Administração da RTP rejeita destituição e ameaça ir para tribunal

Alberto da Ponte ataca o Conselho Geral Independente e desafia Governo a pedir-lhe para se demitir. Rejeita razões para a destituição e fala em situação de “ingovernabilidade”.

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Alberto da Ponte garante que este cluster "não custa nada" à RTP Daniel Rocha

A administração da RTP foi esta terça-feira ao Parlamento tentar fazer a sua derradeira prova de vida pública. Lançou acusações ao Conselho Geral Independente, fez desafios ao Governo e deixou um aviso: não reconhece motivos para uma destituição por justa causa e irá reagir por “todos os meios legais” ao seu alcance para defender a honra e a reputação profissional. Ou seja, o braço-de-ferro irá acabar, mais mês menos mês, em tribunal, avisa, entrelinhas, Alberto da Ponte.

Numa intervenção recheada de críticas ao conselho geral, Alberto da Ponte garantiu, em nome de toda a administração: “Em caso algum vamos permitir que a nossa reputação profissional construída ao longo de anos seja posta em causa.” Os três administradores consideram que “não existe qualquer causa para destituição” e acreditam que o Governo “não vai carimbar uma proposta de destituição injustificada”, porque isso seria “demitir-se das suas obrigações” tanto enquanto accionista como enquanto Governo.

Pouco mais tarde, respondendo a uma pergunta da deputada bloquista Cecília Honório sobre uma eventual “choruda indemnização”, Alberto da Ponte afirmou que a dispensa.

“Com este conselho geral e este modelo de governação está de facto criada uma situação de ingovernabilidade. Em apenas dois meses este CGI consegue fazer o pleno nas três áreas-chave deste sector: conseguiu violar a autonomia e independência editorial, conseguiu intrometer-se na gestão e conseguiu ser duramente repreendido pela entidade reguladora”, apontou o presidente, admitindo que a sua equipa não tem condições para ali se manter.

“Caso o Governo queira que este conselho de administração se demita basta dizê-lo”, desafiou, já no final, Alberto da Ponte, que deixou no ar que “haverá uma agenda pré-determinada”. Pouco antes fizera o mesmo: “Não posso afirmar que esta tutela ou o Governo se queira ver livre deste conselho de administração, mas que parece, parece.” Ou: “Estamos convencidos [que a recusa do plano] é como a pescada, antes de o ser já o era.” À saída, aos jornalistas, reforçou: “Há duas hipóteses: ou nos demitimos ou somos demitidos. Para sermos demitidos tem que haver fundamento - e não há.”

O presidente do CGI, ouvido a seguir na comissão, rejeitou a existência de pressões e condicionamentos para a destituição da gestão da RTP e considerou “inaceitáveis” as declarações do ministro Luís Marques Guedes sobre a Liga dos Campeões, quando se mostrou contra a compra e disse esperar que o CGI “actuasse”.

“Sem que tenhamos cometido qualquer ilícito, com a relevância da RTP a crescer e resultados sustentadamente positivos, com os trabalhadores focados no sucesso da empresa, apesar das habituais divergências existentes, com a RTP a não mais depender da indemnização compensatória e a prestar o serviço público que lhe compete – tudo factos incontestados e incontestáveis – estamos aqui perante os senhores deputados a prestar contas e a defender a nossa honra de acusações de que o projecto estratégico não está bem feito”, descreveu Alberto da Ponte.

O caso “mais parece pura pirraça académica, pois seguramente não se percebe onde está o interesse da RTP. É certamente caso inédito e, para nós, inesperado”, disse ainda Alberto da Ponte.

António Feijó rebateu os argumentos de Alberto da Ponte afirmando que as duas versões do plano estratégico não tinham qualidade. “Irremediavelmente medíocre”, foi como Feijó classificou o segundo plano, depois de dizer que podiam logo chumbar o primeiro. O presidente da RTP argumentou que o plano é o PDR – Plano de Desenvolvimento e Redimensionamento, aprovado pelo anterior ministro e que um membro do CGI lhe disse que era isso que o órgão queria. O documento, disse por seu turno Feijó, sofre de uma “generalidade e vacuidade de especificação e de indicadores” e tem uma qualidade geral “inaceitável”. Ponte diz que vai rebater a “debilidade, falsidade e ligeireza das argumentações que o Conselho Geral impôs para recusar” o projecto.

Não tendo, como é exigido, um plano estratégico aprovado, a equipa de Alberto da Ponte deixou de “preencher os requisitos” que a lei impõe, justificou António Feijó, considerando que não está em causa a “honorabilidade” dos administradores. O presidente do CGI respondia assim às críticas de Alberto da Ponte, que se disse atacado na sua honra.

“O conselho de administração não tem qualquer apoio instrumental do accionista e não tinha sequer um orçamento e um plano de actividades”, realçou o presidente do conselho geral aos deputados. Haveria de somar o facto de a administração não ter a confiança do CGI nem do Governo, que já disse que não assina o contrato de concessão com esta administração mas apenas com um representante ou uma nova equipa.

O PAIO - Plano de Actividades, Investimento e Orçamento da RTP para 2015, que foi ontem entregue no Parlamento e ao conselho geral nem sequer inclui os pareceres do conselho fiscal, do conselho de opinião e não foi comunicado à tutela ainda, como é de lei, argumentou Feijó, classificando-o como um “plano póstumo”.

Sobre a questão da Liga dos Campeões, o presidente da RTP afirmou que o negócio de compra dos direitos decorre de uma obrigação da lei, voltou a acusar o conselho geral de intromissão em questões editoriais e defendeu que a aquisição “não é apenas sustentável: é rentável”.

Segundo Alberto da Ponte, o investimento é de cinco milhões de euros por cada uma das três épocas, mas terá um retorno de 5,8 milhões anuais. Além dos 2,5 milhões que espera facturar em publicidade, juntam-se 3,3 milhões de euros de “custos de oportunidade” que é o custo dos programas que é possível não emitir para poder colocar no seu lugar o futebol agora comprado. Ou seja, a operação terá, nas palavras do presidente, lucro de 800 mil euros/ano. Mas António Feijó veio dizer que os valores comunicados ao CGI são diferentes. “Esta discrepância faz-nos pensar sobre a fiabilidade das decisões” da administração, deixando no ar dúvidas sobre o real impacto financeiro no negócio.

 

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