A revolução do guarda-chuva

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Os movimentos e revoluções precisam de símbolos para se identificar e expandir. Ao fim de poucos dias, os protestos dos estudantes de Honk Kong passaram a ter nome: “The umbrella revolution” (revolução do guarda-chuva). É um signo ironicamente apropriado à China, que fabrica 70% dos guarda-chuvas de todo o mundo.

O humilde guarda-chuva serviu aos manifestantes para se protegerem do violento sol do fim de Verão. As primeiras fotos mostram um mar de guarda-chuvas. Quando, na noite de domingo para segunda-feira, a polícia carregou sobre eles, serviu de escudo contra os sprays de gás de pimenta. Nesse momento, ainda não era um signo. Era um pacífico utensílio.

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A barricada constrói-se com os guarda-chuvas dos manifestantes nesta fotografia de 30 de Setembro BOBBY YIP/REUTERS

No fim-de-semana irrompeu o símbolo. A expressão “umbrella revolution” terá aparecido num tweet no dia 26. Passou despercebida. No domingo, o Independent, de Londres, usou-a num título na homepage, mas o artigo não a refere. As redes sociais pegaram nela. Paralelamente, inspirado pela foto de um manifestante com dois guarda-chuvas erguidos, um designer de Hong Kong logo concebeu um poster que começou a circular na Internet. Na manhã de segunda-feira, o correspondente da Time fotografava uma barricada com duas inscrições: “We want democracy” e “Umbrella revolution”. Uma foto da Reuters, com um estudante de guarda-chuva erguido numa nuvem de gás lacrimogéneo, iria tornar-se um ícone do protesto (http:/www.businessinsider.sg/umbrella-man-hong-kong-2014-9/#.VCwn_lJdbct). A foto icónica de Tiananmen é a do “homem do tanque”. A de Hong Kong é a do “homem do guarda-chuva”.

“Os símbolos reproduzem-se e contagiam”, diz o semiólogo Massimo Leone, da Universidade de Turim. “Para terem êxito, as manifestações devem expandir-se e atrair a atenção das pessoas, dos media e do poder.” Alguns jornais comparam o guarda-chuva de Hong Kong com os cravos do 25 de Abril.

Os estudantes não querem fazer uma revolução. Querem poder eleger, em 2017, o chefe do seu executivo numa escolha aberta e não entre dois ou três candidatos aprovados por Pequim. Exprimem frustração e, sobretudo, a imensa diferença de cultura política entre Hong Kong e o continente, diz o sinólogo Jean-Pierre Cabestan, da Universidade Baptista de Hong Kong. É o maior desafio político a Pequim desde Tiananmen, em 1989. O Presidente chinês, Xi Jinping, não cederá, explicam quase todos os sinólogos.

Na quinta-feira permanecia a incerteza. Wang Dan, dirigente de Tiananmen, o número um da lista dos “21 mais procurados”, preso e depois exilado nos Estados Unidos, recorda a Hong Kong as lições que tira de 1989. “As exigências devem ser realistas.” Os estudantes deveriam pensar num processo longo. “Esta luta estimulará as novas gerações na promoção do desenvolvimento democrático de Hong Kong. Haverá mais lutas no futuro. Os líderes do movimento devem ser claros quanto às reivindicações que fazem e discutir o modo como irão terminar o movimento.” Como e quando?

Para o bem ou para o mal, o guarda-chuva já conquistou um lugar na História da China contemporânea.  

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