Câmara de Lisboa reclama parecer vinculativo na poda e abate de árvores

Na quarta-feira, o município discute o Projecto de Regulamento Municipal do Arvoredo. O vereador da Estrutura Verde admite que desde que a intervenção no arvoredo transitou para as juntas tem havido casos de "poda excessiva" e falta de "informação devida" às populações.

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Vereador reconhece que na Av. Guerra Junqueiro "houve algumas divergências entre os serviços da câmara e a junta" Enric Vives-Rubio

A Câmara de Lisboa quer que as intervenções de poda, abate, transplante ou outra que “fragilize” as árvores da cidade passem a estar sujeitas ao seu parecer vinculativo. Isso mesmo consta do Projecto de Regulamento Municipal do Arvoredo de Lisboa, cuja importância enquanto “documento orientador”, no qual se dão a conhecer “as melhores práticas” na área, é sublinhada pelo vereador da Estrutura Verde.

Nas últimas semanas, Lisboa tem estado em alvoroço devido a uma série de intervenções no arvoredo, promovidas por juntas de freguesia que com a reforma administrativa concretizada em 2014 passaram a ter a competência de “gerir e assegurar a manutenção de espaços verdes”. A única excepção são aqueles que foram considerados “estruturantes”, como o Jardim da Estrela, a Tapada das Necessidades e a Mata de Alvalade, e que permaneceram sob a alçada da câmara.

O abate de árvores no Jardim Cesário Verde, em Arroios, e a poda de árvores na Avenida Guerra Junqueiro, no Areeiro, foram apenas duas das intervenções recentes contra as quais se insurgiram muitos cidadãos, nomeadamente devido à sua dimensão e à falta de informação ao público. O assunto foi também levantado na Assembleia Municipal de Lisboa onde, no início de Maio, o vereador da Estrutura Verde, José Sá Fernandes, fez saber que o município estava “a preparar um regulamento próprio” sobre o arvoredo da cidade.

Esse projecto de regulamento vai ser discutido esta quarta-feira em reunião camarária. Na proposta na qual se determina a sua sujeição a “apreciação pública”, para “recolha de sugestões”, explica-se que o objectivo do documento é “criar um quadro de actuação que promova e sistematize as intervenções no planeamento, implantação, gestão e manutenção do arvoredo, para todos os intervenientes”. E também “tipificar infracções mais frequentes a que o arvoredo está sujeito, regular contra-ordenações e fixar as respectivas coimas”.

Em declarações ao PÚBLICO, o vereador Sá Fernandes começa por sublinhar que este regulamento, como atestam a sua “extensão e especificidade”, “não foi feito numa semana, estava a ser elaborado há bastante tempo”. O autarca nega assim que haja uma relação directa entre as polémicas das últimas semanas e o surgimento do documento.

Questionado sobre se este regulamento não deveria ter sido concluído a tempo da transferência de competências para as juntas de freguesia, Sá Fernandes desvaloriza que isso não tenha acontecido. “Há mais do que tempo”, diz, garantindo que desde Março de 2014 “a câmara tem tido sempre uma relação com as juntas de freguesia, tem estado à sua disposição para dizer como acha que se deve fazer”.

Num dos seus princípios gerais do regulamento, ao qual o PÚBLICO teve acesso, estabelece-se que “sempre que haja necessidade de intervenção que implique a poda, o abate, o transplante ou outra operação que de algum modo fragilize as árvores, deverá ser previamente sujeita a parecer vinculativo da Câmara Municipal”. Isto, explica-se, “de forma a determinar os estudos a realizar, medidas cautelares e modo de execução dos trabalhos”.

Confrontado com este aspecto, o vereador da Estrutura Verde diz a existência de um parecer vinculativo é de facto a proposta da câmara, mas admite que na sequência da consulta pública se possa chegar a “outra maneira” de os diferentes órgãos autárquicos “trabalharem em conjunto”. “Este não é um documento de conflito, é um documento de consenso”, afirma.  

“O mais importante é que haja um documento orientador”, frisa ainda Sá Fernandes, defendendo que ele pode ser “uma boa ajuda para se perceber quais são as boas práticas”.  

Além de princípios gerais, entre os quais o de que “os tratamentos fitossanitários deverão ser reduzidos ao estritamente necessário e efectuados por pessoal habilitado”, o documento elenca um conjunto de proibições. Nomeadamente as de “substituir exemplares removidos por espécie diferente, excepto se enquadrado num plano de substituição de arvoredo elaborado ou aprovado pela CML [Câmara Municipal de Lisboa]” e “abater árvore sem autorização da CML, excepto nas situações de emergência, atestadas pela Protecção Civil Municipal”.   

Período preferencial para poda nem sempre cumprido

A “poda de manutenção” das árvores deve ser “preferencialmente executada nos meses entre Novembro e Abril”, período que para os jacarandás e tipuanas é reduzido para os meses de Março e Abril. Esta “norma técnica” consta de um dos anexos do Projecto de Regulamento Municipal do Arvoredo de Lisboa, reconhecendo o vereador da Estrutura Verde da câmara que ela nem sempre tem sido cumprida.

“Há um caso ou outro em que a poda não tem sido feita na altura devida”, admite Sá Fernandes, salientando no entanto que aquilo que se indica no regulamento é um período preferencial, que pode não ser respeitado quando houver “circunstâncias devidamente justificadas”. O autarca afirma também que desde que a manutenção do arvoredo transitou para as juntas de freguesia os serviços da câmara detectarem casos de “poda excessiva” e de falta de “informação devida às populações”.

Confrontado com o exemplo da Avenida Guerra Junqueiro, onde o presidente da Junta de Freguesia do Areeiro já confessou que na poda de algumas árvores se “foi um bocado longe demais”, Sá Fernandes explica que “houve algumas divergências entre os serviços da câmara e a junta”. “Algumas árvores podem ter tido uma poda excessiva, outras provavelmente não”, diz em relação a essa artéria. E irão essas árvores recuperar do mal que foi feito? “Não sou adivinho mas acho que sim”, remata.

Quanto à divulgação de informação às populações sobre as intervenções que vão ser realizadas no arvoredo, Sá Fernandes considera que não chega colar nas árvores uma folha com o dia e hora em que elas vão ser feitas e os constrangimentos que implicarão na circulação e estacionamento na zona. “A câmara já aconselhava as juntas a serem mais dinâmicas, mas algumas juntas não o fizeram”, diz o vereador.

No regulamento diz-se que as intervenções devem ser divulgadas “com antecedência de dez dias úteis”, numa informação que “deve ser afixada nos locais de aviso da junta de freguesia, nos respectivos sítios na Internet da CML e da junta de freguesia e nos locais da intervenção”. Nas árvores podem ser colocados avisos, “desde que utilizada fita adesiva”, não sendo em caso algum “permitido o uso de pregos ou outro material perfurante da casca ou lenho da árvore”.      

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