“Que seja o último”, pede o pai de menino afogado

Alan, 3 anos, Galip, 5, e a mãe, que morreram no Mediterrâneo a tentar chegar à Grécia, foram enterrados na Síria.

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Abdullah foi o único sobrevivente do naufrágio em que morreram a mulher e os dois filhos. “O que era precioso já não existe.” Murad Sezer/Reuters
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Funeral de Alan, Galip e da mãe, Rehana, na Síria Rodi Said/Reuters
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“Não quero mais nada deste mundo”, diz Abdullah. “Poderiam oferecer-me todos os países do mundo, eu não os quereria.” Rodi Said/Reuters

Abdullah perdeu tudo e agora só tem dois desejos. Que a sua história seja conhecida para que não aconteça mais, e ficar ao lado da campa da sua mulher e dois filhos a chorá-los.

Abdullah falou aos jornalistas em lágrimas à porta da morgue onde estavam Alan, o menino de 3 anos cujo corpo deu à costa em Bodrum e cuja imagem se tornou o símbolo dos refugiados que morrem na travessia do mediterrâneo, o irmão de cinco anos, e a mãe de ambos, de 35. O pai foi um dos poucos sobreviventes entre os 12 ocupantes do barco.

Esta sexta-feira, os corpos chegaram a Kobane, cidade síria perto da fronteira com a Turquia, para serem enterrados. No dia anterior, isto era o que Abdullah, 40 anos, desejava. “Só quero ficar perto deles”, dizia. “Perdi tudo”, repetia. “Não quero mais nada deste mundo. Poderiam oferecer-me todos os países do mundo, eu não os quereria. O que era precioso já não existe.” Abdullah regressou à cidade dominada pelos jihadistas de onde tão desesperadamente a sua família fugiu.

Ao falar aos jornalistas antes da partida, Abdullah disse querer apenas mais uma coisa: “a atenção do mundo para que possam impedir que isto aconteça a outros”, declarou à Reuters. “Que este seja o último”, pediu.

No Canadá, a irmã de Abdullah, Tima, também não conseguiu não chorar na conferência de imprensa. “Eles não mereciam morrer, não mereciam… Só queriam uma vida melhor”. A família estava a tentar pedir asilo no Canadá mas não conseguiu por não estarem registados como refugiados na Turquia.

Tima repetiu a mesma ideia que o irmão: “É demasiado tarde para salvar a família de Abdullah”, disse. “Mas vamos usar as nossas vozes para pedir mudanças e acabar este sofrimento.”

Fotógrafa quis expressar “grito silencioso”
A fotógrafa que tirou as fotografias de Alan – a agência de notícias turca Dogan identificou-o como Aylan, que seria a versão turca do nome, mas o seu nome no original curdo é Alan, explica a emissora britânica BBC – já tirou muitas fotografias de corpos que dão à costa.

A fotógrafa da Dogan Nilufer Demir conta que não se consegue lembrar muito bem de como tudo aconteceu quando viu os corpos, seriam umas 6h da manhã. Alguns residentes tinham alertado a polícia. Estavam todos em choque.

“Pensei que a única coisa que eu podia fazer era tirar as fotografias para que a Turquia e o mundo visse isto”, disse. “Com a dor que senti quando vi Alan, só pensei em passar isto ao público. Só queria mostrar a sua tragédia”, explicou: “Era o único modo de expressar o grito do seu corpo silencioso.”

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