Ex-primeira-ministra da Tailândia começa a ser julgada por negligência criminosa

Apoiantes dos irmãos Shinawatra dizem que julgamento de ex-primeira-ministra é uma tentativa de os militares consolidarem o poder na Tailândia.

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Yingluck Shinawatra foi recebida às portas do tribunal por duas centenas de apoiantes, num desafio às leis de censura do regime militar Chaiwat Subprasom/Reuters

A ex-primeira-ministra da Tailândia declarou nesta terça-feira, na sua primeira audiência em tribunal, que está inocente das acusações de negligência criminosa na atribuição de subsídios a agricultores pelo seu Governo. Yingluck Shinawatra, que foi afastada do poder em 2014, pagou quase 800 mil euros em fiança para sair em liberdade, mas está impedida de viajar para fora do país sem autorização.

Yingluck é acusada de ter permitido a existência de esquemas de corrupção em torno dos subsídios concedidos para a plantação de arroz, mas os seus apoiantes e os críticos do actual regime militar tailandês dizem que o processo judicial foi fabricado para afastar a ex-primeira-ministra e a sua família do poder. De acordo com a BBC, nenhum dos casos de corrupção de que Yingluck é acusada de encobrir foi ainda provado em tribunal.

Em Maio de 2014, o Tribunal Constitucional tailandês afastou Yingluck do Governo por crimes de abuso de poder. Duas semanas depois, o exército fez um golpe de Estado, suspendeu a Constituição e formou a junta militar que agora governa o país. Desde então que os militares procuram consolidar o poder no país. Em Janeiro, Yingluck foi retroactivamente impugnada do cargo de primeiro-ministro por um Parlamento designado pela junta militar e proibida de exercer cargos políticos durante cinco anos. Em causa estavam novamente as acusações de negligência que enfrenta agora em tribunal.

A Tailândia, um dos principais exportadores de arroz no mundo, teve prejuízos de mais de quatro mil milhões de euros nos subsídios à produção de arroz, que pagavam aos produtores acima dos preços de mercado. Yingluck e o seu partido Pheu Thai (Os Tailandeses Amam a Tailândia, populista) têm nas zonas rurais a sua principal base eleitoral, o que contribuiu para que estes subsídios fossem vistos então como uma medida populista e danosa para o país, apesar de o Governo dizer que o seu objectivo era ajudar os camponeses pobres.

Yingluck e o seu irmão Thaksin, também ex-primeiro-ministro, gozam ainda do apoio de uma importante fatia da população. Nesta terça-feira, dezenas de apoiantes da ex-primeira-ministra concentraram-se no exterior do tribunal, desafiando as leis da junta militar que restringem severamente a liberdade de expressão política. Um grupo de cerca de 200 pessoas lançou gritos de protesto à chegada de Yingluck e censurou o actual regime: “Yingluck é a primeira-ministra do povo! É preciso lutar!"

“Estou confiante na minha inocência”, disse Yingluck aos jornalistas. Caso seja considerada culpada, ficará sujeita a penas que podem ir até aos dez anos de prisão. “Espero que o tribunal faça justiça e que tudo vá de acordo com os processos previstos na lei”, disse Yingluck, citada pela Reuters. A próxima audiência ficou agendada para o dia 21 de Julho. 

O fantasma Thaksin
Há décadas que a Tailândia convive com um cenário político tumultuoso. Desde que caiu a monarquia absolutista no país, em 1932, houve já 12 golpes de Estado diferentes. Dois deles em menos de cinco anos e ambos contra os irmãos Shinawatra.

Antes de Yingluck Shinawatra, também o seu irmão, Thaksin Shinawatra, foi afastado com um golpe de Estado em 2006. Desde então que Thaksin vive em exílio, enfrentando na Tailândia acusações de corrupção.

Consequência das consecutivas lutas de poder no país, a população tailandesa está intensamente dividida. O partido dos Shinawatra, o Pheu Thai, é apoiado sobretudo nas zonas rurais a norte e conseguiu as maiores vitórias eleitorais no país na última década. 

Mas a elite de Banguecoque opõe-se aos Shinawatra, que acusam de serem corruptos. Foi sobretudo na capital, por exemplo, que se concentraram os protestos contra Yingluck Shinawatra – também acusada de estar a ser instrumentalizada pelo irmão, que a partir do exílio lhe daria as coordenadas para o governo do país – nos meses que antecederam o golpe militar de Maio do ano passado.

Thaksin Shinawatra recusou no tribunal a ideia de que estaria a planear mobilizar os apoiantes do Pheu Thai contra o regime militar. De viagem à Coreia do Sul, Thaksin afirmou que a “democracia prevalecerá mais cedo ou mais tarde”, mas que os tailandeses terão de ser “pacientes” e “pacíficos”.

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