Câmara acaba com básquete em Monsanto e entrega espaço a privados

Concessão de edifícios deverá permitir a criação de mais de meia centena de quartos para exploração turística. Abertura de bar fecha zona desportiva. Concessionário explora o Mercado de Campo de Ourique.

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Os campos de básquete vão desaparecer para dar lugar a uma tenda para a realização de eventos João Silva

O executivo municipal de Lisboa aprovou em meados de Novembro a concessão de vários espaços e edifícios do Parque Florestal de Monsanto para instalação de equipamentos hoteleiros e de restauração.

A criação de um deles, no Moinho do Penedo, um dos locais com melhores vistas da cidade, implicará a inutilização de três campos de basquetebol que são diariamente procurados por numerosos praticantes. No seu lugar surgirá uma tenda de lona para eventos e o espaço poderá ser vedado pelo concessionário.

A decisão camarária, que contou com o voto contra do PCP e com a abstenção do PSD, aprovou a concessão daqueles espaços à MCO II, a única empresa que participou no concurso público promovido para o efeito. A proposta subscrita pelo vereador Sá Fernandes delega também em António Costa a responsabilidade de aprovar a minuta do contrato e de o assinar em nome do município. 

Nos termos do caderno de encargos do concurso lançado no Verão passado, o concessionário terá o direito de explorar “uma unidade hoteleira de pequena/média dimensão” e “de cariz bucólico” com um total de 46 quartos e nove bungalows no perímetro da Quinta da Pimenteira, onde existe há muitos anos um viveiro de plantas da autarquia, muito perto do viaduto Duarte Pacheco. Este é o principal espaço cuja concessão foi aprovada, mas a MCO II ficará também com o Moinho do Penedo e zona anexas, incluindo os campos de básquete ali instalados há uma dezena de anos, e ainda com a chamada “Casa do Presidente” e duas antigas casas actualmente abandonadas.

Na Casa do Presidente, em que António Costa viveu algum tempo no seu primeiro mandato e que foi objecto de grandes obras há uma dúzia de anos, deverá ser instalada “uma unidade hoteleira de curta duração e/ou para realização de eventos”. As duas antigas casas dos funcionários que chefiavam os serviços do parque serão igualmente destinadas à exploração turística, podendo a área envolvente ser vedada.

Já no chamado Moinho do Penedo, o concessionário deverá montar um estabelecimento de restauração que terá todas as áreas de apoio no interior do edifício projectado por Francisco Keil do Amaral, o arquitecto que deu o nome à alameda vizinha. No exterior haverá uma esplanada com um máximo de 150 metros quadrados, podendo a empresa, conforme se lê no caderno de encargos, “proceder ao reaproveitamento da área pavimentada dos campos polivalentes existentes, adaptando-os para a realização de eventos com a implantação de uma tenda em lona”. 

Nesse local, que será também vedado, está previsto que a tenda possa ser parcialmente desmontada quando o concessionário o entender, ficando apenas a cobertura, de modo a que a zona possa ser utilizada como esplanada coberta. O espaço em questão é actualmente ocupado por três campos de básquete que atraem todos os dias, sobretudo aos fins-de-semana, um grande número de adeptos da modalidade. 

Na Quinta da Pimenteira, o solar do século XVIII, “típico dos arredores de Lisboa”, deverá permitir a criação de dez quartos, além da recepção, bar e outros serviços. Os restantes 36 quartos serão distribuídos por várias construções vizinhas, sendo ainda instalados nove bungalows. O conjunto, todo ele murado, disporá ainda de piscina e restaurante, sendo todas as obras da responsabilidade do concessionário. Este terá de “respeitar ao máximo os elementos arquitectónicos históricos” e cumprir os projectos que venham a ser aprovados pela autarquia.

Além da reabilitação e adaptação das construções, terá de efectuar e pagar um conjunto de obras de beneficiação e conservação da quinta e do espaço que ali continuará a acolher o viveiro. No entanto, esta parte da propriedade ser-lhe-á também entregue, caso a câmara deixe de utilizar o viveiro ou deixe de “assegurar convenientemente” a sua conservação, manutenção e limpeza.

Nos restantes edifícios concessionados, a MCO II terá também de efectuar todas as obras à sua custa, ficando a pagar uma renda mensal por todos eles no valor global de 2600 euros a partir da data de início da exploração, prevista para daqui a três anos. O caderno de encargos fixava um mínimo de 2000. A título de apoio ao investimento, o município só cobrará mil euros mensais nos primeiros três anos de actividade dos futuros equipamentos. A concessão tem um prazo de 25 anos, o qual será renovável por mais 30.

De acordo com o gabinete de Sá Fernandes, os serviços camarários estimam em 3,8 milhões de euros o investimento que o concessionário terá de fazer na reabilitação dos edifícios. A MCO II é uma sociedade anónima gerida por Diogo de Sousa Coutinho, que partilha com a Prego Gourmet o capital da MCO — empresa que explora há um ano o Mercado Municipal de Campo de Ourique e é accionista da recém-criada MCO II. Entre os accionista desta sociedade está igualmente o Fundo de Capital de Risco Revitalizar Sul.

A objectivo da autarquia, lê-se no programa do concurso, consiste em “proceder à reabilitação e à conversão de alguns edifícios, equipamentos e construções actualmente existentes no parque que se encontram em estado de franca degradação e/ou sem utilização, com vista a fomentar o ecoturismo naquele parque, a sua vivência, a proliferação de espaços com utilização frequente e a criação de eixos de segurança”.

Plataforma e PCP condenam decisão
Carlos Moura, vereador do PCP, diz que o seu voto contra a concessão se ficou a dever ao facto de esta solução corresponder à privatização de espaços que devem ser de fruição pública. “Além do mais existe um Plano de Ordenamento e Requalificação do Parque de Monsanto que está em vigor e que não prevê nada daquilo”, salienta o autarca. “Espero que depois desta decisão não esteja também na calha a concessão do Parque da Pedra”, uma zona de desportos radicais que se encontra degradada.

Esta preocupação é também manifestada pelo Clube de Actividades de Ar Livre, uma das várias associações que integram a Plataforma por Monsanto e que foi a primeira, há duas semanas, a emitir reservas sobre a concessão de espaços do parque para utilização privada e a tomar posição contra a instalação de “uma tenda de eventos” nos campos de basquetebol “que estão permanentemente ocupados por uma utilização lúdica em benefício dos lisboetas”.

Artur Lourenço, um dos membros da Plataforma por Monsanto que se reuniram com o vereador Sá Fernandes na semana passada, para expressar a sua condenação destas iniciativas, adiantou ao PÚBLICO que o autarca garantiu que as tabelas de basquetebol já não serão retiradas. “Não estou a ver é como é que lá vão pôr uma tenda para eventos e manter os campos de basquetebol”, referiu Artur Lourenço. “O problema é que aquela vista sobre o Tejo vale muito dinheiro”, comentou.

O PÚBLICO perguntou, segunda-feira, ao gabinete de Sá Fernandes se a câmara já tem um espaço alternativo, para os praticantes de basquetebol mas não obteve resposta.

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