TC revoga expulsão de militante do PS que denunciou fraudes

Cristina Martins foi expulsa depois de denunciar irregularidades na inscrição de militantes em Coimbra.

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Enric Vives-Rubio

O Tribunal Constitucional pronunciou-se contra a expulsão de Cristina Martins do PS, depois de esta socialista ter denunciado ao Ministério Público suspeitas de fraude na inscrição de militantes em Coimbra.

“O que peço agora ao partido é que proceda de acordo com os estatutos e aplique a pena devida, nem que seja uma admoestação.” Foi assim que a militante socialista, Cristina Martins, reagiu à decisão do TC de considerar anti-estatutária a expulsão decretada pelas comissões de jurisdição do PS.

A militante em causa tinha recorrido da expulsão para o Palácio Ratton. Os juízes-conselheiros consideraram a 15 de Outubro que deveria ser declarada “inválida a decisão impugnada [expulsão] por violação do princípio da segurança jurídica”.

Traduzida, a decisão do TC considerou que o processo de Cristina Martins, enquanto dirigente local do PS, não podia ter sido desencadeado e instruído pela Comissão de Jurisdição Federativa, mas antes pela Comissão Nacional. Como esta última aceitou o processo da primeira, cometeu uma irregularidade.

Cristina Martins considerava-se ontem reintegrada no PS. “Continuo a ser a militante número 23 778”, disse, depois de criticar violentamente os dirigentes envolvidos no seu processo. “Tiago Castelo Branco [da Comissão de Jurisdição Federativa de Coimbra] e Ramos Preto [presidente da Comissão Nacional de Jurisdição] já deviam ter vindo a público pedir a demissão dos cargos que ocupam e pedir desculpa ao PS pelo mau nome que lhe deram. Não têm competência moral política para se manterem em funções”, rematou.

A socialista garantiu ainda estar convencida que a sua expulsão se deveu “ao ódio e à corrupção interna que existe em Coimbra”.

Foi em 2012 que Cristina Martins - antiga coordenadora da secção da Sé Nova do PS de Coimbra - denunciou a existência de inscrições de militantes com "moradas que não existem", "moradas erradas" e "duplas filiações", entre outros casos. Todo o processo decorreu durante os mandatos do demissionário secretário-geral, António José Seguro, e numa federação que apoiou a sua liderança.

O Conselho de Jurisdição do PS, liderado pelo deputado Ramos Preto, expulsara Cristina Martins este ano, depois do processo instruído na comissão federativa em Coimbra, com o argumento de que esta não havia seguido todos os canais internos antes de avançar para as autoridades judiciais.

Contactado pelo PÚBLICO, Ramos Preto escusou-se a fazer comentários sobre a decisão do TC. Existem agora três saídas para o embaraço criado ao PS. Ou o partido avança com um novo processo disciplinar contra Cristina Martins na Comissão Nacional de Jurisdição, ou recorre para o plenário do TC, ou não recorre e reintegra a militante em causa. Segundo alguns dirigentes nacionais contactados pelo PÚBLICO, deverá ser esta última opção a que deverá ser seguida.

Em 2012, o PÚBLICO noticiou a participação criminal feita por Cristina Martins. Nesse ano, entregou provas documentais no Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP).

Na participação – a que o PÚBLICO teve acesso na altura – são denunciadas suspeitas dos crimes de “falsificação ou contrafacção de documento” e de “uso de documento de identificação alheio”. E elencam-se os casos concretos. Num mesmo “apartamento”, numa rua identificada em Coimbra, por exemplo, foram inscritos nove militantes “apesar de recenseados em lugares diferentes e díspares, onde também, por coincidência (ou não), moram já, pelo menos, outros treze cidadãos militantes do PS”.

A queixa identifica ainda outra morada que foi colocada como residência de sete candidatos a militantes. “Ora sucede que nessa morada fica a casa de José Manuel [nome fictício] e família, o qual declara que ali não vive nem nunca residiu nenhum dos candidatos a militantes.”

A responsável por esta secção confirmou ao PÚBLICO a queixa apresentada no DIAP. Cristina Martins explicou que o que lhe “chamou a atenção” foi deparar com inscrições em que constavam nomes de ruas que não existiam em Coimbra: “Rua da Amizade, por exemplo…”

O objectivo dessas inscrições em massa de novos militantes passava por tentar condicionar as eleições para os órgãos internos, pois, ao entrar pela mão de uma das partes em disputa, depreendia-se que o seu voto seria de acordo com aqueles que os propuseram. Tudo isto potenciado pelo facto de, no momento da inscrição, não se exigir qualquer documento de identificação ao candidato. Uma insuficiência que foi alterada por proposta de António José Seguro.

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