Crise política na Irlanda do Norte em torno da existência do IRA

A demissão do primeiro-ministro unionista por causa de um homicídio que envolve figuras do Exército Republicano Irlandês aprofunda divisões entre nacionalistas e unionistas.

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Mural de apoio ao IRA, no Norte de Belfast Cathal McNaughton/AFP

A Irlanda do Norte enfrenta a maior crise política desde a assinatura do Acordo de Paz de 1998, com a demissão do primeiro-ministro unionista Peter Robinson, após o assassínio de um antigo operacional do Exército Republicano Irlandês (IRA), em Agosto, do qual a polícia considera suspeito um alto dirigente do Sinn Féin – o antigo braço político da organização terrorista.

A questão de fundo é a recusa do Sinn Féin em reconhecer que o IRA ainda existe, embora oficialmente tenha sido desmantelado em 2005. Peter Robinson, do Partido Unionista Democrático (pró-união com a Inglaterra), acusa o Sinn Féin, seu parceiro na partilha do poder nesta região autónoma do Reino Unido, de não ser honesto, ao dizer que o IRA já não existe e apelou a uma suspensão da assembleia regional.

Mas da última vez que o parlamento de Belfast foi suspenso, em 2002, os partidos rivais das duas comunidades – católicos independentistas e anglicanos unionistas – demoraram cinco anos a reunir-se de novo. Por isso, os outros partidos não aceitaram a sua proposta – e Robinson demitiu-se, deixando no governo apenas uma ministra do seu partido, Arlene Foster.

Foster ficou a liderar interinamente o governo. Mas o seu partido tem de preencher o resto das pastas ministeriais que vagou até quinta-feira para evitar antecipar as eleições, que deviam ser em Maio de 2016.

Mas em causa está uma agudização do mau clima político. A ministra de Londres para a Irlanda do Norte, Theresa Villiers, diz que “as relações de trabalho desfizeram-se completamente”. Mike Nesbitt, líder do Partido Unionista do Ulster, disse à Reuters que os principais partidos desconfiam e “profundamente” um do outro. “Mudaria tudo, em termos de confiança, se o Sinn Féin reconhecesse que o IRA ainda existe, sob uma forma desmilitarizada”, afirmou.

O problema dos grupos paramilitares continua por resolver, 17 anos depois da assinatura da paz: “Para haver um governo estável, é preciso lidar com a actividade paramilitar relacionada com um dos partidos do governo, o Sinn Féin”, afirmou a ministra Arlene Foster. “Não podemos ignorá-la.”

A ministra para a Irlanda do Norte concorda. “O IRA ainda existe. Há algumas estruturas organizacionais, embora com objectivos completamente diferentes – o IRA já não está envolvido em actividades terroristas”, declarou. Talvez seja preciso criar uma comissão para retirar armas de circulação e acabar com os grupos paramilitares – “essa é uma das ideias mais credíveis”, disse Villiers.

Mas o presidente do Sinn Féin, Gerry Adams, que sempre negou ter pertencido ao IRA, afirma que toda a gente está errada ao dizer que o IRA ainda existe – e que o seu partido não permitirá que este tema se torne uma pré-condição das negociações para voltar a haver governo.

O primeiro-ministro britânico, David Cameron, declarou-se “muito preocupado” e apelou aos “políticos da Irlanda do Norte que trabalhem em conjunto para construir um melhor futuro”, no “espírito do acordo de 1998”. As negociações ficam marcadas para segunda-feira.

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