Justiça considera rituais académicos irrelevantes no caso do Meco

Não é certo que processo judicial conheça um desenlace já em 2015. Registos telefónicos da Vodafone deverão ser destruídos esta segunda-feira.

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Homenagem às vítimas da tragédia do Meco Enric Vives-Rubio

Quando, hoje, as famílias das vítimas do Meco celebrarem mais uma cerimónia na praia, para assinalar a passagem de um ano sobre a tragédia, terão passado dez meses sobre a queixa que apresentaram contra o dux da Universidade Lusófona, João Gouveia, por exposição ao abandono e omissão de auxílio. E poderá passar outro tanto, ou até muito mais, até que a justiça tome uma decisão definitiva sobre o que se passou na fatídica noite em que seis dos sete jovens foram arrastados para a morte por uma onda. Não é certo que o caso do Meco tenha um desenlace já em 2015.

A justiça não tem estado do lado de todos os que pensam que João Gouveia tem culpas no que sucedeu e devia sentar-se no banco dos réus. O despacho de arquivamento do caso assinado pelo procurador da República Moreira da Silva no final de Julho passado é claro: não surgiram durante as investigações das autoridades, que duraram meses, quaisquer indícios da ocorrência de crime, apesar de terem sido ouvidas cerca de uma centena de pessoas e de João Gouveia ter sido interrogado três vezes. O facto de o acidente ter ocorrido num contexto de praxe não foi considerado relevante até ao momento pelos magistrados encarregues do caso.

“Não é de esperar que seis pessoas esclarecidas se deixassem manietar por um acto paranóico de um qualquer dux”, pode ler-se nesse despacho, que recorre ao teor descomprometido e bem-disposto das mensagens de telemóvel trocadas pelos jovens para “desmistificar o ambiente secreto, de medo e de veneração” que alegadamente existia naquele fim-de-semana passado no Meco.

Famílias não se conformam
As famílias não se conformaram com o arquivamento e, em Setembro, forçaram a reabertura do caso, mas o entendimento do juiz de instrução que ficou com o processo em mãos parece semelhante ao do procurador. “Nenhuma diligência resulta dos autos que contrarie o entendimento do Ministério Público e que coloque em causa a honestidade intelectual” da decisão de arquivar o caso, refere o juiz num despacho proferido em Outubro.

O magistrado faz mesmo questão de escrever que neste processo “não está em causa qualquer apreciação judicial da natureza das praxes, e menos ainda de qualquer comissão de praxes”. O advogado das famílias, Vítor Parente Ribeiro, levantou um incidente de recusa do juiz, alegando proximidade entre este e o procurador que o antecedeu no caso.

A sua estratégia passa por invalidar a fase de inquérito, que terminou no final de Julho, por forma a obrigar a repetir as diligências judiciais destinadas à obtenção de provas. Mas mesmo que o consiga — o que não se afigura fácil, do ponto de vista legal —, irá deparar com alguns obstáculos. As capas dos estudantes e outros pertences relacionados com o processo já foram manuseados por pessoas estranhas ao processo, nomeadamente jornalistas, que tiveram autorização para tal por parte do Tribunal de Almada.

Por outro lado, segundo Vítor Parente Ribeiro, está agendada para esta segunda-feira a destruição, pela Vodafone, dos registos que permitiriam saber onde se encontravam os familiares de João Gouveia à hora do acidente. Trata-se de uma destruição que as operadoras de telemóveis têm obrigação legal de fazer relativamente a todos os clientes depois de passado determinado período de tempo, a não ser que um tribunal lhes dê ordem em contrário.

“O juiz podia impedir isso, mas não acha relevante”, critica o advogado, que não põe de parte o recurso para o Tribunal Constitucional ou mesmo para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, caso as instâncias nacionais não dêem razão aos seus clientes.

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