Governo tenta “descongelar” negociações na primeira batalha de Juncker

Presidente da Comissão Europeia tenta manter socialistas a bordo do tratado comercial com os EUA (TTIP). Bruno Maçães contesta ideia de "recuo" na posição portuguesa.

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Juncker acabou de tomar posse AFP

No dia 21, um grupo de 14 governantes europeus (metade dos países da União), escreveu uma carta à comissária responsável pelas negociações do TTIP, Cecilia Malmström, lembrando-a da existência de "um mandato claro" para incluir a cláusula ISDS nas negociações. A carta foi interpretada como uma defesa, por parte destes países, da inclusão dos tribunais arbitrais privados no texto do acordo. A imprensa internacional fez eco disso mesmo, como demonstra esta passagem do texto do Financial Times onde a carta foi, pela primeira vez, revelada: “Os ministros argumentam na carta que o mandato dado à Comissão era claríssimo quanto à necessidade de incluir o ISDS no pacto UE-EUA".

O secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Bruno Maçães, introduziu uma nuance, na entrevista que deu ao PÚBLICO: "A carta diz, e vou citar a frase exacta: O mandato do Conselho é claro na sua inclusão da ISDS nas negociações TTIP. Não no texto, mas nas negociações. Isto é importante porquê? Porque as negociações têm de incluir o maior número possível de tópicos para que tenham maior possibilidade de sucesso. Se o ISDS estará no texto final, ou não, não sabemos."

O texto do PÚBLICO que antecedia a entrevista dava conta desse "recuo". O Governo português, afinal, não considera obrigatória a cláusula ISDS no acordo final, apenas nas negociações. Mas Bruno Maçães contesta que haja aqui qualquer recuo. Para o governante, retomar as negociações, com a cláusula ISDS, é o objectivo. Embora defenda o mecanismo, admite a possibilidade de haver um acordo final sem ele.

Esta diferença, que passou despercebida, entre "negociações" e "acordo final" não significa que vários Estados europeus tenham desistido de incluir o mecanismo arbitral no acordo. Pelo contrário. Uma vez que as negociações ente a Europa e os Estados Unidos se encontram "congeladas", neste ponto, o esforço diplomático dos defensores do ISDS concentra-se, agora, na reabertura do processo.

A Alemanha é a principal opositora - isto, apesar de ser um dos Estados com mais acordos ISDS activos. O Presidente da Comissão, o luxemburguês Jean-Claude Juncker, tem tentado uma abordagem cautelosa. Nas suas intervenções optou por negar qualquer hipótese de haver, no acordo, uma cláusula ISDS demasiado aberta. Nesse sentido, afirmou: "Não aceitarei que a jurisdição dos tribunais nos estados-Membros da UE seja limitada por regimes especiais para resolver disputas de investidores”.

Juncker acabou de tomar posse, no dia 1 de Novembro. Tem uma comissão nova e um novo equilíbrio político no Parlamento Europeu. Por isso, enquanto esta "batalha" sobre o TTIP rebentava, o novo Presidente da Comissão não deixou que a fractura política alastrasse. O grupo dos socialistas europeus (S&D) é essencial para a aprovação final do TTIP. Só com os votos dos "já convencidos", conservadores e liberais, o TTIP pode ter a mesma sorte que os anteriores acordos frustrados com os EUA - Swift e Acta. Por isso, Juncker, que é um conservador do PPE, deixou nas mãos do seu vice, o social-democrata holandês Frans Timmermans, a última palavra sobre a inclusão do mecanismo ISDS no TTIP: "Não haverá qualquer cláusula sobre disputas entre Estados e investidores se o Frans não concordar, também", disse Juncker, e a frase está em letra carregada no site da Comissão.

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