Menos exigentes? Há 15 escolas que dão sempre notas acima do expectável

Ministério da Educação actualizou dados sobre desvios de notas internas face à média nacional. Inquéritos a quatro escolas por possível inflação de classificações continuam em curso

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Ministério de Nuno Crato diz que analisa “todos os casos extremos” Daniel Rocha

Para o Ministério da Educação e Ciência (MEC) estas são escolas que podem estar a usar “critérios de avaliação do desempenho escolar dos seus alunos menos exigentes do que os critérios utilizados na média das outras escolas”. E tudo porque atribuem sistematicamente notas bem acima do que o MEC considera ser o expectável. São 15, a maioria (11) privadas do Norte do país, que em todos os cinco anos analisados estão entre as que apresentam os maiores desvios.

Se se alargar a análise às que têm, em pelo menos quatro dos cinco anos analisados, um desalinhamento muito significativo, chega-se a 28, das quais 17 privadas e 11 públicas.

Muitas são bem conhecidas: ocupam tradicionalmente boas posições nos rankings que anualmente são publicados com base nos resultados dos alunos nos exames do ensino secundário. Têm das melhores médias nas provas nacionais.

O fenómeno não é novo — no início deste ano, o então recém-criado portal Infoescolas do MEC revelava, escola a escola, o chamado “indicador do alinhamento das notas internas atribuídas pela escola face às notas atribuídas pelas outras escolas a alunos com resultados semelhantes nos exames”. E muitas contestaram a “novidade”, criticando o “modo preconceituoso como a ‘nota técnica’ do MEC”, disponível no portal, falava de uma possível “menor exigência”.

Uma escola pode ser pouco exigente se os alunos são dos que se saem melhor nas provas nacionais? — questionavam os dirigentes de vários estabelecimentos contactados pelo PÚBLICO. E não sabe o MEC que as escolas avaliam os seus alunos tendo em conta, também, os seus projectos educativos, que não são todos iguais nem valorizam todos o mesmo tipo de competências? — interrogavam outras.

A avaliação interna (assim se designa a avaliação feita pelos professores, por oposição a avaliação externa, que é a feita pelos exames nacionais) é, por lei, da responsabilidade dos órgãos e estruturas pedagógicas dos estabelecimentos de ensino. Mas, recentemente, a Inspecção-Geral de Educação e Ciência (IGEC) abriu quatro processos de inquérito para investigar suspeitas de inflação de notas internas. Não disse quais eram as escolas visadas. “A IGEC ainda está a realizar diligências relativamente a estes inquéritos”, limita-se agora a dizer o ministério, em resposta ao PÚBLICO.

Em causa, para o MEC, está este facto: como as notas internas também contam, tal como os exames nacionais, para a nota de acesso ao ensino superior, se houver grande divergência de critérios de avaliação de alunos, entre escolas, fica em causa a equidade no acesso.

Admite-se alguma disparidade entre nota interna e de exame. Mas “todos os casos extremos” de desvio, para cima, ou para baixo, devem merecer atenção, alegava o MEC no início do ano.

Em Janeiro, nas contas do PÚBLICO, com base no Infoescolas, havia 24 escolas, das quais 14 privadas, onde os professores tinham, entre 2009 e 2013, notas significativamente mais elevadas aos seus alunos do que seria expectável. Eram escolas onde “a certeza estatística do desalinhamento para cima” estava “entre as 10% mais fortes do país”. Isto em pelo menos quatro dos cinco anos em análise.

Agora o MEC faz a análise ao que se passou entre 2009 e 2014, escola a escola, no mesmo portal Infoescolas, que acaba de ser actualizado. E o número das que estão nessa situação é de 28. O PÚBLICO tem em conta nesta análise apenas as que aparecem como tendo tido exames do secundário em todos os cinco anos lectivos analisados (de 2009/10 a 2013/14).

No grupo dos 10% maiores desvios para cima, em todos os anos, estão por exemplo, o Colégio D. Diogo de Sousa, em Braga (22.º no ranking nacional feito com base apenas nos exames), o Luso Francês, no Porto (26.º), o Externato Liceal Paulo VI, em Gondomar (27.º) ou o Externato Ribadouro (28.º), no Porto (ver lista completa na infografia). Todas apareciam já na versão anterior do Infoescolas como estando entre as mais desalinhadas para cima.

No outro extremo estão escolas que estão, todos os anos, entre os 10% maiores desvios... mas para baixo. Ou seja, escolas — 11 no total — onde as notas internas estão bem abaixo do esperado em todos os cinco anos.

Ou ainda, dito de outro modo, escolas que “poderão estar” a utilizar critérios de avaliação do desempenho escolar dos seus alunos “mais exigentes do que os critérios utilizados na média” dos outros estabelecimentos. Há sete escolas públicas e quatro privadas neste grupo.

Na sua maioria, estas escolas saem-se bem nos rankings, caso da Escola Técnica e Liceal Salesiana Santo António, em Cascais — os seus alunos tiveram a 4.ª melhor média nacional nos exames do secundário de 2014. Ou da Escola Básica e Secundária da Batalha, que foi uma das públicas melhor colocadas (em 41.º lugar).

No início do ano, Tiago Neves e Gil Nata, dois investigadores do Centro de Investigação e Intervenção Educativas da Universidade do Porto, fizeram aquilo que definiram como um “ranking da inflação” e chegaram à conclusão que “dois alunos com prestação idêntica nos exames nacionais facilmente podem ter discrepâncias de 2 (ou até 4) valores nas suas notas internas, consoante a escola escolhida”.

O tema tem merecido a atenção também do Conselho Nacional da Educação. No ano passado, em mais do que uma ocasião, o presidente, David Justino, desafiou o ministério a tomar medidas.

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