Portugal reúne critérios para passar a dar vacina da BCG só a grupos de risco

Novas recomendações estão a ser estudadas desde 2013 e, segundo a Direcção-Gerla de Saúde, não têm qualquer relação com a ruptura de stock da BCG.

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Autoridades disponibilizaram vacinas gratuitas para maiores de 65 adelaide carneiro
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Na cerimónia foi feito o pré-lançamento de um selo alusivo aos 50 anos do programa de vacinação Enric Vives-Rubio

A vacina contra a tuberculose, conhecida como BCG, faz parte do Programa Nacional de Vacinação e as recomendações indicam que seja dada a todos os recém-nascidos. No entanto, as novas orientações internacionais, nomeadamente por parte da Organização Mundial de Saúde (OMS), apontam para que Portugal reúna critérios suficientes para suspender a vacinação universal, passando a imunização a ser feita apenas nos chamados grupos de risco. “A vacina BCG não é a medida essencial no controlo da tuberculose”, assegurou o coordenador do grupo da BCG na Comissão Técnica de Vacinação da Direcção-Geral da Saúde (DGS), José Gonçalo Marques.

O médico defendeu a revisão das orientações sobre a BCG numa cerimónia de comemoração do 36º aniversário do Serviço Nacional de Saúde (SNS), que decorreu nesta terça-feira no Hospital Dona Estefânia, em Lisboa. Na sessão, assinalaram-se também os 50 anos do Programa Nacional de Vacinação, que conta actualmente com 13 vacinas. Neste contexto, José Gonçalo Marques considerou que chegou a altura de rever algumas recomendações do plano – nomeadamente sobre a tuberculose. “Em Portugal temos critérios suficientes para suspender a vacinação universal e passar a vacinar grupos de risco”, explicou, indicando que só três Estados-membros vacinam toda a população.

Também a subdirectora-geral da Saúde, Graça Freitas, confirmou a existência de uma discussão técnica sobre a BCG. “É mais complexo retirar uma vacina do Programa Nacional de Vacinação (PNV) do que incluí-la”, disse, explicando que será sempre preciso monitorizar bem os casos num cenário de fim da vacina universal. Segundo José Gonçalo Marques, a vacina é eficaz a proteger os casos graves, como é o caso da meningite tuberculosa. Porém, “o seu papel no controlo da tuberculose na população é pequeno, porque não impede que uma pessoa infectada venha a ter mais tarde a chamada tuberculose bacilífera, que causa a disseminação da tuberculose na população”.

A resposta, disse o médico, passa sobretudo pelo diagnóstico precoce, com Portugal a apresentar casos sobretudo nos grandes centros urbanos e nos imigrantes. A Comissão Técnica de Vacinação está a ouvir vários especialistas, nomeadamente a Sociedade Portuguesa de Pediatria e a Sociedade Portuguesa de Pneumologia, mas tudo aponta para que em breve seja feito um parecer que recomende outro modelo de vacinação.

José Gonçalo Marques assegurou que as novas recomendações estão a ser estudadas desde 2013 e que não têm qualquer relação com a ruptura de stock da BCG. Há vários meses que a vacina não está no mercado português, devido a problemas no laboratório dinamarquês que a produz. Já foram avançados vários prazos, mas a nova data indica que só em Outubro deve regressar ao mercado. O médico adianta que Portugal está a estudar a hipótese de comprar a vacina a outro fornecedor, até porque precisará sempre dela para os grupos de risco, mas ainda está por avaliar a segurança e eficácia da nova marca.

“Atendendo às restrições de BCG a nível mundial, a OMS estabeleceu uma lista de países prioritários no qual Portugal, dados os seus bons resultados, não está incluído”, explicou o especialista da Comissão Técnica de Vacinação da DGS. O pediatra adiantou que Portugal cumpre os critérios tanto da OMS como do Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças para passar a dar a vacina aos grupos de risco, como são os casos dos imigrantes, sobretudo nas crianças. Os critérios passam por um bom sistema de notificação dos casos de tuberculose, uma baixa incidência de casos de meningite tuberculosa em crianças com menos de cinco anos, entre outros critérios.

Sobre o mesmo assunto, o ministro da Saúde, também presente nas comemorações, confirmou que a tutela aguarda um parecer técnico para depois tomar uma decisão final. “O plano é tuto menos estático”, defendeu Paulo Macedo, lembrando que neste ano seguiram as recomendações técnicas e passaram a comparticipar a Prevenar 13, uma vacina antipneumocócica que previne doenças como a meningite, a pneumonia, a septicémia ou as otites. O ministro recordou, ainda, que a vacina HPV, contra o cancro do colo do útero, também começou a ser dada em três doses e que agora, após novos estudos, é dada em apenas duas.

Uma das preocupações manifestadas na sessão foi com algumas correntes de pais que não vacinam os filhos. Para Paulo Macedo, a questão deve deixar os profissionais de saúde “alerta” mas com a actual taxa de cobertura de vacinação portuguesa, que é de mais de 95%, ainda “não é preocupante”. O ministro aproveitou a ocasião para lembrar que em Outubro arranca a campanha de vacinação contra a gripe sazonal, apelando a que as pessoas com mais de 65 anos ou de grupos de risco adiram ao programa e que se dirijam aos centros de saúde.

A este propósito, o pneumologista Filipe Froes, na mesma sessão, lamentou que os próprios profissionais de saúde adiram pouco à vacina contra a gripe, com uma taxa de cobertura no último Inverno de 24%. Na população com mais de 65 anos é de 55% e a meta é chegar aos 75%. O especialista frisou que a vacina é especialmente eficaz a impedir as complicações da gripe, sobretudo nas populações idosas.

Vírus do Nilo

À margem da sessão, o ministro da Saúde pronunciou-se também sobre as análises laboratoriais que confirmaram um caso de infecção pelo vírus do Nilo, transmitido pela picada de mosquito, detectado num cidadão português no Algarve. Paulo Macedo garantiu que a coordenação entre a DGS e a Direcção-Geral de Veterinária permitiu actuar logo no sentido da “descontaminação e aplicação de larvicidas”, adiantando que estão também a monitorizar as populações de mosquitos.

O caso remonta a Julho e Agosto, altura em que um homem português residente no Algarve desenvolveu a doença que se suspeitou ser provocada pelo Vírus do Nilo Ocidental, tendo entretanto tido alta sem sequelas. O vírus do Nilo não se transmite de pessoa para pessoa, mas unicamente por picada de um mosquito do género Culex, podendo, em 20% das infecções, provocar doença febril com manifestações clínicas ligeiras, que raramente pode evoluir para meningite viral.

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