Pedido de Passos à PGR esbarra no levantamento do sigilo bancário

Primeiro-ministro requereu que se esclareça se cometeu ou não ilícitos enquanto foi deputado. Mas com os eventuais crimes prescritos, o Ministério Público não tem legitimidade para pedir os extractos ao banco.

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Passos já enviou pedido à PGR Enric Vives-Rubio

O pedido do primeiro-ministro à Procuradoria-Geral da República para que se averigúe se houve algum ilícito no recebimento de montantes não declarados e com origem na Tecnoforma deverá esbarrar no sigilo bancário. Uma vez que os eventuais crimes estarão prescritos – reportarão ao período entre 1997 a 1999 e o crime de fraude fiscal prescreve após dez anos - o Ministério Público (MP) não terá legitimidade para fundamentar o pedido ao banco para que levante o segredo. Seria uma forma de obter a informação capaz de desfazer a dúvida sobre se Passos Coelho recebeu efectivamente algum vencimento pelo seu cargo de presidente do Centro Português para a Cooperação ligado à Tecnoforma naqueles anos.

Procuradores ouvidos pelo PÚBLICO garantem mesmo que se o pedido for feito e os dados acedidos, o magistrado que o subscrever poderá a incorrer numa ilegalidade porque está a querer apurar um crime que já prescreveu e com isso a lesar direitos. Em último caso, sublinham, poderá estar ele próprio a violar o segredo bancário.

Isto não impossibilita que a questão seja averiguada pela PGR, apesar de alguns juristas realçarem que não se pode investigar formalmente um crime que prescreveu. “É ridículo abrir um inquérito que já se sabe que será de imediato arquivado”, disse ao PÚBLICO o constitucionalista Manuel Costa Andrade.

Perante uma denúncia, a PGR pode abrir um inquérito para verificar se o crime prescreveu efectivamente, arquivando-o de imediato. Esta tem sido a prática dos magistrados, ao que o PÚBLICO apurou junto de fontes judiciais. Porém, neste caso já até há um inquérito em curso, o relativo à Tecnoforma no Departamento Central de Investigação e Acção Penal. Foi para lá que a procuradora-geral da República remeteu, aliás, a denúncia anónima que visa o governante relativamente ao que recebeu enquanto deputado e o que declarou.

O teor do pedido de Passos Coelho para que o MP averigúe a sua situação ainda não é conhecido, mas um procurador explicou ao PÚBLICO que as investigações não servem para excluir as responsabilidades de ninguém. A situação deixa dúvidas e merece as críticas e a oposição de alguns juristas. “Um crime que prescreveu não pode ser investigado. O MP investiga para haja acusação e punição. Isso é um acto nulo”, disse ao PÚBLICO o ex-procurador-geral distrital de Coimbra, Braga Temido.

E neste ponto, todos estão de acordo, mesmo os procuradores que admitem a possibilidade se abrir um inquérito. “Esses actos são nulos”, dizem. Mas se no âmbito do inquérito que está a decorrer no DCIAP, o MP tiver encontrado informação que esclareça o pedido de Passos pode, afinal, vir prestar informação pública apesar do segredo de justiça do processo original. Tal está previsto na lei, a pedido do visado e em caso de interesse público, como aconteceu recentemente quando a PGR veio dizer que o ex-primeiro-ministro, José Sócrates não é suspeito no âmbito do processo Monte Branco. Noutra coisa concordam também os magistrados. Passos Coelho, dizem, é o único com legitimidade para pedir as suas próprias informações bancárias que esclareça cabalmente a suspeita. 

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