A favor ou contra as privatizações?

Desde que se eliminou do texto constitucional o princípio da irreversibilidade das nacionalizações, vários foram os governos que procederam a operações de privatização, isto é, venderam a entidades privadas empresas pertencentes ao Estado ou a outras entidades públicas.

Importa lembrar que este processo começa exatamente em março de 1975 com a nacionalização de múltiplas empresas que atuavam em setores significativos da economia (banca e seguros, entre muitos outros). As privatizações foram defendidas e levadas a cabo tanto por governos do PSD (por vezes em coligação com o CDS-PP) como pelos governos do PS, sempre com a oposição do PCP e de outros partidos de inspiração marxista.

Os que defendem as privatizações invocam uma maior eficiência da gestão privada, a necessidade de o Estado obter receitas extraordinárias, as regras da União Europeia que proíbem auxílios públicos a empresas que atuam num mercado concorrencial; invocam ainda os prejuízos crónicos de algumas empresas públicas e o peso da dívida acumulada por algumas dessas empresas.

Os que se manifestam contra as privatizações defendem que não faz sentido privatizar empresas lucrativas, empresas que, pelo seu valor estratégico, devem permanecer na esfera pública, empresas que prestam um serviço público; sustentam também que as privatizações levam em regra a despedimentos.

O que ninguém parece dizer é que os fundamentos de uma ou outra posição são essencialmente ideológicos e é aí que a discussão se deve situar.

Recorde-se que o PCP (e toda a esquerda marxista) sempre defendeu a apropriação coletiva dos meios de produção, ou seja, que todo o aparelho produtivo deve pertencer ao Estado, cabendo a este decidir o que se produz (quando e como), quem produz e para quem se produz. Nega-se a liberdade económica porque se nega também a liberdade política: nada existe fora do Estado e todas as decisões são da competência do Estado.

Pelo contrário, PS, PSD e CDS-PP defendem uma economia baseada na livre iniciativa dos agentes económicos (embora por vezes pareçam esquecer-se disso), uma economia de mercado estruturada em torno das decisões livres dos agentes económicos, agindo devidamente enquadrados e limitados pela lei, pois em democracia não há liberdades ou direitos ilimitados. A economia de mercado é a tradução, no plano económico, da liberdade política e assenta na ideia de que cada pessoa no pleno uso das suas faculdades sabe, melhor que ninguém (que o Estado, designadamente), o que é melhor para si e para os seus.

Assim, a questão não é saber se certa empresa é lucrativa ou não, se está ou não num setor dito estratégico, se o Estado gere melhor ou pior, se o Estado precisa mais ou menos de dinheiro. A questão é saber se queremos para Portugal um regime que tem a pretensão de tudo controlar e tudo decidir ou um regime baseado na liberdade política e na liberdade económica.

Este é o debate. O resto é atirar areia para os olhos dos eleitores.

Docente da Escola de Direito da Universidade Católica Portuguesa, no Porto. O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico.

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