Um carrinho movido a esporos de bactérias e vapor de água

O calor faz evaporar a água, gerando um dos ciclos mais importantes na Terra. Cientistas aproveitaram esta evaporação para gerar energia mecânica e eléctrica usando esporos de bactérias.

O moinho que gira graças à humidade
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O moinho que gira graças à humidade Joe Turner Lin
Sistema auto-sustentável com plaquinhas oscilatórias
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Sistema auto-sustentável com plaquinhas oscilatórias Joe Turner Lin

Tudo começa com a energia do Sol. É este calor que põe em movimento um dos mais importantes ciclos que sustenta a vida na Terra – o da água, que é evaporada, forma nuvens, e volta ao solo na forma de chuva ou de neve. A vida foi interagindo com esta dinâmica: nas plantas, a água entra pelas raízes e sai pelas folhas, evaporando-se. Os esporos das bactérias incham devido ao vapor de água e desincham quando o ar fica seco, como se fossem esponjas. Agora, usou-se o fenómeno dos esporos para accionar um moinho, pôr um carrinho a andar e acender uma luz LED.

Ao contrário dos tradicionais motores a vapor, este método não necessita de combustível para produzir vapor de água. Por isso, é completamente ecológico. A invenção vem descrita num artigo da Nature Communications publicado nesta terça-feira e pode vir a ser desenvolvida para criar electricidade ou para aproveitar a transpiração humana.

“A evaporação é uma força fundamental da natureza”, diz Ozgur Sahin, da Universidade de Columbia, em Nova Iorque, Estados Unidos, um dos elementos da equipa que desenvolveu estas máquinas. “Está em todo o lado, e é mais poderosa do que outras forças como o vento e as ondas”, refere, citado num comunicado da universidade.

As bactérias formam esporos quando as condições do ambiente se deterioram. É uma estratégia de sobrevivência. Há esporos capazes de germinar e tornarem-se bactérias passados milhões de anos. Em 2014, Ozgur Sahin e outros colegas envolvidos no actual estudo publicaram um artigo que avaliava as potencialidades do armazenamento de energia dos esporos das espécies Bacillus subtilis e Bacillus thuringiensis.

A parte externa dos esporos acumula moléculas de água quando há vapor e incha, aumentando assim de tamanho. Depois, na presença de ar seco, as moléculas de água difundem-se para o ar e os esporos desincham, diminuindo de tamanho. Os cientistas pensaram que esta alteração de tamanho podia ser usada para criar movimento.

Agora, aplicaram a ideia. Primeiro, criaram um sistema que esticam e encolhe como as fibras musculares. Numa fita adesiva estreita e muito fina, colaram milhões de esporos inchados e prenderam esta fita a duas extremidades com molas. Quando os esporos secaram e se contraíram, a fita adesiva também se contraiu, obrigando as molas a esticarem-se. Depois, quando os esporos receberam vapor de água, incharam e a fita esticou-se, levando à contracção das molas.

Esta dinâmica foi aplicada num sistema auto-sustentável. A equipa colocou várias fitas com esporos numa placa. Estas fitas estavam todas ligadas a pequenas placas oscilatórias, que estavam localizadas por cima das fitas, tapando-as e não deixando assim o ar subir. Finalmente, por baixo das fitas, os cientistas puseram água. Assim que o fizeram, os esporos absorveram vapor de água que se formou naturalmente e incharam, desencadeando um movimento mecânico que fez oscilar as placas até ficarem na vertical. Isto permitiu que o vapor de água fugisse, tornando o ar seco à volta dos esporos, que também secaram e encolheram. A contracção dos esporos obrigou as placas a ficarem na horizontal. Desta forma, o vapor produzido pela água ficou preso de novo, os esporos voltaram a inchar e o processo recomeçou. Os cientistas ligaram este dispositivo a um gerador electromagnético e conseguiram acender uma luz LED.

Já para criar um moinho de evaporação, a equipa montou uma estrutura completamente diferente, que faz lembrar uma roda para hamsters. Em vez de ter pás, o moinho movia-se graças a um grande número de pequenas tiras de fita adesiva com milhões de esporos numa extremidade.

Metade do moinho estava dentro de uma caixa que tinha uma folha molhada, produzindo humidade naquela região. A outra metade estava ao ar livre, a seco. Os esporos na região húmida inchavam e estendiam a fita. Na região seca, encolhiam e a fita ficava tombada. Esta diferença entre os dois lados produziu a rotação do moinho. A equipa usou ainda este sistema para mover um carrinho de 100 gramas.

Para os cientistas, há muitas vantagens nesta fonte de energia, lê-se no artigo: “Como a evaporação na natureza é um processo ubíquo e os materiais envolvidos são baratos, os motores apresentados aqui podem ter uma aplicação como fonte de energia para muitos sistemas fora da rede eléctrica.” Uma ideia é desenvolver uma central eléctrica que flutue por cima de um lago para aproveitar a evaporação natural.

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