Vencedores e vencidos da noite eleitoral

Em noites eleitorais, há muitos protagonistas a assumirem vitórias e poucos a reconhecerem derrotas. Mas como sempre, os resultados fazem uma separação mais ou menos clara entre quem ganha e quem perde.

VENCEDORES

Passos Coelho
Foi o grande vencedor, mesmo que a coligação PSD/CDS que lidera tenha perdido cerca de 800 mil votos e ficado sem margem de manobra parlamentar para conseguir uma maioria absoluta. Se Passos uniu a direita, o afastamento ao PS é tão forte que o centro ficou, em certa medida, esvaziado. E, sem maioria absoluta, vai governar num clima de instabilidade permanente, sabendo que pode cair logo na apresentação do seu programa de governo. Ou com o Orçamento do Estado. Ou em qualquer momento a partir de Abril do próximo ano, quando puder voltar a haver eleições legislativas. Leonete Botelho

Catarina Martins
Com a porta-voz a revelar-se líder inequívoca, o Bloco de Esquerda ganhou o que nunca tinha ganho: ultrapassou a CDU e tornou-se na segunda maior força de esquerda no Parlamento. Catarina surpreendeu e ganhou nos debates, nas entrevistas, na rua. No frente-a-frente com António Costa terá ganho um élan vencedor, ao afirmar-se disponível para conversar com o líder do PS no pós-eleições para apoiar um eventual governo socialista, sem exigir a renegociação da dívida. Catarina voltou a tomar a dianteira na noite eleitoral, ao anunciar o voto de rejeição do programa de governo. E assim voltar a estender o tapete ao PS. L.B.



Paulo Portas
Esta é a terceira ressurreição política de Paulo Portas. Saiu envergonhado, em 2005.Regressou ao Governo em 2011. Quase deitou tudo a perder em Julho de 2013. Mas nada parece “irrevogável” na relação do líder do CDS com a sua área política. Como número dois, ao lado de Passos, passou a campanha com a mira em António Costa e no programa do PS. Agora não será de estranhar que venham dele os gestos de aproximação ao mesmo PS, para que a coligação consiga passar os seus diplomas num Parlamento em que a vitória desta noite não será tão clara, no futuro, como parecia pelo sorriso da noite eleitoral. Paulo Pena



Cavaco Silva
Se os resultados eleitorais não são a maioria absoluta que o Presidente da República desejava, a verdade é que Cavaco Silva pode dormir descansado. Pelo menos, nas primeiras noites. Isto porque será evidente quem terá de indigitar primeiro-ministro. As dores de cabeça poderão vir quando o governo apresentar o programa ao Parlamento, que poderá ser rejeitado, o que faz cair o governo. Se a esquerda se unir nesse momento, será o primeiro problema de Cavaco: encontrar, no quadro parlamentar, uma solução de governo. Se a maioria PSD/CDS não conseguir um apoio maioritário, resta saber se será o PS a consegui-lo. L.B.

Sondagens
Os recentes casos no estrangeiro, no Reino Unido e na Grécia, eram insucessos que pendiam como espada de Démocles sobre a credibilidade das sondagens. Não poucos apoiantes acusaram quem as divulgou de conluio de contornos pérfidos. Os políticos refugiaram-se no lugar-comum que a sondagem que vale é o voto em urna. E este confirmou as indicações dos estudos de opinião, na sua dupla vertente de sondagem e tracking poll. Em ambos os casos, sempre deram vantagem ao PaF e teimaram em colocar as linhas da CDU e do Bloco muito próximas. E admitiram a entrada de novos protagonistas em São Bento. Nuno Ribeiro

António José Seguro
Depois de vencer as europeias com 31,4% contra os 27,7% da coligação PSD/CDS, António José Seguro foi desafiado na liderança do PS por António Costa, que classificou de “poucochinha” a vitória socialista. Costa ganhou as primárias, mas nem uniu o PS nem ganhou as eleições. Seguro, lembrado na campanha eleitoral, retirou-se para parte incerta. Mas os chamados seguristas falaram logo na noite eleitoral: Álvaro Beleza falou num congresso extraordinário e outros seguristas querem-no logo após as presidenciais. Resta saber para que querem esse congresso. Ou para quem. L.B.

