Identificada uma nova espécie de macaco-tití no Peru

Espécies de macacos-titís na América do Sul são agora 34, depois de uma viagem que se iniciou nos museus, passou pela Internet e acabou na floresta da Amazónia a ouvir as vocalizações destes primatas.

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A nova espécie tem 30 centímetros de comprimento (entre cabeça e corpo) e 40 centímetros de cauda Stephen D. Nash
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A cara é negra, assim como o pêlo à sua volta e o resto da pelagem do corpo é castanha, excepto nos membros dianteiros Stephen D. Nash
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Um macaco-tití-castanho-de-urubamba observado na natureza Proyecto Mono Tocón

Durante três semanas, em 2013, Jan Vermeer e Julio Tello Alvarado percorreram 144 quilómetros de trilhos e 169 quilómetros de rios no interior do Peru. O objectivo dos dois biólogos, da organização não-governamental ambientalista Proyecto Mono Tocón, do Peru, era investigar que espécies de macacos-titís existiam numa determinada região de Ucayali, no centro do país, colada ao Brasil. A viagem foi proveitosa: não só a equipa identificou uma nova espécie daqueles primatas, como encontrou outra, descoberta inicialmente em 1914, mas que foi esquecida nas décadas seguintes. Os resultados da viagem foram agora publicados na revista Primate Conservation.

Chamam macacos-titís às 34 espécies que hoje compõem o género Callicebus. Estes pequenos primatas com longas caudas estão distribuídos por uma vasta área da América do Sul, nas florestas da Colômbia, Equador, Brasil, Peru, Bolívia e Paraguai.

Geralmente, estas dezenas de espécies não estão sobrepostas a nível geográfico. Os biólogos pensam que, em geral, os rios e as montanhas que atravessam aquele vasto território foram, ao longo dos tempos, produzindo novas espécies. Pequenos, geralmente monogâmicos, arbóreos, estes primatas têm nos rios barreiras geográficas intransponíveis. Um rio novo pode separar uma população de uma espécie de macacos-titís em duas. Ao longo do tempo, como as duas populações não se misturam mais, a evolução vai caminhando em direcções diferentes e acaba por produzir duas espécies distintas.

Não há muitos estudos genéticos deste grupo de primatas. As espécies são identificadas tradicionalmente pelas suas características anatómicas, como a cor da pelagem nas várias regiões do corpo.

O que originou a viagem de 2013 foi um animal recolhido em 1927, que Jan Vermeer observou no Museu de História Natural de Nova Iorque, identificado originalmente como sendo da espécie Callicebus brunneus. Mas as características daquele indivíduo eram diferentes das características que o biólogo associava àquela espécie. Por isso, o investigador foi à procura de mais fotografias de macacos-titís que habitassem o mesmo local do animal recolhido em 1927, para perceber o que se passava. Para isso, usou uma fonte de informação global.

“Enquanto os antigos investigadores se serviam da informação que estava na literatura ou nas colecções dos museus para o seu trabalho, eu podia usar um meio de informação mais moderno, a Internet”, explicou Jan Vermeer ao site noticioso Mongabay, dedicado ao ambiente e à conservação. “A Internet está cheia de fotografias de macacos-titís, muitas vezes publicadas por turistas que estiveram algures na selva e que querem partilhar as suas experiências.”

As fotografias de macacos-titís que o biólogo encontrou daquela região do Peru revelavam, de facto, animais diferentes da espécie Callicebus brunneus. Restava ir ao local fazer observações directas para deslindar este mistério. “A identificação segura de macacos-titís observados na natureza é crucial para evitar confusões e determinar as estratégias de conservação”, defendem os autores no artigo.

Assim, a pé ou de canoa, os investigadores percorreram mais de 300 quilómetros no interior da floresta da Amazónia, na região peruana onde os rios Inuya, Urubamba e Ucayali se ligam.

“Os macacos-titís são animais discretos, difíceis de encontrar na floresta. Revelam a sua presença com vocalizações fortes de manhã, que servem, provavelmente, para definir os limites dos seus territórios”, explicam os cientistas. “Para estimular as vocalizações dos macacos, emitimos gravações de vocalizações de espécies de Callicebus na esperança que eles respondessem e se aproximassem de nós. Se ouvíssemos vocalizações de macacos-titís, tentávamos encontrá-los. Quando era possível, filmámos e fotografámos os titís, e gravámos as suas vocalizações.”

Ao todo, a equipa observou mais de 110 macacos-titís em 41 localidades diferentes junto dos rios. Além disso, também recolheu amostras de pele e crânios de macacos que tinham sido caçados.

Os macacos observados pertenciam a três espécies diferentes, de acordo com a equipa. O Callicebus discolor, que já era conhecido. O “Callicebus toppini”, de cor avermelhada e cauda escura, que tinha sido identificado pela primeira vez em 1914, mas ao longo das décadas acabou erradamente por ser incluído noutra espécie de Callicebus. E, finalmente, os investigadores identificaram a nova espécie “Callicebus urubambensis”, que habita as duas margens do rio Urubamba, cujos indivíduos tinham sido incluídos na espécie “Callicebus brunneus”: “Depois da observação na natureza, do estudo de espécimes no museu e de uma análise da literatura científica, propomos que estes animais representam uma espécie ainda não descrita”, lê-se no artigo.

O Callicebus urubambensis, com o nome vulgar macaco-tití-castanho-de-urubamba proposto pelos cientistas, tem 30 centímetros de comprimento (entre cabeça e corpo) e 40 centímetros de cauda. Tem uma cara negra, o pêlo à volta da cara também é negro e o resto da pelagem é acastanhada, excepto nos membros dianteiros, em que é preta. O Callicebus brunneus é diferente porque a cor castanha do corpo é mais forte, os membros dianteiros são também castanhos e tem menos pêlo preto à volta da face do que o novo “Callicebus urubambensis”.

Além disso, o habitat do Callicebus brunneus só começa já no Brasil, a mais de 600 quilómetros a leste do fim do habitat do Callicebus urubambensis. A nova espécie não parece estar ameaçada de extinção, dizem os cientistas, ao contrário de um terço das 30 espécies de macacos-titís que estão na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).

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