas inalteradas, a ser actualizado e completado pelo novo executivo assim que entre em funções.

É nesse sentido que, um dia depois de expirado o prazo-limite para os países do euro entregarem os planos orçamentais para 2016, e de Portugal ter sido o único a não fazê-lo (Chipre e Grécia não apresentaram, mas por estarem sob programa, e como tal não terem de o fazer), a Comissão Europeia instou esta sexta-feira as autoridades portuguesas a apresentarem "sem mais demoras" um projecto provisório, a ser atualizado pelo Governo que for formado, um apelo que já vinha fazendo nas últimas semanas.

No dia seguinte à data-limite de 15 de Outubro para os Estados-membros da zona euro apresentarem à Comissão os seus planos orçamentais para o próximo ano, e depois de o primeiro-ministro em exercício, Pedro Passos Coelho, ter reiterado em Bruxelas, à margem de um Conselho Europeu, que "não faria sentido" apresentar agora qualquer documento, uma porta-voz da Comissão disse à Lusa que não é esse o entendimento de Bruxelas.

"O código de conduta do 'two pack' (ato legislativo da governação económica), acordado entre a Comissão e o Conselho, também estabelece procedimentos bem definidos que se aplicam a um Estado-membro com um governo que não está no uso pleno dos seus poderes orçamentais. Em tais casos, o governo cessante deve submeter um plano orçamental baseado num cenário de políticas inalteradas, enquanto o novo governo deve submeter um plano orçamental completo e actualizado assim que entre em funções", indicou.

Deste modo, e embora esteja ciente da actual situação política, "a Comissão instou Portugal a submeter um plano orçamental num cenário de políticas inalteradas, em cumprimento dos requerimentos legais", ou seja, um documento que é essencialmente um conjunto de projecções macroeconómicas e financeiras sem ter em conta medidas concretas a serem aplicadas.

"Uma vez que a data limite acabou de expirar, esperamos receber sem mais demoras o plano orçamental de Portugal num cenário de políticas inalteradas e, a devido tempo, o projecto completo de Orçamento de Estado do novo governo", disse.

A mesma porta-voz do executivo comunitário salientou ainda que, além de estar em causa o cumprimento das regras europeias, "também é importante que os Estados-membros submetam os seus planos orçamentais na mesma data-limite, de modo a fornecer a informação sobre as tendências orçamentais subjacentes necessária para facilitar a avaliação da situação orçamental da zona euro como um todo e garantir tratamento idêntico".

A mesma ideia havia sido já deixada pelo comissário dos Assuntos Económicos a 05 de Outubro passado, na última reunião dos ministros das Finanças da zona euro, tendo na ocasião Pierre Moscovici declarado que a Comissão não via "nenhuma razão para alterar a data" prevista no "semestre europeu" de coordenação de políticas económicas, sustentando, tal como o presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, que um futuro governo poderia apresentar um plano orçamental revisto e actualizado.

No entanto, o Governo português decidiu não apresentar qualquer documento até à data de 15 de Outubro, por considerar que, em função das eleições legislativas de 04 de Outubro, deve caber ao futuro executivo essa tarefa, como confirmou na passada segunda-feira o Ministério das Finanças, e reafirmou na quinta-feira o primeiro-ministro em exercício, no final de uma cimeira de chefes de Estado e de Governo da UE.

Segundo Passos Coelho, "não faria sentido que o Governo que está de saída apresentasse o projecto de um orçamento que não vai fazer", e "o que é importante do ponto de vista do cumprimento substancial das regras europeias é que a Comissão Europeia tenha acesso com alguma antecedência razoável - e o calendário fixa um mês de antecedência - ao projecto de Orçamento antes de ele ser aprovado nos órgãos próprios, que neste caso é a Assembleia da República, para poder pronunciar-se no termos das regras da união económica e monetária".

"E isso Portugal não deixará de fazer. O que interessa é a substância das coisas, não é a forma, e na substância Portugal não deixará de cumprir esse requisito", vincou, mas "num calendário adequado à formação e posse de um novo Governo".
 

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