Ferro Rodrigues alerta para "posição golpista" de Cavaco Silva

Líder parlamentar do PS classifica de "desvio presidencial" o facto de Cavaco ter anunciado que mandatou Passos Coelho para negociar um governo.

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Ferro Rodrigues voltou a referir-se à mensagem que António Costa deixou depois de se saber da detenção de José Sócrates Enric Vives-Rubio

Depois de duas reuniões “muito produtivas” à esquerda e uma “bastante inconclusiva” com a direita, a maioria dos dirigentes socialistas permanecia ao fim da tarde desta sexta-feira sem assumir a decisão definitiva que pairava sobre o partido tornado “charneira” pelas eleições de domingo. A cautela era ainda a palavra de ordem, a não ser quando Cavaco Silva entrava na equação.

Às acusações de “golpe PRECiano”, verbalizadas pela direita, os socialistas contrapunham aquilo que entendiam ser o desvio presidencial. Os apoiantes de António Costa não tiveram problemas em apontar os sinais das primeiras reuniões inter-partidárias como a prova do erro do Presidente da República em dirigir-se ao país para anunciar o mandato dado a Passos Coelho para negociar.

Uma dessas vozes foi a do antigo secretário-geral socialista e ex-ministro da Segurança Social, Eduardo Ferro Rodrigues. “A única posição anti-democrática ou golpista é a que não seja constitucional. Por exemplo, impor o programa de qualquer Governo minoritário sem se aferir as reais condições de governabilidade”, disse o socialista depois de questionado pelo PÚBLICO sobre como encarava as últimas evoluções do processo de negociação. “O que é constitucional é democrático, goste ou não Cavaco Silva”, rematou o ainda líder parlamentar do PS.

Pedro Bacelar Vasconcelos, constitucionalista e membro da direcção do PS, alinhava pela mesma crítica ao Chefe de Estado. “A conclusão óbvia é que foi extemporânea a decisão do Presidente da República de chamar o PSD e incumbindo-o de falar com o PS. Da mesma forma que foi extemporânea a assinatura de um acordo de Governo [entre PSD e CDS] que não garante nem governabilidade nem estabilidade.”

"Nenhumas consequências" do processo negocial em curso
Mas já sobre as negociações, todos os dirigentes contactados pelo PÙBLICO admitiam que era ainda cedo demais para haver conclusões.“Consequências nenhumas”, respondeu Bacelar Vasconcelos sobre que ilações tirar dos encontros. “Ainda há outras reuniões em curso ou por fazer”, advertiu igualmente Ferro Rodrigues.

O ex-líder socialista acrescentou, no entanto, a sua convicção de que António Costa encarava a actual situação “sem medo de anátemas” de qualquer tipo. Ou seja, não descarta um Governo suportado pelo PCP e BE.

Uma coragem que para o ex-líder distrital socialista de Viseu, José Junqueiro, exigia também algo de inédito do outro lado da esquerda. “Só é possível se Jerónimo de Sousa meter o comunismo na gaveta”, disse antes de adiantar que mesmo assim, uma tal decisão poderia custar caro ao PS. “O resto do país pode não apreciar uma tentativa de vitória na secretaria”, disse Junqueiro.

E, contudo, houve quem defendesse abertamente essa possibilidade esta sexta-feira. Um Governo “mais patriótico e de esquerda”, liderado pelo PS, “estaria em melhores condições de defender os interesses do povo, dos trabalhadores, reformados e pensionistas”, defendeu António Arnaut. “Seria o Governo com maior capacidade de proteger as classes mais fragilizadas e de defender as conquistas de Abril e a Constituição”, acrescentou.

Para o denominado pai do Serviço Nacional de Saúde, os três partidos da esquerda estão perante a oportunidade de “acabar com esse absurdo a que chamam arco da governação”, que restringe a responsabilidade governativa ao PS, PSD e CDS-PP.

O histórico socialista mostrava-se convicto de que “a maioria [no interior do PS] aceitará esta solução”. “Os valores históricos do socialismo democrático” falariam mais alto e com a vantagem de poder “ter repercussões na Europa”.

Junqueiro não parecia, no entanto, convencido. E entre os dirigentes nacionais, actuais e antigos, contactados pelo PÚBLICO, havia uma suspeita determinante que permanecia no ar: “Mas alguém se lembra de um único orçamento viabilizado por esses dois partidos nestes 40 anos?”

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