“Alentejo vai ter casas de cante alentejano”

Turismo do Alentejo aguarda programas operacionais do novo Quadro Comunitário de Apoio para apresentar candidatura de projecto que visa criar rotas de casas de cante, à imagem das casas de fado de Lisboa.

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António Ceia da Silva Miguel Manso

António Ceia da Silva, presidente da Entidade de Turismo do Alentejo e Ribatejo, explica como a região alentejana pretende “activar o estatuto de património imaterial da Humanidade” que o cante alentejano conquistou recentemente. Em entrevista ao PÚBLICO, o responsável pelo destino turístico português que mais cresceu em 2014 explica como tenciona transformar a “dimensão cultural” em produto de turismo com valor económico.

Como pode o turismo do Alentejo capitalizar o selo que a UNESCO deu ao cante alentejano?
Temos que fazer a activação desse património imaterial da Humanidade. Não basta que o cante tenha sido classificado, é preciso que isso seja uma efectiva mais-valia para o turismo da região, que represente mais negócio. É necessário que, para além da dimensão cultural, haja uma dimensão turística e económica do selo da UNESCO. Temos um projecto para fazer essa activação, que arranca este ano logo que sejam abertos os programas operacionais de financiamento no âmbito no novo Quadro Comunitário de Apoio [QCA] que vai vigorar até 2020. A Entidade de Turismo do Alentejo e Ribatejo [ETAR] está preparada para apresentar candidatura logo que os programas operacionais o permitam.

Como é que o turista pode “comprar” cante alentejano?
Queremos que o turista chegue ao Alentejo e possa desfrutar do cante, que possa assistir ao cante ao vivo, que haja casas de cante como existem casas de fado, que seja possível o turista poder usufruir da boa gastronomia, mas também assistir a espectáculos de cante. O nosso projecto passa pela criação de rotas de cante. No caso da arte chocalheira – que também candidatámos a património imaterial da Humanidade, e que aguarda decisão no próximo ano –, é a mesma coisa: não basta a classificação, é importante que o turista possa ver como é a arte de fabricar os chocalhos, porque é isso que junta a dimensão turística e económica à dimensão cultural muito forte que o reconhecimento implica. Tudo isto conta para a afirmação do destino turístico.

Este ano já poderá haver uma cobertura de casas de cante na região do Alentejo?
Isso depende dos fundos comunitários, que são decisivos para a implementação da nossa estratégia até 2020. Neste país precisamos que os fundos comunitários estejam a funcionar, e ainda não estão. Nós vamos conseguir, mas não sei em que espaço de tempo. Neste momento, já há uma casa de cante alentejano no Alentejo, a Galeria do Desassossego, em Beja, e queremos que esse exemplo possa ser aplicado noutras zonas do território onde o cante tem uma forte expressão, e onde seja possível criar um produto turístico.

A classificação do cante alentejano pela UNESCO é o principio ou um fim?
É um meio para atingir o que consideramos decisivo no contexto do consumo turístico, do futuro consumidor. É a identidade, aquilo que há no território e que não há em mais parte nenhuma. O turista procura cada vez mais encontros com a identidade. No Alentejo e no Ribatejo, encetámos o caminho de trabalhar a identidade destes territórios, há quatro anos. É uma linha estratégica muito forte, que não tem só a ver com o cante alentejano, mas com um conjunto de dossiers de candidatura à UNESCO, que temos na calha e que iremos apresentar na devida altura, como a Festa do Povo de Campo Maior, os tapetes de Arraiolos, a pesca artesanal em São Torpes, no litoral alentejano, ou a cultura avieira do Ribatejo. Queremos ser o destino, em Portugal, com mais bens classificados já no próximo ano e, em 2020, ter oito bens classificados pela UNESCO. Queremos ser dos primeiros 15 destinos do mundo a avançar com a certificação. É um processo com início agora em Fevereiro, mas que vai durar seis anos, para certificar as empresas de animação, os museus, as adegas ou as igrejas.

Que balanço faz de 2014?
Foi o melhor ano turístico de sempre, a vários níveis. Quer em termos de procura, quer em termos de oferta, foi o melhor ano de sempre para o Alentejo. Foi a região do país que mais cresceu, tanto em dormidas como em proveito de ocupação. Também qualificámos muito a oferta, na continuação de um procedimento de melhoramento das unidades que começou há cinco anos.

A receita do turismo no Alentejo, em 2014, chegou aos 250 milhões de euros. Esse bolo é todo para os grandes grupos, ou já chega aos pequenos investimentos?
Isso são projecções. Não temos números, por exemplo, do turismo no espaço rural. Posso dizer-lhe é que se há uma zona onde a expressão dos grandes grupos não tem essa força global que referiu, é o Alentejo.

As pequenas unidades também tiveram um bom ano?
Muito, como é lógico. Não quer dizer que não haja uma unidade que tenha descido, mas em termos médios os números são muito positivos. E para os grandes grupos também; basta ter ouvido as referências feitas quer pela Sonae, quer pelo grupo Amorim, em relação a Tróia – com um aumento exponencial das dormidas. Significa que houve um crescimento que foi dinâmico em todo o território, de Mértola a Nisa, de Tróia a Odeceixe.

A ideia de que o turismo no Alentejo é mais potencial do que negócio efectivo já não é verdadeira?
Não. Aliás, se fosse essa realidade, a nossa oferta não tinha aumentado nos últimos anos cerca de 10% ao ano, o que significa que, no contexto de cinco anos, aumentámos a oferta em 50%. Costumo dizer que o segredo em turismo é o gato, é superar as expectativas, e isso sucede numa tasquinha, num hotel, no hotel de uma estrela... No Alentejo, existia um hotel de cinco estrelas há três anos, hoje são nove e há novos projectos em andamento. Só em Évora há dois hotéis a inaugurar ainda este Verão, um da cadeia Vila Galé e outro ligado ao azeite. Significa que há muitos investimentos a surgir, que já há negócio.

O Alentejo e o Ribatejo vão estar “em peso” na BTL?
Somos o destino convidado este ano, e vamos ter a maior participação de sempre. O pavilhão, com quase mil metros quadrados, vai contar com a presença de 50 dos 58 municípios do nosso território e cerca de 30 empresas.

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