Investidores e ex-quadros da Valadares propõem-se injectar 1,2 milhões para relançar a marca

Objectivo é colocar a empresa que esteve prestes a falir no “campeonato dos produtos de qualidade”.

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Fábrica de Vila Nova de Gaia Adelaide Carneiro

Os fornos da Cerâmica de Valadares vão voltar a ser ligados e a produção deverá arrancar a partir de Janeiro, garantem os novos investidores na cerâmica, que se propõem injectar 1,2 milhões de euros, nos próximos cinco anos, para salvar a marca quase centenária.

Os novos investidores, que apareceram quando a empresa já se encontrava em pleno processo de liquidação, criam uma nova esperança para a manutenção da fábrica que ruiu devido às elevadas dívidas acumuladas. A queda da cerâmica de Valadares, que chegou a empregar mais de 300 trabalhadores, aconteceu numa altura em que a empresa estava a ter êxito nos mercados externos, com uma oferta de produtos de qualidade.

A queda acelerada da Valadares ajuda a explicar o  valioso stock de louça sanitária existente, avaliado em oito milhões de euros “a custo industrial de produção” e em quase seis milhões “numa óptica de continuidade” da empresa, segundo os números que constam do processo de insolvência da empresa, disponível no tribunal do comércio de Vila Nova de Gaia.

Em declarações ao PÚBLICO, Henrique Barros, ex-quadro da cerâmica e vice-presidente da ARCH, a empresa que se apresenta a relançar a marca, prefere falar num valor de stock entre três e quatro milhões de euros.

O contrato estabelecido entre os investidores e credores da empresa, que reclamaram 96 milhões de euros de créditos, inclui a venda da produção existente e a entrega de 30% do valor gerado à massa falida. Pressupõe ainda o aluguer de parte das instalações industriais, uma pequena parte dos cerca de 18 campos de futebol de área, por um período de cinco anos, e a opção de compra da marca, pelo valor de 500 mil euros.

A venda do stock será particularmente direccionada para o mercado ibérico, contando para isso com o apoio de um ex-quadro da Valadares Espanha, que entretanto tinha actividade comercial no ramo e que é um dos sócios-fundadores da ARCH.

O sócio espanhol, José António Garcia Caraballo, passa a desenvolver actividade de gestor operacional a partir de Vila Nova de Gaia, assumindo a coordenação de promoção da marca no mercado externo.

A estratégia comercial começa exactamente no mercado ibérico, mas depois vai estender-se ao resto da Europa, ao Médio Oriente, Ásia e América do Sul, explicou Henrique Barros. A abordagem do mercado será feita, numa primeira fase, através da angariação de parceiros locais, que se identifiquem com a estratégia da empresa e que, numa primeira fase, serão responsáveis por 70 a 80% das vendas.

“Não estamos muito inclinados para uma perspectiva de distribuidores, mas antes para empresas ou entidades que façam, com o nosso apoio, a divulgação dos nossos produtos, ou eventualmente com empresas co-participadas que façam o fomento da marca”, adiantou o gestor.

Numa segunda fase, a empresa pretende apostar noutro tipo de agentes, que designa de promotores técnicos, que promovam contactos com “prescritores do negócio”, como acontece em Portugal com os arquitectos, que assumem particular relevância nos equipamentos turísticos. O objectivo, assegura o gestor, “é oferecer produtos personalizados, que respondam às exigências técnicas ou de design dos clientes”.

O vice-presidente da ARCH sustenta que esta ambição é possível porque, “do ponto de vista da sua génese, a cerâmica de Valadares tem capacidade para desenvolver produtos específicos, que exigem uma concepção de raiz”.

“No médio e longo prazo, serão os  segundo agentes que irão permitir que o produto migre para aquilo que pretendemos - apostas numa oferta de produtos de gama média/alta, em que a prestação de serviço é bastante mais completa que a mera entrega de produto já acabado”, acrescentou.

E esta capacidade “não é vulgar na indústria sanitária nacional e estrangeira, à excepção de algumas empresas italianas, que têm uma dimensão média daquilo que vai ser a nova Valadares, em que o design e a concepção são intrínsecos da actividade, não é só no sanitário, mas em toda a indústria italiana”, assegurou.

Com uma dimensão que não deverá ultrapassar os 130 trabalhadores, a contratar progressivamente, a Valadares herda uma capacidade de produção integral das peças, desde a concepção do produto ao fabrico das máquinas que que os vão produzir.

E é por causa do know-how acumulado que os novos investidores pretendem recrutar perto de uma centena de ex-trabalhadores que vão regressar à empresa para participar na segunda vida daquela que chegou a ser a maior cerâmica portuguesa e que, no início da sua história, em 1921, começou por fazer telhas e tijolos, dedicando-se nos últimos 70 anos à produção de louça sanitária.

As dificuldades financeiras dos últimos anos impediram a companhia de seguir o caminho das suas congéneres europeias, o da massificação da produção, mas que agora a deixa numa situação de vantagem, “a de ter capacidade para responder a pequenas encomendas, num curto espaço de tempo”, explica Henrique Barros.

Fazendo pequenas encomendas a produção é mais cara, mas esse facto não é visto como um problema: “O nosso campeonato não é fazer produto barato. O nosso campeonato é fazer produto de elevada qualidade, com forte prestação de serviço, e cujo valor da encomenda o justifique. Se esta empresa fosse concorrer do ponto de vista de preço não estaríamos aqui”.

Nesta perspectiva,  a produção chinesa não é uma preocupação para os novos  investidores, e, pelo contrário, o país asiático é visto como um potencial comprador, pela apetência por produtos de qualidade, produzidos na Europa.

O acordo de aluguer das actuais instalações foi feito por cinco anos, mas a procura de nova casa vai começar dentro de dois ou três anos. As contas para esse investimento não foram avançadas ao PÚBLICO, mas apenas que podem incluir novos investidores “que casem com este projecto”, explica Henrique Barros.

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