Polícia confirma a morte de sequestrador de Sydney e dois reféns

Man Haron Monis, um refugiado de origem iraniana a contas com a justiça manteve 17 pessoas reféns. Polícia avançou para o café depois de se ouvirem explosões.

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Paramédicos retiraram reféns feridos do café Peter Parks/AFP
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O sequestrador, Man Haron Monis REUTERS
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Todo o quarteirão foi evacuado e a polícia colocou forças especiais em vários pontos Jason Reed/Reuters
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Imagem captada por uma televisão local de um homem no interior do café identificado como sendo o sequestrador Channel Seven/AFP
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Reféns foram vistos a mostrar uma bandeira com inscrições islâmicas na vitrina do café Channel Seven/AFP
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Uma das duas funcionárias que conseguiram sair do café Jason Reed/Reuters
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Ambas mostravam sinais de pânico ao deixarem o local Jason Reed/Reuters
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Toda a zona em redor do café foi evacuada Saeed Khan/AFP
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E no local foi montado um forte aparato policial David Gray/Reuters

As autoridades australianas acabam de confirmar a morte de Man Haron Monis, o autor de um sequestro que durou mais de 16 horas num café do centro da cidade de Sydney, Além do sequestrador, a polícia confirmou também a morte de dois dos seus reféns, um homem de 34 anos e uma mulher de 38 anos, bem como de quatro feridos graves.

Nas primeiras declarações oficiais desde o fim do cerco, o comissário da polícia de Novas Gales do Sul, Andrew Scipione, disse que o sequestrador manteve 17 reféns. Confirmou ainda informações avançadas pelos media australianos, segundo as quais a ofensiva policial ocorreu em resposta a disparos no interior do café.

Depois de um cerco que se prolongou desde a manhã até à madrugada, a polícia irrompeu pelo café LIndt Chocolate. Equipas das forças especiais e também de paramédicos avançaram para o local depois de se ouvirem três explosões que poderiam ser tiros no interior do edifício. Ao mesmo tempo, sete reféns escaparam a correr por uma porta lateral do café, situado em Martin Place, no centro da cidade.

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Nesse momento, ouviu-se uma barragem de fogo. Além de granadas de fumo, a polícia confirmou a utilização de balas verdadeiras numa intensa troca de tiros no interior. Segundo o canal australiano News 7, nessa altura ainda estariam nove reféns dentro do café.

Informações avançadas por essa estação dão conta de ferimentos em cinco reféns, que foram retirados do café em maca. Num dos casos foi preciso realizar manobras cardíacas de ressuscitação, acrescenta a estação. Todos os reféns estão a ser assistidos em vários hospitais de Sydney e nenhum corre risco de vida.

Na operação estiveram envolvidos comandos do Royal Australian Regiment, altamente especializados na resposta em cenários de crise. Uma brigada de bombas e armadilhas inspeccionou o local, e não encontrou explosivos ou qualquer dispositivo suspeito.

O caso foi classificado como um "incidente crítico" pelas autoridades e um inquérito foi imediatamente aberto. "Apuraremos exactamente o que aconteceu do lado de fora e do lado de dentro do café. Agora não é o momento de especular ou desenvolver teorias. Assim que estivermos na posse de todos os factos, forneceremos todas as informações", prometeu o comissário.

O incidente começou eram 9h45 (22h45 de domingo em Portugal), na altura em que muitas pessoas chegavam para trabalhar em Martin Place, um quarteirão no centro da cidade onde se situam dezenas de edifícios financeiros e administrativos. Testemunhas contam ter visto o homem, encapuzado e com o que aparentava ser uma arma, a entrar no Lindt Chocolate Cafe, onde por essa altura estariam cerca de 30 clientes e dez empregados.

Toda a zona foi evacuada e vedada pela polícia, enquanto os edifícios mais próximos receberam ordens para encerrarem portas. Quase seis horas depois do início do sequestro, três homens, um dos quais seria funcionário do café, foram vistos a sair a correr do edifício, sendo seguidos algum tempo mais tarde por duas mulheres, ambas com aventais que as identificavam como funcionárias do Lindt. A polícia do estado de Nova Gales do Sul não revelou se os cinco reféns fugiram ou saíram no âmbito de negociações.

Ao início da noite, o comandante da polícia estadual garantiu que as negociações continuam e que o único objectivo das autoridades “é resgatar as pessoas que continuam presas dentro do edifício”. No entanto, o chefe do governo de Novas Gales do Sul, Mike Baird, avisou que as pessoas que trabalham na área de Martin Place devem preparar-se para “trabalhar a partir de casa” na terça-feira. Quando a noite caiu, uma das funcionárias desligou as luzes do café às ordens do sequestrador, mas no interior continuavam a ser visíveis movimentações e o aparato policial manteve-se inalterado.

