Mediterrâneo: mais lágrimas de crocodilo?

Sei o que custou vencer a relutância dos Estados-membros e a má vontade de responsáveis da Frontex que diziam em voz alta que não eram a Cruz Vermelha.

Há dois anos assistimos ao mesmo. As fotos dos caixões em Lampedusa confrontaram a opinião pública europeia com a dimensão da tragédia. Homens, mulheres e crianças desesperados fugiram da guerra e da miséria e acabaram mortos no Mediterrâneo depois de terem engordado os bolsos dos traficantes de seres humanos.

Todos os dirigentes políticos se confessaram chocados, exprimiram consternação e prometeram decisões.

Aumentou-se o orçamento da Frontex (Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas) e aprovou-se o Regulamento n.º 656/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, que estabelece regras para as missões da Frontex e determinou que a prioridade destas deve ser "salvar vidas".

Tive a honra de presidir aos trílogos de negociação como relator do Parlamento Europeu e sei o que custou vencer a relutância dos Estados-membros e a má vontade de responsáveis da Frontex que diziam em voz alta que não eram a Cruz Vermelha. Mas o PE conseguiu, com amplo consenso da maioria dos seus grupos políticos, impor como prioridade das missões da Frontex: "Salvar Vidas", ou seja, missões de busca e salvamento (SAR — search and rescue).

A situação do Norte de África, a guerra da Síria, a desintegração da Líbia e a barbárie do autodesignado Estado Islâmico aumentaram a pressão migratória.

Medidas de longo prazo são necessárias mas demoram tempo a dar resultados. Entretanto a prioridade só pode ser uma: Salvar Vidas! Por isso temos de REFORÇAR as missões de busca e salvamento.

Há quatro decisões que devemos tomar já:

1.º Aplicar sem mais demoras o Regulamento 656/2014;

2.º Reforçar a Frontex em meios financeiros e operacionais (humanos e materiais);

3.º Não ceder à tentação de só fazer "europeu". Apoiar as boas iniciativas dos Estados-membros (o Mare Nostrum italiano foi mais eficaz do que o programa europeu Tritão);

4.º Reforçar a solidariedade intraeuropeia. Não podemos deixar sozinhos, entregues à sua sorte, os países da linha da frente (Itália, Malta, Grécia...).

Na segunda-feira, o Conselho de Ministros dos Negócios Estrangeiros, da Justiça e da Segurança Interna aprovou um plano de ação com dez medidas. Muito parecido com o que tinha aprovado há dois anos. Repetem-se os mesmos compromissos e as mesmas declarações, mas com uma diferença importante. Nunca se fala em solidariedade nem em missões de busca e salvamento. Duas omissões graves e lamentáveis!

Hoje reúne-se o Conselho Europeu. Espero que seja mais consequente do que os ministros que se  reuniram na segunda-feira e que não se limitem a repetir o que disseram há dois anos.

Precisamos de medidas urgentes e eficazes e não de mais lágrimas de crocodilo.

Deputado do PSD ao Parlamento Europeu

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