Caiu a chuva

Estarão as praias onde as deixámos? Será que o paraíso é capaz de repetir-se?

Caiu a chuva. Nunca mais será Verão. Estávamos em Lisboa. Ficámos demolhados como bacalhaus de Aveiro que passam 48 horas na água gelada de um ribeiro do Gerês.

A chuva caiu. Mentira: esmagou-se no chão. Ensopou-nos os cabelos e as calças. Tentou constipar-nos. Constipou-nos. Raios partam a chuva e todos aqueles que dizem que Lisboa é encantadora - seja encharcadora - no Outono.

Não é. As esperanças do tempo mandam mais em nós do que as expectativas. Onde estão as acesas lembranças de praias de Outubro passado, na Arrábida e em Tróia? Num coração perdido de saudade, louco por ser tão recente.

A chuva é uma chamada à realidade. Mentira. É a falta de água que dita a morte e a doença da maioria dos seres exactamente tão humanos como nós.

Queixarmo-nos do tempo, neste paraíso doente e caríssimo que é Portugal, parece, com toda a justiça, ingratidão.

Mas será? Não. A chuva pode ser muito saudável e necessária mas é uma chatice quando decide cair toda de uma só vez.

Caiu a chuva. O mar, a partir de agora, estará cheio de água doce. A aposta agora é para Maio do ano que vem. Não pode haver, neste momento, frase mais triste do que esta. Falta um ano. E o ano que já passou durou apenas, quando muito, um mês e meio.

Estarão as praias onde as deixámos? Será que o paraíso é capaz de repetir-se? Onde estão as paisagens onde os nossos olhares se imiscuiram? Para onde foram as nossas vontades de entrar no mar?

Para as nossas almas, onde a chuva não entra.

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