As novas “portas da percepção” de Monika Sosnowska

Artista polaca intervém no museu desenhado por Álvaro Siza numa exposição que abre esta sexta-feira.

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Peça da instalação Mercado Nelson Garrido
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“Sou uma admiradora da arquitectura de Álvaro Siza, e a minha preocupação inicial foi responder a este grande desafio”, diz Monika Sosnowska Nelson Garrido
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Antecâmara é uma ideia inicialmente levada à Bienal de Veneza de 2011 e que agora foi adaptada a Serralves Nelson Garrido
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Peça do conjunto de sete inspirado no tema da construção civil na Polónia Nelson Garrido
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Buracio dialoga directamente com a luz do edifício de Siza Nelson Garrido
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Arquitectonização é a maior exposição jamais dedicada à obra da artista polaca Nelson Garrido
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A artista polaca já representou o seu país na Bienal de Veneza Nelson Garrido
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“Eu construo as peças como potencialmente originais, depois transformo-as, mas não sinto que as danifique”, disse Monika Sosnowska Nelson Garrido

É à saída de Arquitectonização que o visitante experimenta a sensação mais inesperada da exposição que a polaca Monika Sosnowska (n. Ryki, 1972) inaugura esta sexta-feira no Museu de Serralves, no Porto: uma sucessão de várias portas – um número dificilmente quantificável, “que em última instância depende da percepção de cada pessoa”, diz a própria artista – que abrem umas contra as outras, criando uma estranha percepção e obrigando quase a um exercício físico de contorção e adaptação ao espaço.

A escultura de Monika Sosnowska convoca-nos para esta relação estreita com a arquitectura – daí o título Arquitectonização. Mas não se trata, aqui, de nenhuma entronização da arquitectura. “A obra escultórica de Sosnowska é marcada por uma relação dinâmica com o espaço arquitectónico. Se as estruturas são estáticas, os corpos que as percepcionam e se movem através e em volta delas não o são”, escreve Suzanne Cotter, directora do Museu de Arte Contemporânea de Serralves (MACS) e comissária desta exposição, no texto do catálogo que há-de vir a acompanhá-la, com edição prevista dentro de uma semana.

Cotter e Sosnowska guiaram, esta quinta-feira, uma visita à terceira das quatro exposições – as outras sendo Oskar Hansen – Forma Aberta (desde 30 de Janeiro), Pode o museu ser um jardim – Obras da Colecção de Serralves (desde 6 de Fevereiro), e Salomé Lamas. Paraficção (também a inaugurar esta sexta-feira) – que marcam a programação do novo ano em Serralves, e que terão uma festa geral de inauguração no próximo dia 27 de Fevereiro.

Nesta visita guiada para a comunicação social, a directora de Serralves explicou que esta é não só a primeira exposição de Sosnowska em Portugal, como “provavelmente a maior mostra alguma vez dedicada ao seu trabalho em todo o mundo” – no ano passado, a artista polaca expôs em Nova Iorque, e esteve na Bienal de Veneza em 2003 e 2011.

A relação da escultura de Sosnowska com o museu começa logo no pátio que antecede a entrada, com a peça Balaustrada (2015), uma teia helicoidal de aço pintado a preto e vermelho criada especificamente para esta exposição, num diálogo inaugural com o branco da arquitectura de Siza e o verde da magnólia aí existente.

Já no átrio do MACS, Fachada (2013) é uma peça suspensa do tecto, uma estrutura simultaneamente frágil e despojada que manifesta “o engajamento” nota Cotter da escultura da artista com a arquitectura, e que teve como modelo tanto as referências da arquitectura modernista como as fachadas dos prédios polacos dos anos 1960.

Numa das galerias mais amplas do museu está Escadas (2010), uma escada interior em caracol inicialmente criada para o Museu de Arte Contemporânea de Herzliya, em Israel, e que remete para a arquitectura brutalista dos anos 1970. Em Serralves, a escada é retorcida e comprimida até à adequação ao espaço, oferecendo-se como pura escultura, liberta da sua funcionalidade. “Eu construo as peças como potencialmente originais, depois transformo-as, mas não sinto que as danifique”, disse aos jornalistas Monika Sosnowska sobre esta e as suas outras peças retorcidas, apresentando-se como uma espécie de “coreógrafa” de construção de objectos.

Esta dimensão coreográfica está também manifesta em Mercado (2012-14), um conjunto de oito peças de ferro pintadas de verde, inspiradas num mercado ao ar livre de Varsóvia. “Algumas são aparentemente mais abstractas, suspensas ou colocadas directamente no chão como mato urbano, uma metáfora poética para o frágil estatuto das comunidades de vendedores e clientes de artigos de marca contrafeitos e bens electrónicos pirateados nos anos de transição após a queda do comunismo em 1989”, escreve Suzanne Cotter.

Excepção ao “uso habitual de peças ready-made”, conforme explicou Sosnowska, é Antecâmara, uma ideia inicialmente levada à Bienal de Veneza de 2011 e que agora foi adaptada a Serralves – trata-se da segmentação de uma sala numa multiplicidade de espaços oblíquos com divisórias decoradas com papel de parede comprado numa loja do Porto, mas que transporta também algo do imaginário decorativo da terra natal da artista.

O conjunto de Arquitectonização inclui também uma instalação de sete diferentes peças – materiais de construção, como caixilhos, puxadores, canos, moldes… – sobre uma bancada de madeira, que mostram que a plasticidade não está ausente destas “figuras impossíveis” da arte de Sosnowska; uma obra Sem título (2012), escultura de grande dimensão em aço inox e betão que remete para o imaginário da construção civil e das demolições na Polónia nos anos 1950-80; e, finalmente, a instalação mais minimal e mais contrastante com a arquitectura de Siza, Buraco (2006-08), um buraco literalmente feito no tecto da sala conhecida como a “piscina”, com a ampla janela a inundar de luz natural os poliedros de gesso “caídos” dessa fenda que a escultura impôs à arquitectura.

“Sou uma admiradora da arquitectura de Álvaro Siza, e a minha preocupação inicial [para esta exposição] foi responder a este grande desafio”, disse Sosnowska no final da visita, explicando que vê a sua intervenção na materialidade do museu como um gesto “mais espiritual do que físico”.

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