Sistema de ensino entre as “cobaias” e as “salsichas educativas” não deu resultados, diz Passos Coelho

Discursando na cerimónia de abertura do ano lectivo no Conselho Nacional de Educação, o primeiro-ministro deixou críticas aos impulsos reformistas que deterioram a qualidade do ensino. E defendeu que é preciso reforçar a rede pré-escolar e questionar o financiamento de cursos sem empregabilidade.

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Primeiro-ministro e ministro da Educação na abertura oficial do ano lectivo, em Lisboa Enric Vives-Rubio

Depois de ter sido uma “espécie de cobaia” do sistema educativo no seu tempo de aluno, em que as reformas eram muito complexas, o primeiro-ministro considera que as “salsichas educativas” com que se encheram novos graus de ensino não aumentaram a qualidade do ensino.

Discursando na sessão solene de abertura do novo ano escolar perante o Conselho Nacional de Educação (CNE), Pedro Passos Coelho defendeu que o sistema educativo “não pode andar aos solavancos dos impulsos reformistas que cada Governo faça” e que é preferível ir introduzindo gradualmente pequenos aspectos de uma grande reforma do que querer fazer tudo de uma vez.

Durante décadas, vincou, gerou-se a ideia de que a reforma educativa “era de tal forma complexa” que tinha que ter reflexos e alterações em todos os graus de ensino, sendo depois preciso esperar muitos anos pelos resultados. “Durante muito tempo essa visão da reforma educativa foi uma espécie de experiência laboratorial que marcou várias gerações. Eu pertenço a uma delas”, reconheceu. Mas essa, percebeu-se depois, era uma abordagem errada.

Por contraponto, uma reforma faseada do sistema de ensino permite ir obtendo um “retorno mais imediato” dos resultados em vez de ser necessário esperar nove, 12 ou 16 anos para se observarem – uma “longa e duvidosa espera pelos resultados ambicionados” –, argumentou o chefe do Governo.

Passos Coelho defendeu a necessidade de um “largo consenso sobre os aspectos mais estruturantes do sistema educativo”, precisamente para evitar os tais “solavancos”, em que “cada Governo teria a obrigação de executar uma parte dessas orientações e dessa reforma”.

Mas não foi isso que aconteceu, realçou, e o “atraso educativo português”, embora venha a ser paulatinamente atenuado, deixou “marcas permanentes”. Passos Coelho recordou que muitas pessoas da sua geração nem sequer concluíram o 9.º ano de escolaridade e são agora as principais vítimas do desemprego estrutural.

Sem nomear governos ou governantes, disse que houve quem tivesse tentado resolver o problema, mas há ainda “um caminho longo a percorrer”. Porque “aumentar a salsicha educativa não é a mesma coisa que ter um bom resultado educativo. Foi assim que no passado a generalização de novos graus de ensino não corresponderam a um salto qualitativo mais exigente no produto escolar." – uma referência indirecta a programas como o Novas Oportunidades, criado durante a governação socialista.

Reforço da rede pré-escolar entre as prioridades
Sobre o relatório Estado da Educação 2013 divulgado pelo CNE, o primeiro-ministro salientou aspectos positivos como a diminuição da taxa de abandono escolar e a progressão dos resultados do PISA (o estudo da OCDE que avalia o estado da literacia dos alunos de 15 anos em Leitura, Matemática e Ciências).

Mas também mostrou que leu os alertas sobre o aumento da taxa de retenção cada vez mais precoce, a “necessidade de questionar melhor o financiamento público a cursos superiores de fraca empregabilidade” e a progressiva diminuição da procura de cursos de base tecnológica que a médio prazo arrisca “pôr em causa a estratégia económica” do país. E ainda sobre as exigências na formação inicial de professores (de que as provas de Português e Matemática são um exemplo) e também sobre a necessidade de reforço da rede pré-escolar (para, indirectamente, ajudar a aumentar a natalidade).

Passos Coelho aproveitou para realçar também que o próprio CNE “desdramatiza” duas questões que têm merecido críticas de professores e sindicatos: a estratégia da organização dos agrupamentos escolares e o aumento do número de alunos por turma.

Na sua estreia perante o Conselho Nacional de Educação, o primeiro-ministro elogiou o papel daquela entidade na “sustentação de políticas de médio e longo prazo que possam durar mais do que as importantes decisões que se vão tomando no dia-a-dia”. E partilhou da homenagem que o CNE fez a Adriano Moreira, antigo conselheiro, de quem disse ser um homem de “múltiplas facetas”, que tem um passado e presente “baseado no talento, na sabedoria e na palavra”. E que mereceria homenagens também da área social, cívica e política.

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