Países do Sudeste Asiático juntam-se para combater tráfico de pessoas

Ponto mais sensível é o estatuto da minoria muçulmana rohingya na Birmânia.

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Muitos dos migrantes são muçulmanos rohingya da Birmânia Christophe ARCHAMBAULT/AFP

Os países do Sudeste Asiático decidiram nesta sexta-feira criar uma equipa conjunta de combate ao tráfico de seres humanos, numa inédita reunião que decorreu em Banguecoque, capital da Tailândia.

A declaração final foi cuidadosamente redigida para não hostilizar a Birmânia, que considera estar a ser "estigmatizada" pelas Nações Unidas devido à questão da minoria muçulmana rohingya – durante a reunião, o director-geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros birmanês, Htein Lin, irritou-se com o representante do Alto Comissariado da ONU para os Refugiados, Volker Turk, acusando-o de querer "politizar" a crise migratória na região.

Em causa estão as acusações de que a Birmânia persegue os mais de um milhão de muçulmanos rohingya que vivem no país, negando-lhes o direito de cidadania – o Governo birmanês recusa-se a usar o termo "rohingya" e diz que se trata de cidadãos do Bangladesh.

Milhares de rohingya e de bangladeshianos têm atravessado o Mar de Andamão em condições precárias, e no último mês mais de 4000 pessoas foram resgatadas ao largo da Indonésia, da Malásia ou da Tailândia, devido a um reforço do Governo de Banguecoque no combate aos traficantes de seres humanos. Ainda assim, cerca de 2000 pessoas estarão ainda à deriva no Golfo de Bengala e no Mar de Andamão, segundo os números da ONU.

"Primeiro passo muito importante"
A importância deste encontro na capital tailandesa foi salientada pelo director-geral da Organização Internacional para as Migrações, William Lacy Swing: "É um primeiro passo muito importante. Ter aqui a Birmânia é um ponto-chave. Estou muito optimista, e estamos todos muito agradados com o facto de haver uma ênfase na intensificação das operações de busca e salvamento."

O texto final fala na "promoção do respeito total pelos direitos humanos", mas não faz qualquer referência específica à situação dos muçulmanos rohingya na Birmânia.

"Não se trata apenas do rohingya, como vocês lhes chamam – nós chamamos-lhes bangladeshianos. A linguagem [da declaração final] fala por si. Para a Birmânia, as causas do problema são o desenvolvimento e o sentimento de segurança para todas as pessoas que vivem no estado de Rakhine e no resto da Birmânia", salientou o director-geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros birmanês, Htein Lin, em declarações à agência Reuters.

Nas horas que antecederam o início do encontro em Banguecoque, mais de 700 pessoas foram resgatadas no Mar Mediterrâneo quando tentavam chegar às costas de Itália, e outras 600 foram retiradas do Mar de Andamão pela Guarda Costeira da Tailândia.

Desde o início do ano morreram pelo menos 1770 pessoas, entre mulheres e crianças, quando tentavam atravessar o Mar Mediterrâneo para chegarem a Itália, muitas delas em fuga de países extremamente pobres, de guerras e de perseguição política. No mesmo período do ano passado morreram 56 pessoas.

Nas últimas semanas, o mundo acordou também para a crise migratória no Sudeste Asiático, onde milhares de rohingya e cidadãos do Bangladesh que tentam escapar à pobreza são abandonados no mar por traficantes de seres humanos.

Na noite de quinta para sexta-feira, mais 600 pessoas foram resgatadas pela Guarda Costeira da Tailândia e colocadas em centros provisórios, disse o vice-primeiro-ministro do país, o general Tanasak Patimapragorn, antes do  inédito encontro em Banguecoque que juntou representantes de 17 países da região, de outros países asiáticos, dos EUA, da Suíça e de organizações como o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados.

A Birmânia aceitou enviar um representante, mas deixou claro que não aceitaria discutir qualquer solução que passasse pelo reconhecimento dos muçulmanos rohingya como cidadãos do país. "Vamos lá apenas para discutir a crise regional que todos os países-membros da ASEAN [Associação de Nações do Sudeste Asiático] estão a enfrentar", disse o director-geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros birmanês antes do arranque do encontro.

A reunião estendeu-se também a todo o Oceano Índico, mas a Austrália disse que não aceitaria servir de país de acolhimento para os migrantes resgatados no Sudeste Asiático.

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