Paulino Ascensão
Até agora praticamente desconhecido dos eleitores madeirenses, o economista Paulino Ascensão chega à Assembleia da República à ‘boleia’ do factor Bloco de Esquerda de Catarina Martins. Licenciado pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Ascensão há muito que colaborava com o partido, nomeadamente nas questões económicas, mas só nestas eleições é que o director financeiro da Câmara Municipal do Funchal assumiu uma posição elegível. Paulino Ascensão está no Bloco desde Setembro de 2014, e foi quinto na lista bloquista nas eleições regionais de Março passado. Márcio Berenguer

VENCIDOS

António Costa
Foi o grande derrotado da noite eleitoral. Ficou-se pelos 32%, muito perto dos 31,4% que o PS de António José Seguro obteve nas europeias e que Costa considerou insatisfatórios. E muito longe dos 37,5% com que foi reeleito presidente da Câmara de Lisboa em 2013. Na noite eleitoral ouviu-se o afiar de facas dentro do PS, com um grupo de socialistas a pedir um congresso extraordinário logo depois das presidenciais, se não antes, como sugeriu o segurista Álvaro Beleza. Mas Costa não se demitiu, antes deixou claro que poderá chumbar o programa de governo se tiver uma solução de governação estável. Um piscar de olhos à sua esquerda. L.B.

José Sócrates
Teve manifesto desdém pela direcção socialista de Seguro. Foi-lhe atribuída preferência por António Costa e, depois, distância do actual secretário-geral por esperar mais provas de apoio quer em Évora, quer na prisão domiciliária de Lisboa: afinal, Costa nunca o considerou como preso político. O SMS de António Costa aos militantes do PS, na manhã posterior à detenção de Sócrates no aeroporto de Lisboa, em Novembro do ano passado, estabelecera uma diferença entre política e justiça que Costa levou até ao fim. E foi definitiva a demarcação do líder do PS no debate televisivo com Passos Coelho. N.R.



Marinho e Pinto
Ao candidatar-se pelo círculo de Coimbra, o advogado Marinho e Pinto sabia que tinha poucas possibilidades de ser eleito para o hemiciclo de São Bento. Mas o homem forte do Partido Democrático Republicano, e única figura reconhecida pela população, apostava na eleição de deputados em Lisboa e Porto. Aliás, parecera ultrapassar as vicissitudes iniciais que levaram ao afastamento de companheiros, como Eurico Figueiredo. Com uma campanha unipessoal nas arruadas e nos oficiais tempos de antena, o antigo bastonário da Ordem dos Advogados apostou forte. E perdeu, sem paliativos. N.R.



Jerónimo de Sousa
Aos 68 anos, o secretário-geral do PCP viu a Coligação Democrática Unitária, cuja força matriz é o seu partido, a ser ultrapassada pelo Bloco de Esquerda de Catarina Martins e Mariana Mortágua. O que era impensável para o estado-maior dos comunistas apesar dos avisos das sondagens. A estratégia de equiparar António Costa a Passos Coelho evitou que os apelos do voto útil dos socialistas tivessem eco no disciplinado eleitorado comunista. Magro resultado quando a coligação de direita reforçou a sua posição após quatro anos de duras lutas do PCP contra as políticas de austeridade. N.R.



Rui Tavares
Esteve à beira de ser eleito deputado por Lisboa, mas não foi. O fundador do partido Livre e líder da coligação Tempo de Avançar terá sido prejudicado pelo voto útil no campeonato dos pequenos a favor do BE. Mas também pela dispersão de votos em formações políticas sem representação parlamentar: o PAN – que ficou à frente do Livre em Lisboa —, o PDR e o PCTP/MRPP obtiveram maior percentagem de votos. O partido que se assumiu mais próximo do Syriza grego não encontrou no eleitorado português eco suficiente para pedir a renegociação da dívida ou a união da esquerda para governar. L.B.

José Manuel Rodrigues
O líder do CDS-Madeira não foi eleito deputado e apresentou a demissão. José Manuel Rodrigues, que era cabeça de lista pela Madeira, assumiu a “responsabilidade total” pela derrota, embora argumentando que para o resultado pesou mais a situação nacional do que a regional. O CDS não só perdeu o deputado que tinha no Parlamento, como foi apenas o quinto partido mais votado. Rodrigues viu fugir quase dois terços dos votos que obteve nas legislativas de 2011. Rui Barreto, deputado dos centristas madeirenses em São Bento na actual legislatura, e afastado da lista por Rodrigues, é um forte candidato à liderança. M.B.

Sampaio da Nóvoa
O candidato presidencial que partiu para uma longa pré-campanha sem máquina nem estruturas locais é uma vítima colateral da derrota do PS. Até às legislativas, aguardou, pacientemente, pelo apoio de António Costa. Agora, com a liderança do PS fragilizada, esse apoio dificilmente virá, no futuro próximo. A proximidade das presidenciais pode abrir novas brechas na estratégia do PS, seja pelos apoios a Maria de Belém de outros descontentes com Costa, seja pelo surgimento de outra candidatura nesta área política. Nóvoa tem agora que redefinir a estratégia para os três meses que faltam até à campanha. P.P.

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