Greve às horas extraordinárias durante um mês no INEM

Presidente do INEM admitiu esta manhã que havia sete ambulâncias paradas em Lisboa, das 21 existentes. Mas garantiu que socorro não está em risco.

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Desde o início deste mês que os técnicos de ambulância de emergência se estão a recusar a fazer horas extraordinárias Nuno Ferreira Santos

Os próximos tempos prevêem-se complicados para os doentes que necessitarem de socorro de emergência em Lisboa, se forem muitos os trabalhadores do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) a aderir à greve às horas extraordinárias convocada já a partir do próximo dia 24, por 30 dias, em pleno período de férias. Cansados de assegurar turnos sucessivos sem descanso e confrontados com um corte no salário relativo a 2013 mas que só agora foi aplicado, os técnicos de emergência têm-se escusado desde o início do mês a fazer mais horas extraordinárias e alguns não têm ido trabalhar, sequer.

Na madrugada de segunda-feira, dezenas juntaram-se num protesto espontâneo, uma vigília que acabou por culminar na apresentação de um pré-aviso de greve pela Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas.  O INEM e Ministério da Saúde garantiram que o socorro está assegurado, porque pediram ajuda e contam agora com “75” ambulâncias de corporações de bombeiros prontas a ser accionadas, se necessário.

O dia ficou marcado por uma guerra de números: de manhã, o INEM dizia que só havia uma ambulância inoperacional, mas ao início da tarde o presidente do instituto, Paulo Campos, admitia que estavam paradas “sete” das “21” existentes em Lisboa, enquanto os dirigentes do Sindicato dos Técnicos de Ambulância de Emergência e da comissão de trabalhadores afirmavam que eram 11 as que se encontravam nessa situação, de um total de 17.

“Lisboa está suportada numa redundância do dispositivo. Temos 75 ambulâncias dos bombeiros a trabalhar em Lisboa”, asseverava Paulo Campos, citado pela Lusa. Ao mesmo tempo, o gabinete do ministro garantia ao PÚBLICO que o socorro "tem vindo a decorrer normalmente em Lisboa", até porque o sistema "não se limita a 21 ambulâncias, são 73".

Para poder dar suporte ao protesto dos trabalhadores, e depois de o ministro da Saúde "ter negado" uma reunião "para discutir a gravíssima falta de pessoal no INEM", a Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas decidiu avançar e emitir o pré-aviso de greve. “Os profissionais estão saturados, estão exaustos. Estão fartos de fazer trabalho extraordinário sem serem pagos por isso, aguardam há meses por negociações para a carreira específica. Chegou-se a uma situação de ruptura que culminou com esta manifestação de repúdio público”, explicou Luís Pesca, da federação.

Ainda vai ser pior

Em resposta aos protestos, o INEM avisou que apresentará queixa ao Ministério Público contra quem contribuir para colocar em risco o socorro urgente a doentes. Pedindo à população para não ficar alarmada, Paulo Campos disse ainda que em Setembro vai haver um reforço de técnicos de emergência com a contratação de 85 profissionais, sem explicar como vai ser assegurado o socorro durante este mês e no período de férias, que habitualmente é mais complicado.

“Em Julho e Agosto ainda vai ser pior, vai ser o caos”, teme Ricardo Rocha, presidente do Sindicato dos Técnicos de Ambulância de Emergência, que lembra que o concurso para a contratação dos 85 novos trabalhadores foi lançado em Janeiro passado e que um procedimento deste tipo "demora normalmente um ano”.

Mesmo este reforço será insuficiente tendo em conta a saída de muitos profissionais, acredita Ricardo Rocha, que estima em "cerca de 250" o número de trabalhadores necessários para suprir as actuais necessidades, incluindo os técnicos de emergência e os trabalhadores dos CODU (Centro de Orientação de Doentes Urgentes).

Filipe Gonçalves, da Comissão de Trabalhadores do INEM, sublinha também que esta situação se arrasta desde há meses e que muita gente foi saindo do INEM, entretanto. "A comissão de trabalhadores não está por detrás desta iniciativa, apesar de a apoiar”, esclareceu.

Desde há meses que tanto o sindicato como a comissão de trabalhadores têm chamado a atenção para a falta de recursos humanos e para o excesso de trabalho nas ambulâncias do INEM. A situação agravou-se com os cortes salariais efectuados este mês e que decorrem da aplicação das regras do Orçamento de Estado de 2013, antes de estas terem sido postas em causa pelo Tribunal Constitucional.  "Na altura, o INEM não fez os cortes por estar à espera da decisão do Tribunal Constitucional e decidiu fazer agora o acerto do período correspondente a Janeiro e Maio de 2013", afirma Ricardo Rocha, sublinhando que esta foi mais uma razão para o descontentamento dos trabalhadores. 

Três euros por hora

Os técnicos de emergência, sintetiza, estão cansados e desmotivados. Mesmo contando com todos os turnos extra, levam para casa ao fim do mês “menos de mil euros”, calcula. Por turnos extraordinários de oito horas recebem “25 euros”, o que dá pouco mais de três euros por hora. Os trabalhadores do Norte e do Centro que têm sido chamados para substituir colegas de Lisboa "não têm recebido as despesas das deslocações", continua. "Os trabalhadores juntaram-se e disseram: basta!", sintetiza, enquanto lembra que, de acordo com a lei, apenas podem fazer 150 horas por ano em turnos extra e "já excederam esse limite há muito tempo".

O INEM foi divulgando vários comunicados nos últimos dias. No último, o “número 5",  adiantava que, "sem aviso prévio", não compareceram ao trabalho 26 técnicos de emergência na manhã de segunda-feira e 21 no período da tarde.  "Apesar desse contratempo, o INEM assegurou a prestação de cuidados de emergência médica na região da Grande Lisboa com um dispositivo" que, entre as 8h e as 16h, foi constituído por 14 ambulâncias, mais duas SIV (com um enfermeiro e um técnico de emergência), uma moto de emergência e um transporte para recém-nascidos entre hospitais.

No comunicado "número 4", o INEM sustentava que “a indisponibilidade dos técnicos de emergência em fazer horas extraordinárias, e as faltas de presença, sem aviso prévio, nas bases e meios operacionais” fizeram com que o instituto pedisse o apoio de várias corporações de bombeiros, que disponibilizaram os já referidos "75 meios de socorro".

No total do país, contabilizou, há “649 meios de emergência médica num sistema redundante de apoio ao cidadão”. “Apesar da situação agora criada, o INEM consegue separar a maioria dos profissionais da instituição de um grupo que insiste em tentar perturbar a confiança” e, acrescentou, mostra-se disponível para uma reunião com o sindicato ainda esta semana. com Lusa

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