Jihadistas desafiam estratégia militar de Sissi com ataques no Sinai

Grupo que se filiou no Estado Islâmico atacou alvos militares no norte da península fazendo pelo menos 26 mortos.

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Com um nível de coordenação que não se lhe conhecia até agora, o grupo jihadista egípcio que há dois meses se filiou no autoproclamado Estado Islâmico atacou instalações do Exército e da polícia no Norte do Sinai. Os ataques de quinta-feira à noite, que fizeram pelo menos 26 mortos, mostram os limites da estratégia militar do Cairo para travar os radicais naquela instável mas estratégica península.

Alvo último desta acção, o Presidente Abdel Fatah al-Sissi encurtou a participação na cimeira da União Africana e regressou ao Cairo, no mesmo momento em que o Exército retaliava com novas operações na região do Sinai – duas crianças, uma das quais de apenas seis meses, morreram ao ser apanhadas no fogo cruzado. Os caixões dos soldados mortos foram transportados para o Cairo de avião, mas o Exército admitia não ter ainda um balanço final de vítimas, já que alguns dos edifícios atacados se desmoronaram.

Foi em Al-Arish, capital da província do Sinai do Norte, que os jihadistas se concentraram, disparando rockets contra um quartel da polícia, uma base militar próxima e uma residência onde se alojam oficiais das forças de segurança. Um carro conduzido por um suicida explodiu à entrada da base militar e vários postos de controlo da polícia foram também atacados. Pelo menos 25 membros das forças de segurança morreram e outras 60 pessoas, incluindo 9 civis, ficaram feridos. Algum tempo depois, um oficial foi morto e seis soldados ficaram feridos num ataque contra um posto rodoviário em Rafah, junto à fronteira com a Faixa de Gaza.

O grupo Península do Sinai – nome adoptado pela organização jihadista Ansar Beit al-Maqdis quando em Novembro jurou fidelidade a Abu Bakr al-Baghdadi, o líder do EI – não perdeu tempo a reivindicar “a abrangente e simultânea ofensiva dos soldados do califado”. A operação foi lançada dias depois de 25 pessoas, sobretudo apoiantes da Irmandade Muçulmana, terem sido mortos em manifestações não autorizadas no quarto aniversário da revolução que derrubou Hosni Mubarak, o que bastou para um porta-voz do Exército voltar a acusar o movimento islamista de ter orquestrado os atentados.

Criado logo após a revolução de 2011, o Ansar Beit al-Maqdis conta com centenas de combatentes, na sua maioria pertencentes às tribos beduínas que habitam o Sinai e há décadas mantêm relações conflituosas com o poder militar. Quando, no Verão de 2013, o então general Sissi derrubou Mohamed Morsi, o primeiro Presidente democraticamente eleito do Egipto, e reprimiu a Irmandade, o grupo concentrou os seus ataques nas forças de segurança, matando centenas de soldados e polícias, em acções que se estenderam até ao Cairo – em Setembro de 2013 tentou matar o então ministro do Interior Muhammad Ibrahim.

Sissi, que é visto pela maioria dos egípcios como o homem que afastou o Egipto do caminho islamista, enviou tropas e soldados para o Sinai. Mas se os jihadistas têm mais dificuldade em actuar fora da península, continuam capazes de montar acções de grande visibilidade na região, estratégica tanto em termos geográficos como económicos – faz fronteira com Israel e o Canal do Suez, para o qual o Egipto quer atrair novos investimentos e alberga, na região mais a sul, as principais estâncias turística do país. Provaram-no em Outubro, quando mataram 30 soldados numa base militar, o ataque mais sangrento desde 2005 e que levou o Governo a decretar o estado de emergência na região (que acaba de ser prolongado por mais 3 meses) e a criar uma zona tampão de um quilómetro junto à fronteira com Gaza para combater o tráfico de armas, demolindo centenas de casas. Sissi assinou também um decreto que coloca qualquer manifestante sob a alçada dos tribunais militares – e centenas de civis foram condenados desde então.

Os jihadistas responderam anunciando a sua subordinação a Baghdadi, o primeiro grande sucesso das acções de recrutamento do grupo que no Verão passado proclamou um califado entre a Síria e o Iraque e que reforça os receios de que a desértica região se venha a tornar um santuário para os radicais. Apesar da filiação, os jihadistas egípcios não alteraram ainda o seu modo de actuação, continuando a privilegiar os ataques contra as forças de segurança, embora não se exclua a possibilidade de, à imagem do EI, radicalizarem as suas acções, tomando civis como principal alvo.

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