Podemos ganha aposta nas candidaturas populares, Ciudadanos fica aquém do esperado

Os dois novos partidos fazem contas e reavaliam estratégias. Permitir ao PSOE e ao PP governar é apostar na estabilidade, não o fazer é correr menos riscos, a seis meses das legislativas.

Pablo Iglesias exige  “tolerância zero com a corrupção”
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Pablo Iglesias exige “tolerância zero para com a corrupção” Andrea Comas /reuters
Albert Rivera exige ao PP primárias para escolher a sua liderança
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Albert Rivera exige ao PP primárias para escolher a sua liderança PIERRE-PHILIPPE MARCOU/AFP

Ana García tem 29 anos e este domingo votou “pela primeira numa mesa eleitoral e com convicção”. A viver fora nos últimos anos, votava por correspondência, “no PSOE quase sempre, nunca no PP”. De volta à sua cidade, Madrid, a jovem realizadora votou na Escola de Ensino Especial San Rafael, no bairro central de Chamberí. Para a câmara, na candidatura Ahora Madrid, de Manuela Carmena, apoiada pelo Podemos, para a comunidade no partido de Pablo Iglesias.

“Tenho dúvidas sobre as propostas deles em relação aos impostos e, como trabalhadora por conta própria, tenho de ter isso em conta”, diz. “Mas de resto, em termos de projecto, de ideologia, concordo em tudo. Saíram do 15M, o movimento mais importante e forte que o meu país viveu em toda a minha vida.”

As percentagens finais de votos não dão a expressão do sucesso do Podemos, partido criado no início de 2014. A estratégia de apoiar candidaturas populares nas corridas aos municípios, “marcas brancas”, como descrevem os analistas, leva a que some muitos menos votos do que o apoio que obteve.

Com estas municipais e autonómicas, a seis meses das legislativas, tornou-se num partido decisivo para os equilíbrios políticos. Mais: tem capacidade, se assim o entender, para garantir estabilidade e condicionar governos de esquerda nos municípios e nas comunidades.

Venceu na cidade de Barcelona, quase conquistou Madrid, tornou-se na segunda força em Cádis, elegendo oito vereadores e retirando a maioria absoluta ao PP, e ficou a um lugar do PP em Saragoça. Nestas e noutras cidades, pode formar maiorias e governar, assim como pode negociar com outras formações de esquerda para ajudar a construir alternativas estáveis de poder em vários parlamentos regionais (Extremadura e Castela La Mancha, por exemplo), onde os conservadores viram fugir-lhes todas as maiorias absolutas.

Iglesias foi um dos primeiros líderes a falar. O Podemos, garante, “está de braços abertos e pode negociar com toda a gente”, desde que do outro lado estejam pessoas que tenham “tolerância zero com a corrupção”, apostem na defesa dos direitos sociais e queiram “limitar as políticas de cortes” – os que até agora aplicaram estas políticas, avisa, “terão de dar uma volta de 180 graus”. Os eleitores, avalia, “não votaram pacto, votaram mudança”.

Em votos absolutos, a formação de Iglesias nem chega ao pódio. É o Ciudadanos que alcança o lugar de terceira força, com 6,55%. Mas o partido de Albert Rivera, que nasceu na Catalunha há nove anos e só agora se tornou num partido nacional, aproveitando o desejo de mudança que a esmagadora maioria dos espanhóis manifestava em repetidos inquéritos, esperava ser fundamental para formar governos em mais munícios e comunidades.

Acreditava que teria a chave da governação em Navarra, Canárias e Castela La Mancha. Enganou-se. Poderá fazê-lo em Múrcia, Rioja e Castela y Leon, onde o PP terá de encontrar apoios. O partido de Rivera também antecipava que entraria no governo da capital, mas os votos de Carmena, apoiada pelo Podemos, tornam esse cenário impossível. Somados, os 21 vereadores da conservadora Esperanza Aguirre e os sete do Ciudadanos não chegam. Pelo contrário, os 20 de Carmena e os nove dos socialistas são os 29 que permitem governar em maioria.

Como prémio de consolação, o Ciudadanos está em posição de obrigar o PP a negociar se quiser manter-se no governo da comunidade de Madrid, onde a lista encabeçada por Begoña Villacís, jurista de 37 anos, elegeu conselheiros suficientes para negociar uma maioria com Cristina Cifuentes, candidata do partido de Mariano Rajoy.

Exigir primárias ao PP

Só na terça-feira é que o partido vai reunir a sua comissão de acordos, mas Rivera já repetiu que “as condições fundamentais para chegar a pactos serão três: regeneração democrática, recuperação económica e coesão social”. Mantém-se ainda a exigência que tem como destinatário único o PP – PSOE e Podemos já escolhem os seus líderes em eleições primárias; os populares terão de passar a fazê-lo se quiseram o apoio do Ciudadanos. “Essa condição estará sempre em cima da mesa.”

Sublinhando que o seu partido “triplicou o resultado das europeias” de há um ano, a primeira vez que concorreram a eleições fora da Catalunha, Rivera descreveu esta campanha como “complicada”. O jovem líder de 35 anos que colocou as expectativas demasiado altas diz agora que “o objectivo era estabelecer as bases de um projecto nacional que vai continuar a avançar nos próximos meses”.

O desafio, afirma, “era ter listas, poder apresentá-las”, trabalhar na implantação nacional de um partido que aproveitou o caminho aberto pelo Podemos. Rivera concluiu que o desafio foi alcançado: “Tivemos um êxito categórico e demos um passo histórico”.

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