Vitória do Syriza celebrada pela esquerda, lamentada pela direita

Europa dividiu-se na hora de analisar a vitória do partido da esquerda radical. Reunião do Eurogrupo vai concentrar-se nas eleições gregas.

Foto
Alexis Tsipras, adoptando já um discurso de primeiro-ministro, mostrou vontade em “negociar” com os credores “uma solução justa, viável, durável, que beneficie a todos” ANGELOS TZORTZINIS/AFP

O Governo do Syriza está ainda longe de estar formado e em funções, mas já exerce ondas de choque por toda a Europa. O futuro da Grécia começa a ser delineado já esta segunda-feira numa reunião do Eurogrupo com a agenda focada num só ponto.

Não se pode dizer que a vitória do partido de extrema radical na Grécia tenha apanhado a Europa de surpresa. Antes da reunião dos ministros das finanças, os presidentes do Conselho Europeu, Donald Tusk, da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, e do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem, vão preparar a resposta de Bruxelas à vitória do Syriza. A palavra de ordem é negociar.

Uma fonte diplomática de Bruxelas disse à AFP que o que falta determinar é “sobre o que é que vai incidir [a renegociação]: se sobre os prazos, os montantes, ou os dois. Para os montantes será mais difícil”, acrescentou. “As coisas serão mais suaves do que qualquer um possa esperar”, dizia outra fonte comunitária ao El País.

O próprio Alexis Tsipras, adoptando já um discurso de primeiro-ministro, mostrou vontade em “negociar” com os credores “uma solução justa, viável, durável, que beneficie a todos”. Mas antes de se chegar a esse ponto, será preciso averiguar as necessidades mais urgentes das finanças gregas. “A análise é saber até quando é que a Grécia pode aguentar em termos de tesouraria”, explicou o ministro das Finanças francês, Michel Sapin.

A Europa que aguarda o novo governo grego anti-austeridade começou também a apresentar-se à medida que a vitória do Syriza se ia consolidando na noite de domingo. Se a esquerda celebrava um novo capítulo no desenvolvimento do projecto europeu, a direita alertava para os perigos do desconhecido.

O primeiro-ministro britânico, David Cameron, foi dos poucos líderes europeus a reagir aos resultados, dizendo que “a insegurança económica na Europa vai aumentar”. “É por isso que o Reino Unido deve manter-se fiel ao nosso plano, que dá segurança em casa”, acrescentou, numa clara referência às eleições gerais marcadas para este ano – sobre as quais paira o espectro da popularidade do partido xenófobo UKIP.

A maioria das reacções expressou-se ao nível partidário, com os governos europeus a preferirem aguardar pela declaração oficial dos resultados ou até pela formação do novo executivo grego. Em causa está a possível suavização ideológica que um parceiro de coligação – o mais provável será o partido de centro esquerda To Potami – deverá surtir sobre o Syriza.

Uma posição dura veio do presidente do Partido Popular Europeu, o alemão Manfred Weber, que classificou de “decepcionante” a vitória do Syriza.  Em breve tornar-se-á claro que as promessas feitas pelo Syriza ao povo grego não são nada além de mentiras eleitorais", afirmou o líder da formação europeia à qual pertence a Nova Democracia.

Fora da política, mas com um significado forte, foram as declarações do presidente do Banco Central Alemão, Jens Weidmann, que avisou o Syriza para “não fazer promessas ilusórias” aos gregos. Weidmann lembrou que a Grécia “continua a ser beneficiária de um programa de ajuda” e isso implica que “os compromissos devem ser respeitados”.

O grupo dos liberais europeus preferiu não lamentar a vitória do Syriza e sublinhar o papel importante que o partido To Potami – que se opõe às políticas de austeridade, mas afasta o cenário de abandono da moeda única – pode ter num futuro governo. “Com a sua agenda reformista, oferecem esperança para o futuro da Grécia”, disse o presidente do ALDE, Guy Verhofstadt.

A bancada dos socialistas no Parlamento Europeu recebeu a notícia da vitória de Tsipras com entusiasmo e defendeu que “a renegociação da dívida grega, em particular a extensão do resgate, não deveria ser considerada ainda um tabu”. “O povo grego escolheu claramente romper com a austeridade que lhe foi imposta pelos ditados da troika”, disse ainda o líder socialista Gianni Pittella.

Em Espanha – que também recebe eleições legislativas este ano – viveu-se uma espécie de eleições por procuração. O líder do Podemos, Pablo Iglesias, celebrou “a mudança na Europa” e não deixou de apontar baterias a Berlim. “Finalmente os gregos vão ter um governo grego e não um delegado de [Angela] Merkel”, disse Iglesias, que participou no comício de encerramento do Syriza, ao lado de Tsipras.

Do Partido Popular veio um aviso. O governo grego “não pode fazer outra coisa que não continuar com o programa de reformas”, embora “talvez com um calendário atenuado”, disse o porta-voz das Relações Internacionais, José Maria Beneyto.

Entre os partidos portugueses, os partidos do governo preferiram sublinhar a necessidade de a Grécia se manter no caminho europeu. O líder do PS, António Costa, viu na vitória do Syriza "o esgotamento das políticas de austeridade”. Catarina Martins, coordenador do Bloco de Esquerda, apelidou o partido grego de “partido irmão” e disse que os gregos “deram uma lição à Europa”. O eurodeputado do PCP, João Ferreira, definiu o resultado “como uma vitória contra o grande capital e contra o imperialismo".

 

Sugerir correcção
Ler 5 comentários