Cedências em relação aos activistas presos não são esperadas em Luanda

Vigília em apoio aos presos está prevista para domingo, numa igreja na Cidade Alta, junto ao Palácio Presidencial, depois de a mais recente acção de solidariedade ter sido impedida pela polícia.

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Vigílias como a que aconteceu na quarta-feira em Lisboa, não são toleradas em Luanda Miguel Manso

Foi mais uma vez pelas redes sociais que foram conhecidas denúncias e testemunhos: durante a mais recente vigília, em apoio aos activistas presos em Angola, na segunda-feira, a polícia não só terá dado ordem para os presentes dispersarem como fez em anteriores iniciativas junto à Igreja da Sagrada Família; desta vez, e segundo relatos não oficiais, agentes policiais entraram durante a missa na Igreja de S. Domingos, também em Luanda, intimidando as pessoas.

Desde esse dia, nenhuma iniciativa foi organizada na capital angolana em solidariedade com os 15+1 – os 15 em Luanda, entre eles Luaty Beirão, que completa esta sexta-feira 26 dias de greve de fome e Nélson Dibango, que se juntou a esta forma de protesto radical há uma semana, e José Marcos Mavungo em Cabinda, preso e condenado por tentativa de rebelião em Março por procurar organizar uma acção pacífica. Os 15 foram acusados pelo Ministério Público de actos preparatórios de rebelião e atentado contra o Presidente.

A realização de uma vigília na Cidade Alta de Luanda, junto a uma igreja a poucos metros do Palácio Presidencial, está prevista para o próximo domingo, 18 de Outubro.

O comandante-geral da Polícia anunciou a abertura de um inquérito às recentes denúncias, e a Igreja Católica divide-se entre os mais conservadores e os mais críticos do regime de Angola, diz Felizardo Epalanga. Este membro do Grupo de Apoio aos Presos Políticos Angolanos (GAPPA) acrescenta que seria de esperar “um pronunciamento da Igreja” a pedir “um posicionamento às autoridades”, mas não espera uma mudança de posição do Governo.

“Não acredito que o Governo ceda”, diz Epalanga por telefone ao PÚBLICO. “Este processo já atingiu grandes proporções e está a mexer com a política internacional. Quando existe uma forte pressão, e quando o Governo é chamado à responsabilização de actos condenados por organizações internacionais, como a Amnistia Internacional, ou mesmo governos estrangeiros, o que faz é mostrar que é um Estado soberano, mesmo que isso implique violar direitos fundamentais dos cidadãos.”

Luaty Beirão, que foi transferido para o hospital-prisão de São Paulo em Luanda, na sexta-feira passada, depois de ter passado três meses na prisão de Calomboca, na província do Bengo, está a receber soro por via intravenosa. O rapper foi entretanto levado, na tarde desta quinta-feira, para uma clínica em Luanda para ser submetido a vários exames, de acordo com a página Facebook Liberdade aos Presos Políticos, na qual se lê que o activista continua “fraco mas lúcido”.

“Luaty [Beirão] não vai desistir, não vai ceder”, acrescenta Felizardo Epalanga. “Sabemos que, quando ainda estava na prisão de Calomboca, pediu desculpas à mãe por lhe estar a causar sofrimento, mas pediu que a família respeitasse a sua escolha.” Luaty Beirão entrou em greve de fome no dia 21 de Setembro, três meses depois de ser preso.

O activista diz estar a lutar por direitos constitucionais que “estão a ser desrespeitados”, em referência aos 90 dias de prisão preventiva previstos na lei, já ultrapassados. Numa mensagem lida por Luís Nascimento, um dos seus advogados, na vigília realizada em Lisboa, na quarta-feira, Luaty diz: “Declaro que estou consciente dos meus actos e das consequências daí resultantes e atribuo a responsabilidade desta drástica decisão ao Presidente da República, engenheiro José Eduardo dos Santos, pela sua teimosia em imiscuir-se nos assuntos que numa democracia seriam da exclusiva responsabilidade do poder judicial.”

À Lusa o ministro das Relações Exteriores angolano, Georges Chicoty, disse: "Algumas da acusações são graves, então vamos ouvir o que é que o poder judicial vai dizer. Têm de ser os juízes a julgar o caso e depois ouvirmos o que será a conclusão do processo."

A Lei da Prisão Preventiva, de 17 de Julho de 1992, estabelece prazos, em função do tipo de crime. Esses prazos “não podem exceder os 90 dias” para crimes contra a segurança do Estado, prevê o artigo 25º. “Decorridos os prazos indicados (...), e sem prejuízo do disposto em relação aos prazos de prisão preventiva em instrução contraditória, nos casos em que ela tenha lugar, é obrigatório a libertação do arguido”, lê-se no artigo 26º. E acrescenta: “Se for inadmissível a liberdade provisória, o Ministério Público poderá prorrogar, por despacho fundamentado, os referidos prazos por mais quarenta e cinco dias e, excepcionalmente, em caso de grande complexidade do processo, poderá ainda voltar a prorrogar o prazo de prisão preventiva por mais quarenta e cinco dias.”

Em comunicado enviado às redações ao final da tarde desta quinta-feira, o Ministério dos Negócios Estrangeiros Português refere que "o Governo Português reitera que tem acompanhado a situação de Luaty Beirão de perto e desde a primeira hora, particularmente tendo em conta os seus contornos humanitários".

"Neste contexto, ainda ontem [quarta-feira] os embaixadores da União Europeia em Luanda puderam manifestar preocupação pela condição de Luaty Beirão ao Ministro da Justiça de Angola, numa reunião especialmente dedicada a este assunto e na qual participou o Embaixador de Portugal", refere o mesmo comunicado

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