Grexit? Provavelmente

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Alexis Tsipras prometeu aos gregos, antes do referendo, que um rotundo “não” à proposta que os europeus querem impor à Grécia melhoraria a sua capacidade negocial em Bruxelas.

Este domingo, depois dos resultados, garantiu que conseguiria um acordo com os credores em 48 horas. A urgência resulta da necessidade de abrir os bancos, cujo encerramento está a paralisar a economia. A questão é saber quem é que lhe vai abrir a porta e que acordo vai assinar. Sobre isso, o líder grego não disse nada aos eleitores. Sabe que esse acordo é impossível. A proposta que consta do boletim de voto do referendo já não existe. Aquela que Tsipras levará no bolso não se conhece. A primeira pergunta é, portanto, a que se destina esta promessa vã. Nos últimos dias, a palavra de ordem em Bruxelas e em várias capitais europeias era igualmente simples: um “não” significaria a rejeição do euro. Muitos analistas consideram que será difícil impedir um Grexit depois deste referendo, travado em circunstâncias muito duras para os gregos, que, mesmo assim, arriscaram dizer maciçamente não.

Em face dos números, as reacções europeias foram prudentes. A chanceler alemã já anunciou um encontro com o Presidente francês no Eliseu ao fim do dia. Angela Merkel, que calculou mal o comportamento do seu homólogo grego, averbou uma enorme derrota, talvez a maior desde que é chanceler, dizem muitos analistas, inclusivamente alemães. Precisa de um entendimento com François Hollande para evitar uma reacção europeia em ordem dispersa. O Presidente francês sempre considerou que seria dramática a saída da Grécia do euro. No sábado, antes de conhecer os resultados, numa entrevista ao Bild, o ministro das Finanças alemão foi mais cordato do que lhe é habitual: “O Eurogrupo está aberto a novas propostas, não deixaremos os gregos ao abandono.”

A crise arrasta-se há meses e ainda não há, em Bruxelas ou em Berlim, um plano para responder a este cenário de ruptura. Os analistas têm ideias mais claras. Este voto “vai determinar a trajectória futura da integração europeia”, diz à AFP Pawel Tokarski, da Fundação de Ciências Política de Berlim (SWP). Noutro think-tank alemão, Julian Rappold lembra que a chanceler “não queria que a responsabilizassem pela saída da Grécia”. Um Grexit significaria um fracasso da gestão da crise que é da sua responsabilidade. O Monde escreve que “é difícil não ver no 'não' da Grécia uma pesada derrota para Angela Merkel”.

Na fase final das negociações com Atenas, o SPD não descolou das posições da chanceler. Fez de intermediário com o Syriza e convenceu-se de que haveria uma solução que separasse o trigo do joio dentro da coligação de Tsipras. Este domingo, Sigmar Gabriel, vice-chanceler social-democrata, reagiu aos resultados dizendo a um jornal alemão que “o voto torna difícil imaginar conversações para um novo resgate”. Aponta o dedo a Tsipras, que “dinamitou a última ponte”. É essa a questão fundamental. Antes do referendo, o Governo grego propôs a Bruxelas um programa de apoio financeiro para dois anos no valor de 30 mil milhões. Ora, esse novo empréstimo teria de ser sujeito às condições habituais. “Claro que a porta está aberta aos gregos para um novo resgate”, diz ao Telegraph o vice-presidente da bancada da CDU da chanceler. “Mas será muito difícil porque vai ter de haver condicionalidade.” Ou seja, as reformas que o Syriza não quer aceitar, pelo menos na dose recomendada em Bruxelas.

O que é praticamente unânime é que a Europa tem um problema muito sério para resolver e não sabe como. Os responsáveis europeus acreditaram que os gregos, que querem ficar na Europa, prefeririam votar no “sim”. Esqueceram-se do tamanho dos sacrifícios por que passaram sem verem resultados e da falta de uma alternativa que achem decente.

Os líderes europeus também não dispõem de muito tempo. Atenas não pagou ao FMI na semana passada. Mas o verdadeiro teste é a 20 de Julho, quando tiver de pagar 3,5 mil milhões ao BCE. Uma falta de pagamento teria consequências muito negativas, limitando as medidas não convencionais que o BCE tem adoptado para manter o sistema financeiro a respirar, mesmo que seja já com ventilador. “Basicamente, os bancos [gregos] são insolventes, mas mantemos a ficção de que são solventes para lhes garantir liquidez”, disse uma fonte do BCE ao Telegraph.

Será ainda possível sentar à mesa o primeiro-ministro grego e os seus principais parceiros europeus para uma discussão aberta? O clima azedou demasiado. Tsipras e Varoufakis disseram coisas impensáveis sobre os seus homólogos – o primeiro chamou-lhes “mentirosos”, o segundo “terroristas”. Ganharam uma importante batalha interna. Voltaram, porventura, a acreditar que a sua jogada fundamental continua válida: é tal o medo de um Grexit que agora Berlim vai mesmo ceder. Gideon Rachman chama-lhes no Financial Times “rebeldes sem causa”. Podem sofrer uma desilusão. A chanceler vai ser pressionada até ao limite por todos aqueles que recusam beneficiar um incumpridor. Os que tiveram de cumprir até à última gota (Portugal em primeiro lugar), os que fizeram as suas reformas sozinhos e com muitos sacrifícios (Bálticos), os que se consideram mais pobres do que a Grécia e, finalmente, os que, como a Finlândia, estão já sob influência dos populistas de direita, dispensando decisões que tenham de ir ao Parlamento. Todos olham para o dia seguinte. Era preciso alguém que olhasse um pouco mais além. Os próximos dias serão alucinantes. A Europa enfrentará uma prova de vida para a qual não está preparada. O Grexit é hoje muito mais provável do que ontem. Perdem todos.

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