As fachadas mais bonitas da cidade

Em breve, os prédios desta rua que ostenta o nome do republicano, poeta e advogado poderão estar todos reabilitados. E é a cidade que ganha.

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Deixem-me falar-vos da Rua de Alexandre Braga. É uma rua pequena, ocupada totalmente, de um dos lados, por uma das fachadas do Mercado do Bolhão, razão pela qual ela é muitas vezes referida. Mas, se se cruzarem com ela, olhem para o outro lado, para as fachadas perfeitas, em azulejo colorido. Aquele conjunto de casas altas e elegantes, com varandas de ferro arredondadas ou de linhas rectas, mas todas muito trabalhadas, é um dos mais bonitos da cidade. E está a ser tratado, o que é muito bom.

Quando, há vários anos, trabalhava na Rua de Fernandes Tomás, era comum ir almoçar ao Bolhão. Em grupo, saíamos do jornal para ir ao restaurante da dona Gina ou às sandes de leitão, que só se vendem em determinados dias da semana. Em muitas dessas viagens, dava por mim a olhar para os prédios de ar abandonado da Rua de Alexandre Braga e a dizer, dedo espetado no ar, que se tivesse dinheiro para investir, comprava aquele prédio com a fachada em azulejo verde e transformava-o num Bed & Breakfast.

Ora, deviam agora parar para me dar algum crédito pela visão antecipada das potencialidades da cidade, porque este desejo inalcançável mas muito real era proferido antes de o turismo tomar conta do Porto e de os hotéis e hostels aparecerem em cada esquina, mais numerosos do que os cogumelos no Outono em certas áreas florestais. Eu já tinha andado a viajar pela Europa nessa altura, experimentara alguns B&B deliciosos nas ilhas britânicas e sentia-me verdadeiramente tentada a criar algo similar ali, no coração do Porto, num daqueles edifícios tão bonitos. Mas a tentação, neste caso, precisava de um avultado investimento e nenhuma das pessoas a quem eu revelava este desejo se transformou num sócio com capital.

Hoje, a Rua de Alexandre Braga (o pai, já agora, republicano, poeta e advogado, e não o filho, republicano, advogado e escritor) está diferente. A maioria dos prédios foi reabilitada. As fachadas de azulejo verde, amarelo e rosa-escuro brilham com a luz do sol. As aplicações art déco de ramos ou grinaldas de flores destacam-se, vaidosas, das suas diferentes posições nos prédios. O prédio que ostenta a assinatura do seu criador gravada na fachada — o arquitecto Marques da Silva, que no ano passado foi distinguido, pela qualidade da reabilitação imposta, com o prémio municipal João de Almada — introduz uma variante interessante no conjunto alinhado dos outros edifícios. As quadrículas verdes e brancas do grande prédio da esquina com a Rua Formosa estão agora sobre uma loja envidraçada de uma marca de café nacional.

Lá no meio, há ainda alguns edifícios à espera de renovação. Um deles, com as portas de madeira trancadas por pesados cadeados, não tem sinais de uma nova vida à vista. Mas os outros dois, com as madeiras carcomidas e as vidraças tristemente vazias e sujas, já ostentam os avisos que indicam estar à espera do licenciamento camarário para que as obras avancem. Se estes processos não forem daqueles que se eternizam na cidade (que também os há), em breve os prédios da Rua de Alexandre Braga poderão estar integralmente reabilitados. E a olhar, com alguma altivez, para a figura mais importante da rua, o Bolhão, ainda à espera das tão prometidas obras. Na Rua de Alexandre Braga só chateiam mesmo os autocarros que ali estacionam, fazendo horas para partir para outras zonas da cidade. Contingências de uma das alterações de trânsito impostas nos últimos anos e que não deverá sofrer mudanças nos próximos tempos. Por isso, talvez tenha de contornar os veículos pesados e saltar para a rua para observar, com mais liberdade, as fachadas belamente alinhadas.

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Resta-nos cruzar os dedos e desejar que o túnel que deverá aceder ao que será a nova zona técnica do Mercado do Bolhão reabilitado, e que passará por ali, não venha estragar a rua. Mas o túnel, tal como as obras do Bolhão, ainda é só uma promessa. Por enquanto ainda pode ir até à Alexandre Braga sossegadamente, contornar os autocarros se preciso for, e perder-se naquelas fachadas de outros tempos. Se puder, escolha um dia de sol. Porque as cores dos azulejos e das flores pintadas aqui e ali ganham uma nova vida. Vai ver que há boas razões para, neste caso, virar as costas ao Bolhão.

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