Papa exige às dioceses que não tentem encobrir casos de pedofilia

"Desejo de evitar o escândalo" não pode sobrepor-se à protecção dos menores, afirma Francisco numa carta enviada às conferências episcopais.

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“As famílias precisam de saber que a Igreja está a fazer todos os esforços para proteger os seus filhos” ALBERTO PIZZOLI/AFP

Na véspera da primeira reunião da Comissão Pontifícia para a Protecção de Menores, o Vaticano divulgou uma carta que o Papa Francisco enviou às conferências episcopais e aos responsáveis das ordens religiosas exigindo-lhes que não tentem encobrir casos de pedofilia entre os seus membros, mesmo que isso os exponha ao escândalo.

“Não há qualquer lugar no ministério da Igreja para aqueles que abusam de menores”, sublinha o Papa, que, por várias vezes desde a sua eleição, prometeu tolerância zero em relação à pedofilia na Igreja. Foi com essa intenção que, em Março do ano passado, criou um grupo de peritos para elaborarem um guia de “boas práticas” e ajudarem as dioceses a prevenir e a lidar com os casos de abusos. É presidida pelo cardeal Sean O’Malley – que assumiu a liderança da diocese de Boston para lidar com o escândalo que, em 2001, desatou o novelo de revelações que mancharam, como nunca antes, a reputação da Igreja – e, dos seus 17 membros, dez são leigos, dois dos quais foram eles próprios vítimas de abusos.

“As famílias precisam de saber que a Igreja está a fazer todos os esforços para proteger os seus filhos”, afirma o Papa, acrescentando que isso implica que “não deve ser dada prioridade a nenhuma outra preocupação, seja de que natureza for, como o desejo de evitar o escândalo”. Desde Boston que se tornou claro que, durante décadas, muitos bispos abafaram casos de pedofilia, silenciando as vítimas e mudando os abusadores de paróquia.

Consciente das críticas que lhe são dirigidas pelas associações de vítimas e também do facto de que muitas dioceses (sobretudo nos países do Sul) tardam em passar à acção, Francisco pede aos bispos que “implementem na íntegra” as recomendações emitidas em 2011, ainda durante o pontificado de Bento XVI, e avaliem “periodicamente” se as regras que então elaboraram estão a ser cumpridas. Quer também que as dioceses criem programas que incluam apoio psicológico e pastoral às vítimas de abusos, instruindo os seus dirigentes a encontrar-se com eles – “tais encontros são oportunidades valiosas para ouvir quem tanto sofreu e pedir-lhes perdão”, afirma o Papa, dizendo que foi um encontro destes, em Julho, que solidificou a sua convicção de que “deve ser feito tudo o que for possível para libertar a Igreja da praga dos abusos sexuais”.

Por último, o Papa pede a todas as dioceses e associações religiosas que cooperem de forma estreita com a Comissão Pontifícia, um meio que espera seja decisivo para “encorajar e ajudar todos os níveis da Igreja a adoptar os passos necessários para garantir a protecção dos menores”. Em declarações à Reuters, a irlandesa Marie Collins, uma das vítimas que integram a comissão, explicou que foram os membros do grupo que pediram ao Papa que dirigisse este apelo aos bispos para contrariar a resistência com que muitas igrejas continuam a olhar para este tema. “As conferências episcopais têm visões diferentes sobre a pedofilia. No meu próprio país, a Irlanda, há uma grande resistência à mudança, à necessidade de adoptar medidas preventivas e de apoio às vítimas”, explicou, afirmando que nada melhor do que uma missiva do Papa para os convencer a colaborar.

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