Mesmo em declínio, Boko Haram mata mais de 250 civis numa semana

Grupo responde aos apelos de um Ramadão sangrento lançados pelo Estado Islâmico, a quem jurou fidelidade em Março. Dois ataques no domingo mataram dezenas de pessoas em duas cidades.

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O grupo islamista nigeriano matou mais de 200 pessoas na semana passada, com ataques diários entre terça e sexta-feira AFP

Em poucas horas, na noite de domingo, dois ataques contra civis em duas cidades da Nigéria. Em Jos, no centro do país, duas explosões mataram pelo menos 44 pessoas e feriram outras 67. Horas antes, um bombista suicida matara cinco pessoas numa igreja em Potiskum, a norte.

Os ataques em Jos atingiram um restaurante habitualmente frequentado por governantes e uma mesquita onde se faziam as orações nocturnas do Ramadão. A explosão no restaurante foi causada por uma bomba detonada à distância, mas a explosão na mesquita, que momentos antes fora atingida por rajadas de metralhadora, foi causada por um bombista suicida. Jos, no centro da Nigéria, imagem de um país dividido entre uma maioria muçulmana no norte e uma maioria cristã no sul, foi também atingida por atentados em Dezembro e Fevereiro que mataram dezenas de pessoas.

Nenhum dos ataques de domingo foi reivindicado, mas ninguém duvida que tenham sido da responsabilidade do grupo jihadista Boko Haram. Estes são apenas os últimos ataques de uma sequência mortífera de atentados lançados quase diariamente pelos extremistas desde a última terça-feira. Mais de 250 pessoas morreram numa semana, vítimas de atentados suicidas ou abatidos indiscriminadamente em mesquitas e em suas casas.

O atentado mais mortífero aconteceu durante a noite de quinta-feira, em Kukawa, nas imediações do lago do Chade. Este é agora um dos novos refúgios do Boko Haram, que perdeu nos últimos meses grande parte dos territórios que controlava no esado do Borno, a noroeste, onde nasceu o grupo.

Sobreviventes relatam que cerca de 50 extremistas irromperam pela vila durante a noite e abriram fogo sobre os homens que estavam em orações nas mesquitas. Os extremistas voltaram-se depois para as mulheres e crianças que preparavam refeições em suas casas.

Morreram pelo menos 114 pessoas, segundo as últimas estimativas. Uma gota de água entre as cerca de 15 mil pessoas mortas pelo Boko Haram desde que o grupo surgiu, em 2002. Mas um número surpreendente para uma organização que, de acordo com todos os relatos, está em declínio há meses.

“Actos desesperados”

No início do Maio, o exército nigeriano anunciava aquela que seria a última frente de combate contra o grupo fundamentalista. Seria travada na vasta floresta de Sambisa, o último bastião do grupo no país. Os extremistas estariam sem armas e munições, e todas as semanas perdiam territórios no Borno. Nos primeiros dias desse mês foram resgatadas centenas de raparigas raptadas pelo grupo e o exército da Nigéria divulgava imagens de dezenas de combatentes do Boko Haram a fugirem de bombardeamentos aéreos em Sambisa.

Mas, acossado, o grupo concentra-se agora em ataques isolados contra civis, e não em tentar capturar território onde proclamar um califado africano, como é sua intenção. São “os últimos actos desesperados dos agentes do terrorismo em fuga”, diz Muhammadu Buhari, que tomou posse como Presidente da Nigéria no dia 29 de Maio. De acordo com uma estimativa da AFP, lançada antes dos ataques de domingo, já morreram mais de 650 civis desde que Buhari tomou posse. Muitos dos atentados foram conduzidos por bombistas suicidas e, destes, grande parte eram jovens mulheres.

Esta nova táctica pode estar relacionada com o autoproclamado Estado Islâmico, agora o grupo-mãe dos jihadistas nigerianos. “O Boko Haram pode estar a tentar aprofundar os seus laços com os jihadistas a lutarem no Iraque e na Síria, que pediram ‘um mês de calamidades para os infiéis’”, escreve Will Ross, o correspondente da BBC na Nigéria.

A comunidade internacional olha para a presidência de Buhari com bons olhos. O novo Presidente da Nigéria promete mais cooperação regional contra o Boko Haram e anunciou já que o quartel-general do exército nigeriano passará a ser em Maiduguri, no coração do território do Boko Haram e uma das cidades mais fustigadas pelo grupo jihadista. Buhari quer reformas no seu exército, que os parceiros regionais dizem ser lento, incompetente e que está atolado por burocracias.

Por enquanto, o grupo parece estar longe de vencido. Não há sinais que a liderança do grupo jihadistas tenha sido atingida pelas últimas derrotas. “O Boko Haram continua a ter as ferramentas para reabastecer, reagrupar e conseguir novas armas dentro e fora das fronteiras da Nigéria”, diz à BBC Ryan Cummings, analista em África da empresa de risco Red24.  

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