BE pede cópia de contratos entre a FCT e fundação europeia que avalia ciência portuguesa

Adendas ao contrato, cuja existência foi mencionada em Julho por Miguel Seabra, estão por assinar.

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A avaliação definirá o dinheiro destinado ao funcionamento dos centros de investigação Adriano Miranda

A avaliação em curso dos centros de investigação portugueses, que a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) delegou na European Science Foundation (ESF) mediante a assinatura de um contrato entre as duas instituições, teve um novo desenvolvimento: o Bloco de Esquerda (BE) entregou esta semana na Assembleia da República um pedido dirigido ao Governo, assinado pelo deputado Luís Fazenda, para ter acesso a esse contrato e às respectivas adendas. O Governo tem 30 dias, segundo a lei, para responder a este requerimento.

O conteúdo do contrato já é conhecido desde 18 de Julho, quando a FCT decidiu divulgá-lo no seu site após alguns pedidos para tal, incluindo a solicitação formal do jornalista e professor de jornalismo António Granado na Universidade Nova de Lisboa, ao abrigo da Lei de Acesso aos Documentos Administrativos.

Desde então, ficou a saber-se da existência de uma quota para eliminar previamente metade dos centros na primeira fase da avaliação, que não passavam à segunda fase, na qual estariam em jogo as fatias mais grossas do financiamento para despesas de funcionamento nos próximos cinco anos. Na altura, a FCT e o Ministério da Educação e Ciência justificaram a referência à eliminação de metade dos centros como uma “estimativa” baseada na avaliação anterior dos centros de investigação, de 2007.

Mesmo antes de ser conhecida a quota de eliminação de 50% dos centros, entre os 322 em avaliação, os resultados da primeira fase já tinham lançado a controvérsia, desde o seu anúncio no final de Junho. A controvérsia centrava-se então na constatação de que cerca de metade dos centros não tinha passado à segunda fase da avaliação, o que significava que pouco ou nenhum dinheiro esses laboratórios iriam receber para as suas despesas – e os cientistas consideravam que isso levaria ao fim de muitos deles.

No final de Julho, cerca de um mês depois, o presidente da FCT, Miguel Seabra, declarou à agência Lusa que estavam em preparação adendas ao contrato assinado com a ESF: “O contrato foi feito para assegurar que a FCT se responsabilizava por um certo número de custos”, dizia. Há “custos extra que vão ser suportados pela FCT e não estão no contrato”, acrescentava na altura.

Também num “esclarecimento da direcção da FCT sobre o exercício de avaliação das unidades de investigação”, enviado por email a 30 de Julho aos centros de investigação, Miguel Seabra falava das adendas. Essa revisão do contrato, explicava, passava por um ajustamento dos valores pagos por Portugal à ESF para segunda fase da avaliação – que está neste momento em curso e inclui a visita de peritos aos 178 centros de investigação (55,2%) que chegaram a este patamar. Para trás, na primeira parte do processo, ficaram 144 centros (44,7%). Os resultados finais estão previstos para Dezembro.

“Um montante fixo de 109.592 euros é acordado para a segunda fase, com base nos seguintes pressupostos: número de unidades de investigação seleccionadas para a fase 2: 163”, lê-se no contrato assinado entre a FCT e a ESF em Abril deste ano. No final, acabaram por ser mais 15 centros a passar à segunda fase do que o estipulado, tendo já em consideração os resultados das reclamações apresentadas pelos centros, divulgados em Outubro.

No esclarecimento aos investigadores, Miguel Seabra dizia: “O conteúdo do contrato reflecte estimativas que marcam o ponto de partida para estabelecer os valores do contrato em função das despesas previstas e do trabalho envolvido em cada etapa.” E acrescentava que esses cálculos tinham em conta os resultados da avaliação de 2007. “Esta estimativa não significa que, na hipótese de se vir a registar uma desproporção entre essas estimativas e o volume de unidades a passar à segunda fase, não seriam revistos os custos e as condições do contrato. De facto, algumas estimativas feitas não se concretizaram e estamos a preparar adendas ao contrato com revisão e ajustamento dos valores relevantes.”


"Gravidade jurídica"
No dia em que a FCT enviou o esclarecimento aos cientistas, António Granado também pediu o acesso às adendas e foi-lhe dito que ainda não estavam assinadas. Mais de dois meses depois, a 7 de Outubro, apresentou uma queixa à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA). No dia seguinte, segundo o jornalista, a FCT informou-o de que as adendas ainda não estavam “assinadas por ambas as partes” e que, portanto, não as podia divulgar.

Esta terça-feira, o grupo parlamentar do BE apresentou um requerimento para ter acesso, além do contrato, às respectivas adendas. Para este partido, o facto de as adendas não estarem assinadas em Outubro significa que “a FCT lançou uma avaliação com base num contrato cujos termos não estão esclarecidos a meio da segunda fase do processo de avaliação”: “A confirmar-se esta situação, estamos perante um caso de gravidade jurídica cujas consequências são difíceis de calcular”, diz o requerimento.

As adendas ao contrato ainda não estão assinadas, respondeu a FCT ao PÚBLICO por escrito, na quarta-feira, através da coordenadora do gabinete de comunicação, Ana Godinho. “Assim que a adenda estiver assinada por ambas as partes, será disponibilizada na página da FCT”, lê-se. “A adenda não tem impacto sobre o procedimento do processo de avaliação (…), antes reflecte pequenos ajustes, necessários em resultado da evolução do processo, de modo a descrever exaustivamente todas as tarefas envolvidas, tal como acontece em todo o tipo de contratos deste género”, acrescenta-se.

“Fico muito contente que os deputados olhem para este caso, pois parece-me muito estranho que ainda não estejam assinadas adendas de um contrato em plena execução, para mais quando elas foram anunciadas há mais de 80 dias”, considera António Granado.

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