Momento crucial da vida de um cometa seguido de perto pela Roseta

ESA divulgou nesta quinta-feira imagem do cometa com um enorme jacto, poucas horas antes de atingir o ponto mais próximo do Sol. Cientistas estudam gases do 67P para descobrir as condições da sua formação há 4500 milhões de anos.

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Jacto de material lançado pelo cometa captado pela sonda Roseta: agora que está particularmente próximo do Sol, a actividade é intensa ESA
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O cometa antes (à esquerda), durante (no meio), e após (à direita) o jacto ESA

O cometa 67P/Churiumov-Gerasimenko atingiu na madrugada desta quinta-feira, às 3h03 (hora de Lisboa), o periélio, o ponto mais próximo do Sol. E já começou a sua lenta viagem em direcção à órbita de Júpiter. A sonda Roseta, da Agência Espacial Europeia (ESA), que acompanhou este momento fulgurante, prepara-se para começar a registar os efeitos da actividade do Sol no cometa.

“Antes do periélio, a Roseta analisou os parâmetros da superfície do cometa, e agora vai poder voltar a olhar para a superfície do cometa e perceber como é que estes parâmetros mudaram”, revelou Nicolas Altobelli, um dos responsáveis pela missão, durante uma emissão em directo da ESA nesta quinta-feira. “O periélio é um marco fantástico alcançado pela Roseta.”

É a primeira vez que uma sonda acompanha de perto a vida de um cometa. O 67P esteve nesta quinta-feira a apenas 186 milhões de quilómetros da nossa estrela, entre a órbita da Terra e Marte. Demorará mais 6,5 anos até voltar. Sempre que se aproxima do Sol, a radiação e os ventos solares fazem libertar gás e poeiras do seu núcleo, formando a famosa cabeleira e cauda, que no caso do 67P não se vê da Terra a olho nu.

Apesar de já se estar a afastar, a actividade do cometa ainda vai aumentar. “Há uma certa inércia na propagação das ondas de calor no interior do núcleo e poderá ser que o cometa atinja o pico da emissão de gases nas próximas semanas”, explicou Nicolas Altobelli, citado pela agência noticiosa AFP.

Neste momento, o cometa liberta 300 quilos de água por segundo, o que equivale por dia ao volume de água de dez piscinas olímpicas (uma piscina tem 2500 metros cúbicos). A 6 de Agosto de 2014, quando a Roseta atingiu a órbita do 67P, com o cometa então a 540 milhões de quilómetros do Sol, ainda entre Júpiter e Marte, este apenas libertava 300 gramas de água por segundo, dez vezes menos do que agora.

Durante a emissão da ESA, foram divulgadas várias imagens do cometa dos últimos meses. Algumas foram obtidas pela Roseta, outras foram tiradas por telescópios na Terra. Nestas fotografias, o 67P surgia com a cabeleira e a cauda muito pequenas, sem se perceber os contornos do núcleo que, graças à Roseta, sabemos que faz lembrar um patinho de borracha, com uma cabeça mais pequena e um corpo maior.


Durante estes dias, os cientistas da missão estão especialmente interessados no material expelido do cometa, como os gases raros (hélio, árgon, crípton, entre outros), que podem dar indicações sobre a temperatura a que este cometa foi formado, há 4500 milhões de anos, no início do sistema solar.

Pensa-se que o 67P provém da cintura de Kuiper, que começa para lá da órbita de Neptuno e termina a uma distância equivalente a 50 vezes a distância da Terra ao Sol. Nesta enorme e fria região, há muitos corpos gelados, o maior é Plutão. Alguns objectos são atirados para dentro do sistema solar, como é o caso do 67P.

A estranha forma de pato do 67P levou os cientistas a indagar como é que ele surgiu. Uma das ideias iniciais é que a erosão tinha o esculpido a partir de um cometa mais arredondado. Mas segundo Holger Sierks, responsável pela equipa que controla a câmara OSIRIS da Roseta, os últimos dados da sonda apoiam outra ideia: “Temos indicações, devido à morfologia dos dois lobos, que estes estavam separados e se fundiram nos primeiros dias do sistema solar.”

Desde então, a erosão diminuiu o tamanho original do cometa. Uma das fotografias divulgadas nesta quinta-feira revela um enorme jacto de material a libertar-se do 67P. A imagem foi obtida duas horas e meia antes do cometa atingir o periélio. Além do vapor de água, o cometa expele mil quilos de poeiras por segundo, criando um ambiente com tantas partículas que se torna perigoso para a Roseta. Agora, a sonda tem estado entre os 325 e 340 quilómetros de distância do cometa. Mas já chegou a voar apenas a 20 quilómetros, quando libertou a pequena sonda File em Novembro, que aterrou no 67P para o estudar.


Quando a actividade do cometa voltar ao normal, a Roseta vai reaproximar-se do 67P e ver os efeitos da passagem pelo Sol deixados na topografia do cometa. Os cientistas esperam ainda que a ligação entre a File e a Roseta volte a restabelecer-se. A File, que só se manteve acordada durante três dias após a aterragem, por falta de energia solar, voltou a acordar em Junho, quando o cometa estava mais próximo do Sol. Mas no início de Julho, a Roseta deixou de receber sinais do robô. Os cientistas detectaram problemas no sistema de comunicações da File.

“Pensamos que os jactos do cometa não são suficientemente fortes para provocar o levantamento da File. Mas a actividade do cometa é perigosa para a sonda”, disse nesta quinta-feira Barbara Cozzoni, uma das engenheiras da missão.

Esta especialista ainda tem esperança que a File dê sinais de vida pelo menos até Outubro. Senão, a Roseta irá continuar o seu trabalho até Setembro de 2016. Nessa altura, é possível que a Roseta termine a sua missão indo contra o cometa. Tal como o resto da emissão, será uma despedida única.

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