“Com esta exposição, a palavra cavaquinho passa a estar na cabeça das pessoas”

70 artistas plásticos deram novo rosto a 70 cavaquinhos. Exposição, inaugurada hoje no Mosteiro dos Jerónimos, abre amanhã ao público.

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Um dos cavaquinhos em exposição, com intervenção de Renatta Pascoal DR

A ideia nasceu de uma colagem. Júlio Pereira, músico e presidente da Associação Cultural e Museu Cavaquinho, encantou-se com uma imagem e fez uma experiência com computador: “Um dia vi uma fotografia de uma instalação do Pedro Cabrita Reis, achei graça e coloquei no tampo de um cavaquinho. Enviei-lhe um e-mail com a montagem e pedi-lhe que me dissesse se gostava. E se queria apadrinhar a associação. Ele disse logo: ‘boa, força, muito giro’. A seguir fui ter com o Julião Sarmento e o Júlio Pomar [tinha feito montagens idênticas com obras deles] e estes foram os três primeiros artistas plásticos a apoiar a associação.”

Depois, com a mesma técnica, montagem por computador, foi ter com mais alguns artistas, uns mais e outros menos conhecidos: Eurico Gonçalves, José de Guimarães, Isabel Sabino, Carlos Delgado, Elisabete Ferreira, João Manuel Oliveira. Todos receberam a ideia de braços abertos. “Mas não era ainda a coisa física, usando o próprio cavaquinho como suporte. A partir daí é que tivemos a ideia de fazer este convite”. Responderam “sim” muitos artistas plásticos e é o resultado do seu trabalho que agora surge exposto sob o título “70 cavaquinhos, 70 artistas”. Foi um número possível, até para não tornar a exposição difícil de transportar. Mas Júlio Pereira diz que, posto o projecto em marcha, ainda continua a receber novas mensagens de artistas plásticos a quererem participar.

“Qual é o objectivo disto? A associação tem trabalhado nos bastidores desde o princípio e tem uma dificuldade: a ausência de fontes de financiamento. Esta iniciativa é um bom pretexto para dar visibilidade aos nossos objectivos. Com esta exposição mediática, e a nível nacional, a palavra cavaquinho passa a estar na cabeça das pessoas.” Porque há, no trabalho da associação, “muitas coisas” para fazer. “Há o trabalho musicológico antropológico, histórico, mas também pode haver outras coisas, como esta, que criam visibilidade ao andarem pelo país.”

Apresentada ao público em Janeiro deste ano, a Associação Cultural e Museu Cavaquinho está já a fazer, em parceria com a Direcção-Geral do Património Cultural, o levantamento sistemático (documental, fotográfico) dos construtores tradicionais de cavaquinhos, das suas práticas e da sua sabedoria. Quanto à presente exposição, só possível com a oferta de cavaquinhos por parte de várias fábricas e oficinas, ficará no Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, de 28 de Novembro até 25 de Janeiro (a inauguração oficial é esta quinta-feira, embora só abra ao público amanhã). Depois, como foram estabelecidos protocolos com dez câmaras de municípios “que tivessem a ver com a prática do cavaquinho”, circulará pelo país. De Janeiro a Março estará em Braga e depois seguirá para o Porto. “Guimarães e Viana do Castelo também já calendarizaram.”

A par da exposição, itinerante, foi editado pela associação um álbum com a reprodução dos 70 cavaquinhos, em cujo prefácio Júlio Pereira escreveu: “Esperamos com esta acontecimento, e junto das populações, contribuir para a divulgação deste singelo cordofone que o tempo e a história transformaram num radioso instrumento andarilho.” Júlio Pomar inscreveu no livro um verso original seu, com o cavaquinho por mote; Pedro Cabrita Reis deixou esta frase singela: “Nunca chegarás a ser alguém se não te dedicares a enriquecer a Terra”; e Julião Sarmento preferiu deixar a “voz” à força das imagens: “…e portanto fico calado, tal como manda o provérbio, porque o que eu teria eventualmente para dizer não é, com certeza absoluta, mais importante do que o silêncio… ou o som de um cavaquinho.” Tocado ou pintado, como se vê.

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