No rescaldo do LuxLeaks, o G20 promete ser “muito agressivo” contra a evasão fiscal

ONG avisam que as medidas não se podem limitar ao G20, sob risco de proliferarem paraísos fiscais nos países em desenvolvimento.

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David Cameron quer reforçar a troca de informação entre as autoridades fiscais Lukas Coch/AFP

Os líderes das 20 maiores economias do mundo há muito têm as questões fiscais na agenda: contrariar a “erosão da base tributária”, lutar pela “transparência e troca de informações fiscais”, promover o “desenvolvimento” económico pela via fiscal. São expressões caras aos simpósios e às discussões do G20. Mas no rescaldo do escândalo LuxLeaks, o grupo promete ser “muito agressivo” na reunião deste fim-de-semana em Brisbane, na Austrália.

O ministro australiano das Finanças, Joe Hockey, está optimista e diz estar a trabalhar para haver resultados tangíveis, sem, no entanto, se comprometer a programar medidas concretas. “Estou convencido de que vamos ter uma abordagem muito agressiva”, afirmou Hockey, referindo-se à desarmonização fiscal entre países que permite às empresas adoptar estratégias e escolher regimes especiais para pagar menos impostos.

Hockey conhece a dificuldade em reunir vontades quando estão em causa questões sensíveis como a transparência fiscal das empresas e dos Estados, e a luta contra a evasão. À rádio ABC, que a AFP cita, o ministro das Finanças da Austrália admitiu que os Estados Unidos “estavam muito prudentes no início, mas eles próprios vêem que ficam a perder dinheiro face aos lucros das grandes multinacionais [pelo facto de não haver harmonização fiscal]”.

Jean-Claude Juncker, ex-primeiro-ministro luxemburguês e presidente da Comissão Europeia, vai a Brisbane representar a União Europeia enquanto bloco económico do G20. Juncker quebrou o silêncio esta semana sobre o LuxLeaks – a revelação de que mais de 340 empresas multinacionais beneficiaram no Luxemburgo de acordos secretos para pagar menos impostos do que nos países de origem, o que lhe provocou embaraços em início de mandato na Comissão Europeia.

Fragilizado com o caso, Juncker promete agora encabeçar uma campanha europeia pela harmonização e transparência dos regimes fiscais. É com essa imagem que se apresenta no G20, onde poderá ter de lidar com uma posição de força de David Cameron. O primeiro-ministro britânico, que em confronto directo com Juncker chegou a tentar travar a sua nomeação como novo presidente da Comissão, não deverá prescindir que seja discutida a troca de informação fiscal entre as autoridades nacionais.

Para além do LuxLeaks, há outro caso mediático com contornos ainda por esclarecer. A Comissão Europeia está a avaliar um acordo fiscal entre a Holanda e a Starbucks que terá permitido à cadeia de cafés pagar menos impostos de subsidiárias noutros países. Através de um relatório preliminar, sabe-se para já que o executivo comunitário considera que os acordos de preços constituem ajudas de Estado, deconhecendo-se os remédios que possam vir a ser impostos.

ONG atentas ao G20
“Se recuarmos cinco anos, o segredo bancário era a regra em muitos países”, e, entretanto, foram dados “passos” na troca automática de informação bancária para efeitos fiscais, sublinhou Pascal Saint-Amans, director do centro para a política e administração fiscal da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).

Com a discussão centrada no G20, as organizações não-governamentais contra a fraude vêm alertar para o risco de decisões fechadas neste grupo de países poder abrir novas frentes de concorrência desleal fora das maiores economias do mundo. A ONE France avisou: “A solução não se pode limitar às fronteiras do G20, sob pena de deixar demasiado espaço para se criarem novos paraísos fiscais, nomeadamente nos países em desenvolvimento”.

Saint-Amans, que está no G20 a acompanhar os trabalhos, defendeu que é preciso uma clarificação das regras e teorizou sobre as vantagens do fim da existência de paraísos fiscais, para aumentar a concorrência em termos fiscais. “Se deixar de haver taxas zero, os países vão tornar-se mais competitivos, com taxas mais atractivas”, afirmou Saint-Amans ao grupo de media australiano Fairfax.

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