Nóvoa é “manobra de diversão perigosa” para o PS

Dirigentes nacionais socialistas identificam tentativa de “estratégia do facto consumado” para imposição de Sampaio da Nóvoa como candidato.

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Sampaio da Nóvoa Miguel Manso

A percepção está a disseminar-se no interior do PS e poderá mesmo acabar por prejudicar o próprio Sampaio da Nóvoa. O possível avanço do ex-reitor da Universidade de Lisboa para uma candidatura à Presidência da República gera preocupação no interior do Partido Socialista (PS), inclusive no seio da direcção do partido, que debateu na segunda-feira a questão na reunião do secretariado.

Pedro Bacelar Vasconcelos, membro do secretariado do PS, confirmou ter defendido nessa reunião o mesmo que defendera já noutros locais. “Esta distracção com uma mistura de estratégias individuais com outros jogos e interesses é desvalorizadora do acto eleitoral de Outubro”, disse o constitucionalista ao PÚBLICO, referindo-se às legislativas.

Depois de frisar que uma candidatura a Belém é “construída sobre a iniciativa individual” e que seria “aberrante que fossem os partidos a promovê-la”, Bacelar Vasconcelos não deixou de fazer notar que o momento “decisivo” para o PS são as próximas eleições legislativas. E por isso reconheceu a candidatura de Sampaio da Nóvoa como uma “manobra de diversão perigosa em relação à questão principal que é derrotar este Governo”.

Bacelar Vasconcelos não está sozinho na leitura que faz. Um outro elemento do secretariado, que não quis identificar-se, afirmou ao PÚBLICO reconhecer manobras subterrâneas no presente cenário para a imposição de um candidato ao principal partido da oposição e até “intimidar outros potenciais candidatos mais bem preparados”. “Estão a tentar criar uma estratégia do facto consumado, mas esta questão não está fechada”, disse este secretário socialista.

Um outro dirigente nacional e ex-governante corroborou essa percepção. “Há movimentos internos que estão a querer manipular isto tudo”, afirmou este socialista.

“O PS não se pode deixar manietar por um grupo esquerdista”, resume o socialista que faz parte do secretariado. Porque a imagem de Sampaio da Nóvoa desvia o PS da área que garante as vitórias eleitorais. “Este Governo fez o favor ao PS de deixar o centro virgem”, frisa. “Sampaio da Nóvia pode alienar o eleitorado do centro”, corrobora o ex-governante.

Ainda assim, a candidatura tem colhido apoios no PS. Ontem, o ex-candidato a Belém Manuel Alegre veio a público elogiar o ex-reitor como "um democrata que se identifica com o 25 de Abril, um  homem de esquerda e não um esquerdista", além de ser "um académico e um intelectual brilhante". E aproveitou para criticar os que se insurgiram contra Sampaio da Nóvoa. “Os erros de alguns dirigentes do PS são em parte responsáveis pelo facto de Cavaco Silva ser Presidente da República. É bom que esses erros não se repitam”, disse ao Diário de Notícias.

Foi a resposta à reacção virulenta de Sérgio Sousa Pinto, membro do secretariado de António Costa, a uma entrevista de Sampaio da Nóvoa. “Assistimos com horror à demagogia venezuelana do Podemos e o fenómeno político latino-americano apareceu-nos pela porta traseira. Esta não é a minha esquerda. Antes do partido dos mujiques que do movimento do Mujica”, concluiu.

Também Vera Jardim, ex-ministro da Justiça e militante do PS, considerou que Sampaio da Nóvoa não tinha o perfil adequado. “Eu não me revejo em perfis de candidatos – o outro candidato, Henrique Neto, tem um perfil idêntico – muito interventores, mais como programa de governo, quase como programa do exercício da magistratura do Presidente da República, e, portanto, eu não me vejo a apoiar essa candidatura", disse em declarações à Rádio Renascença.

Mas as desvantagens do aparecimento do ex-reitor não se limitam aos resultados eleitorais. “Não se estão a criar condições para que apareça um candidato sério”, defende o antigo governante. O risco, acrescentou, era o de o PS se ver perante a inevitabilidade de apoiar um candidato “com todas as características de um líder populista que se põe a atacar nas suas entrevistas os partidos e os políticos”. “O próximo Presidente da República será um elemento chave do sucesso do país na próxima década. Como será, se nas legislativas não houver maioria absoluta, se for necessário gerir a constituição de coligações governativas?”, questiona-se Vera Jardim.

Certo é que, para os dirigentes socialistas contactados, Sampaio da Nóvoa não tem ainda o apoio de António Costa. “Não acredito nisso, nem me parece curial”, disse Bacelar Vasconcelos. Sobre se Sampaio da Nóvoa estaria a tentar impor a sua candidatura ao PS o dirigente reconheceu que o ex-reitor “tem tentado construir o seu caminho”. “Mas que isso venha a alterar o nosso calendário, isso já considero que não deve”, disse Bacelar Vasconcelos. 

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