Sem “perder tempo”, a Grécia prepara as reformas nas negociações técnicas

Varoufakis enterra a troika, Schäuble recupera a expressão. Ao jogo de semântica seguem-se as discussões em Bruxelas. Eurogrupo avisa que a última tranche só é entregue com as reformas em marcha.

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Yanis Varoufakis EMMANUEL DUNAND/AFP

Tudo em aberto nas negociações com a Grécia. Mais do que decisões para anunciar, o resultado da reunião dos ministros das Finanças da zona euro desta segunda-feira serviu para Atenas e os parceiros europeus reafirmarem as posições dos últimos dias e organizarem a base comum das negociações técnicas que agora vão começar.

O Presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, marcou o passo ao início da tarde. “É preciso deixar de perder tempo”. E poucas horas passaram para se saber que começam já na próxima quarta-feira as discussões técnicas entre o Governo grego e os credores internacionais, representados pela União Europeia e o Fundo Monetário Internacional (FMI). Só com as negociações em curso haverá a entrega da última tranche do empréstimo, diz Dijsselbloem. Atenas responde que vem aí mais uma fornada de reformas a caminho.

Será em Bruxelas – sede da Comissão Europeia e do Conselho – onde vão estar centradas as negociações, embora continue presente em Atenas uma equipa técnica a acompanhar os trabalhos, para facilitar a troca de informação.

A deslocação do centro de negociações para o “coração” da Europa é uma novidade nos últimos quase cinco anos de presença da troika na Grécia. E acabou por ser a única novidade palpável a sair do encontro de ministros das Finanças da zona euro, sublinhada tanto pelo novo Governo grego, como pelo presidente do Eurogrupo, que disse não haver mais tempo a perder.

Há entre os ministros das Finanças da zona euro uma certa impaciência pelo facto de o Governo grego ainda não ter começado a trabalhar com as instituições. “As verdadeiras negociações ainda não começaram”, lamentou Dijsselbloem na conferência de imprensa que se seguiu à reunião, a primeiro depois de Atenas ter apresentado aos parceiros a lista de reformas que pretende concretizar nos próximos meses.

O acordo anterior, afirmou Dijsselbloem, era “bastante claro”. “Dizia que a Grécia trabalharia construtivamente e rapidamente com as instituições, para chegar a um acordo no máximo até o final de Abril, mas eu sempre disse que preferia que fosse mais cedo”.

Ainda não havia sinal de fumo branco no Eurogrupo, apenas a certeza de que seria uma reunião célere, e já o Governo grego anunciava um resultado “positivo”, com a primeira reunião técnica marcada para quarta-feira em Bruxelas. A dúvida que continua por responder é saber quem será o representante máximo do Governo grego nas negociações.

O ministro das Finanças irlandês, Micheal Noonan, afirmou que seria o número dois de Alexis Tsipras, Yannis Dragasakis, a conduzir os trabalhos, substituindo Yanis Varoufakis, mas fontes governamentais gregas desmentiram logo essa informação, assim como o próprio ministro das Finanças na conferência de imprensa após a reunião.

Varoufakis insistiu no fim da missão externa da Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional, afirmando: “A troika acabou”. Dijsselbloem referiu-se sempre às “instituições”. Mas nem por isso a expressão saiu do léxico de outros ministros, como Wolfgang Schäuble, que disse que o Governo grego deve agora “negociar com a troika”. “Penso que não há nada de novo no que diz respeito à Grécia”, disse Schäuble, ainda antes da reunião.

Empréstimo faseado
Pressionada pelas necessidades de tesouraria, Atenas diz estar pronta a executar as sete reformas apresentadas aos parceiros europeus na semana passada como contrapartida a receber a próxima tranche do empréstimo, necessária face aos compromissos financeiros, execução da despesa corrente. E Yannis Varoufakis afirmou que a carta enviada na sexta-feira ao Eurogrupo contém apenas uma “primeira fornada de reformas” e que “muitas mais virão”, adiantando já que Atenas já tem “umas outras sete” medidas prontas.

Depois de um acordo de princípio com o Eurogrupo, o Governo helénico enviou na última sexta-feira aos parceiros europeus um documento onde detalha algumas das medidas que quer implementar para gerar mais receita e para controlar a despesa pública. No rol de medidas encontram-se reformas destinadas a combater a fraude e a evasão fiscais (com um plano que inclui “inspectores não-profissionais”, uma espécie de clientes-mistério, a controlar no terreno – lojas e restaurantes, por exemplo – os comportamentos fraudulentos), um plano de amnistia fiscal (para o pagamento voluntário de dívidas ao fisco), legislação para legalizar o jogo online, um plano para criar um conselho de finanças públicas (destinado a avaliar de forma independente as políticas orçamentais).

Já o presidente do Eurogrupo voltou a afirmar que é preciso, primeiro, começar a negociar, e só depois falar no empréstimo. Quanto à possibilidade de enviar uma parte da última tranche antes da data prevista no final do mês de Abril, a porta não está totalmente fechada, mas a Grécia terá de fazer mais para o Eurogrupo aceitar essa possibilidade. “Não pode haver discussões sobre um desembolso antecipado sem haver acordo nem implementação [das medidas]”, avisou Dijsselbloem. “Se a implementação estiver bem lançada, eu estaria aberto a considerar ter o desembolso em várias tranches, como já foi feito”, referiu.

O Eurogrupo quer ver os resultados. E há quem sublinhe entre os parceiros europeus – como o secretário de Estado das Finanças alemão, Steffen Kampeter – que o desembolso da próxima tranche só está garantido depois de concluídas as negociações com a troika.

Depois do episódio que levou Madrid e Lisboa a contestarem a acusação grega de que os dois países ibéricos formavam um “eixo contra Atenas”, Varoufakis apareceu em Bruxelas esta segunda-feira a abraçar o homólogo espanhol, Luis de Guindos. Mas não se cruzou com a ministra das Finanças portuguesa. Maria Luís Albuquerque disse não ter tido oportunidade de se encontrar com Varoufakis. Este confirmou. E deu uma explicação “puramente geográfica” para o sucedido, dizendo que a ministra se encontrava “do outro lado da mesa”.

Questionada por jornalistas sobre se tentou clarificar as divergências entre os governos gregos e português, a ministra das Finanças garantiu que “não há nada para esclarecer”. Para Maria Luís Albuquerque, a polémica da semana passada “não merece grande desenvolvimento”.

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