Ex-dirigente exonerado quer contar a “verdade” sobre o colapso do Citius

Antigo presidente do instituto que gere a plataforma quer ser ouvido no Parlamento. Diz que, afinal, poucos dias após o início do novo mapa judiciário, avisou que existiam "problemas graves". E acusa a ministra de ter omitido a realidade ao país.

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Equipamento é "moderno" e foi inaugurado há menos de três anos, salienta autarca Fernando Veludo/nFactos

O ex-presidente do instituto que gere o Citius, Rui Pereira, quer ser ouvido no Parlamento sobre a “verdade dos factos” que levaram ao colapso da plataforma e o que esteve na origem na sua exoneração na semana passada, adiantou.

Rui Pereira, que enviou uma carta a comunicar a disponibilidade à comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, assegura ainda que pode dizer o que não disse enquanto o bloqueio do sistema paralisou os tribunais durante 44 dias.

Afinal, assegura o ex-presidente do instituto, a 3 de Setembro (dois dias após o inicio da novo mapa judiciário) avisou o grupo de trabalho para a implementação da reforma judiciária de que “existiam problemas graves” no Citius e que “poderia acontecer o pior”. “Pedi mais tempo, mas só nos deram mais três dias”, refere Rui Pereira que acusa agora a ministra pelo “falhanço” na adaptação do Citius à reforma. O ex-dirigente garante que “o Citius não se adaptava à reforma judicial”.

Enquanto o Citius bloqueava e os tribunais paralisavam, a ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, garantia em entrevistas nas televisões que existiam apenas alguns “constrangimentos”.

Porém, Rui Pereira, que por vezes surgiu ao lado da ministra nessas declarações, conta agora outra versão: “A ministra vive noutro mundo e não contou a realidade do que estava mesmo a suceder aos portugueses. Vive obcecada com a infalibilidade e queria apresentar, a todo o custo, a 1 de Setembro uma nova aurora na justiça”, acusa.

Por isso, Rui Pereira considera que a ministra é “politicamente responsável pelo falhanço informático da reforma judiciária e deve demitir-se”. O homem que admite agora ter andado “três meses a segurar a cabeça da ministra”, explica-se: nessa altura “não podia falar devido à lealdade funcional". "Reportei ao grupo de acompanhamento. Para falar publicamente teria de me demitir, o que seria irresponsável. Significava abandonar o IGFEJ sem o problema estar resolvido”, diz.  

“Não estão esclarecidas, a meu ver, as circunstâncias e determinantes daquele colapso informático, nem devidamente apuradas as responsabilidades técnicas e outras” e “sobretudo não está esclarecido o quadro em que aquela plataforma se encontra em funcionamento, nem salvaguardada a normalidade do seu funcionamento”, refere na carta enviada na segunda-feira à qual o PÚBLICO teve acesso. Nem o Ministério da Justiça nem a Secretaria de Estado comentaram.

Em Dezembro, o IGFEJ emitiu a declaração de cessação dos constrangimentos de acesso e funcionamento do Citius. Rui Pereira alerta agora, afinal, que o “Citius pode crashar a qualquer altura”. O plano de “estabilização” do Citius foi “interrompido”, avisa.

O ex-presidente do instituto quer ainda esclarecer os factos que levaram à sua exoneração. “Quando disse à ministra que discordava da teoria da sabotagem do Citius de que foram acusados os dois ex-técnicos percebi que tinha traçado o meu destino”, justifica.

Rui Pereira e Carlos Brito, então vogal da direcção do IGFEJ, foram exonerados através de um despacho do secretário de Estado da Justiça por o IGFEJ ter “falhado a adaptação da plataforma informática”. O secretário de Estado da Justiça, acompanhado pela ministra, sublinhou na comissão parlamentar, na semana passada, que “houve falhas inquestionáveis na cadeia de comando” no IGFEJ.

O presidente da comissão parlamentar, Fernando Negrão, confirmou ter recebido a carta e salientou que vai dar conhecimento desta aos deputados da comissão. A audição de Rui Pereira, aponta Negrão, terá de ser proposta por um dos deputados e “necessita de aprovação da maioria”.

O PÚBLICO tentou, sem sucesso contactar, deputados dos partidos na comissão. Apenas António Filipe deu conta de estar disponível para propor a audição do ex-presidente do IGFEJ. “Se a maioria não aprovar, isso será bem ilustrativo do que querem proteger”, aponta.

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