Profeta do apocalipse

Um filme singularmente inerte, exangue, alheado.

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Eis, então, Abel Ferrara a mitificar Pier Paolo Pasolini, sob os traços de um glorioso Willem Dafoe, como um profeta do apocalipse, um cronista de uma sociedade em desintegração, polémico e incompreendido.

É um filme de claríssima admiração por Pasolini, filmado literalmente como um deus arrancado demasiado depressa ao convívio dos mortais, mas é um filme singularmente inerte, exangue, alheado. A certa altura, Pasolini/Dafoe diz “olhe à sua volta e veja a tragédia” – a tragédia, no entanto, é que Ferrara não consegue mostrar nada à sua volta, não consegue fazer passar a vertigem e o pensamento que definem Pasolini. Limita-se a ilustrar um caderno de notas para filmes que nunca foram feitos (recriando fragmentos de Petróleo, o romance póstumo, e Porno-Teo-Kolossal, filme que nunca passou do projecto), num registo misto de indiferença e intocabilidade, do qual apenas se salva a entrega quase abnegada de Dafoe. 

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