A contas com a justiça
A certa altura durante o dia, alguns reféns foram vistos junto às janelas do café a segurar uma bandeira negra com inscrições em árabe, o que levantou a suspeita de o sequestrador ter motivações ligadas a movimentos jihadistas. O estandarte, no qual está inscrita a shahadah (a profissão de fé feita pelos crentes muçulmanos), tem sido adoptado por movimentos islamistas e é idêntica à usada pelo Estado Islâmico (EI), grupo extremista que se apoderou de uma faixa de território na Síria e no Iraque, ou a Al Qaeda.

No entanto, as últimas informações sugerem que por trás do ataque poderão não estar motivações políticas.

A imprensa australiana identificou o atacante como sendo Man Haron Monis, um homem de 49 anos e origem iraniana que se identifica como xeque e “activista pela paz” e que está há vários anos na mira da justiça.. Segundo o jornal Sydney Morning Herald, os problemas de Monis com a justiça do seu país de acolhimento começaram depois de ter sido acusado pelo envio de cartas consideradas ofensivas às famílias de soldados australianos mortos no estrangeiro. Depois de ter esgotado todos os recursos para evitar que o caso fosse levado a tribunal, foi condenado em Agosto do ano passado a 300 horas de trabalho comunitário.

Meses depois foi acusado de cumplicidade na morte da antiga mulher, esfaqueada e queimada no apartamento em que vivia, em Sydney, num crime atribuído à sua actual companheira. À espera de julgamento, foi acusado já em Abril de assédio e ofensas sexuais contra uma mulher a quem se apresentou como “curandeiro espiritual”.

Segundo a polícia, Monis (que também se identificava pelos nomes Mohammad Hassan Manteghi e Manteghi Boroujerdi) colocava anúncios nos jornais em que se apresentava como perito em astrologia, meditação e magia negra. A notícia da sua detenção levou outras mulheres a apresentar queixa – em Outubro eram já 40 – contra ele por conduta imprópria. Na sua página no Facebook, o autoproclamado xeque dizia que as acusações faziam parte de uma perseguição policial contra ele, comparando o seu caso ao do fundador da WikiLeaks, Julian Assange.

De acordo com o The Guardian, Man Haron Monis tinha anunciado a sua conversão ao ramo sunita na semana passada – uma decisão que pode ter sido motivada pela intervenção de líderes xiitas australianos, que apresentaram uma denúncia às autoridades, pedindo que estas investigassem as suas alegações de ser um ayatollah.

Condenações e manifestações de solidariedade
Três estações de rádio e televisão de Sydney revelaram terem sido contactadas por reféns, a mando do sequestrador, mas a polícia pediu depois à comunicação social para não difundir as alegadas exigências feitas nas conversas – as razões e reivindicações de Monis ainda não são conhecidas.

Um repórter de uma cadeia de televisão local, cuja redacção se situa frente ao café, disse à BBC ter conseguido contar 15 reféns, “uma mistura de mulheres, homens, novos e velhos” dentro do café, adiantando que o sequestrador os obrigava a manterem-se de pé frente às janelas.

“É profundamente chocante que pessoas inocentes sejam feitas reféns por uma pessoa armada que diz ter motivações políticas”, afirmou o primeiro-ministro, Tony Abbott, numa segunda comunicação ao país, depois de num primeiro discurso ter pedido aos australianos que mantivessem “os seus afazeres habituais”. “A Austrália é uma sociedade pacífica, aberta e generosa. Nada deve mudar”, afirmou o primeiro-ministro conservador.

Um núcleo de 40 grupos representando a comunidade muçulmana de Nova Gales do Sul emitiu entretanto um comunicado a manifestar "choque e horror pelas cenas sem precedentes" a que a Austrália e a população de Sydney assistiram nesta segunda-feira. "Rejeitamos qualquer tentativa para atentar contra a vida de seres humanos inocentes ou instigar o medo nos seus corações", lê-se no comunicado conjunto, divulgado na mesma altura em que nas redes sociais foi criado um movimento de pessoas prestando-se a acompanhar muçulmanos que se sintam ameaçados nos transportes públicos.

A AFP adianta que o sequestro aconteceu pouco depois de a polícia de Sydney, a maior cidade da Austrália, ter revelado que tinha detido um homem de 25 anos suspeito de envolvimento na preparação de atentados. As autoridades dizem não acreditar que os dois incidentes estejam ligados, mas já durante esta segunda-feira o emblemático edifício da ópera de Sydney foi evacuado, alegadamente após a descoberta de um embrulho suspeito.

A Austrália foi um dos primeiros países a juntar-se à coligação internacional contra o EI liderada pelos EUA e diz ter informações de que mais de 70 jihadistas nacionais se juntaram às fileiras dos radicais, 20 dos quais terão sido mortos. Tal como outros países, teme que jovens radicalizados ou que tenham combatido na Síria ou no Iraque cometam ataques no país. Em Setembro deteve vários suspeitos de planearem execuções em alegada vingança pelo envolvimento da Austrália no conflito e no mês seguinte endureceu as suas leis antiterroristas para, entre outras medidas, proibir a viagem de cidadãos nacionais sem justificação aparente para países com elevada actividade jihadista.

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