Ministra garante injecção de 3900 milhões e afasta fantasma do BPN

A unir a oposição no Parlamento esteve a mudança do mundo. Em 15 dias, repetiram as bancadas, o mundo da ministra e do BES alterou-se. "Foi enganada? Não sabia? Sabia e veio enganar os portugueses e os deputados?", questionou o PCP.

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Maria Luís Albuquerque foi ouvida nesta quinta-feira no Parlamento Miguel Manso

Foi um debate político puro e duro. Com todos os ingredientes: Troca de acusações, ironia, apartes, crispação, nenhum entendimento sobre a mesma matéria e até um fantasma. Tem sete anos e chama-se BPN. A chamada de urgência, feita pelo PS, da ministra de Estado e das Finanças ao Parlamento no caso BES obrigou esta quinta-feira à reunião a comissão permanente da Assembleia da República.

A única novidade, mesmo assim já expectável, foi a confirmação por Maria Luís Albuquerque de que, afinal, o Estado aceitou a proposta dos bancos de injectarem no Fundo de Resolução bancário um montante superior ao inicialmente previsto, o que faz com que os cofres públicos injectem 3900 milhões de euros no Novo Banco, em vez dos anunciados 4.400 milhões.

O financiamento do Estado é “transitório” e dele nunca sobrará qualquer factura para os contribuintes. A garantia foi repetida várias vezes pela governante e explicada com recurso à figura do Fundo de Resolução, esse instrumento que dividiu as bancadas parlamentares. Do mesmo lado, ministra, PSD e CDS falaram de um fundo alimentado exclusivamente pelo sector financeiro. Do outro lado, PS, PCP, BE e PEV carregavam na tese de que esse mesmo Fundo é gerido pelo Ministério das Finanças e pelo Banco de Portugal.

“Quem manda no fundo de resolução é o Estado”, disse o bloquista Pedro Filipe Soares. O comunista João Oliveira, que fez a intervenção mais dura da tarde, já tinha pedido um sem fim de garantias à ministra. A principal, a de que a factura dos prejuízos do BES não vai “estourar nas mãos” dos contribuintes. Mas o líder da bancada comunista queria saber mais: qual a participação da CGD no capital social e as responsabilidades do Governo no destino do Novo Banco, que “corresponde quase inteiramente ao BES”.

A unir toda a oposição esteve ainda a mudança do mundo. Em 15 dias, repetiram as bancadas, o mundo da ministra e do BES alterou-se, ao ponto de no dia 17 de Julho Maria Luís garantir no Parlamento que o BES era “um banco sólido”, lembrou o líder da bancada do Bloco. “Foi enganada? Não sabia? Sabia e veio enganar os portugueses e os deputados?", perguntou o líder da bancada do PCP.

A ministra respondeu: “O que mudou em 15 dias foi a quantidade de factos novos que vieram a público”, nomeadamente, apontou, a divulgação dos resultados do primeiro semestre do banco.

Antes, Alberto Martins apontara um “falhanço” tripartido para explicar o actual "desenlace".  Falharam a supervisão bancária portuguesa, a troika e o Governo por não agirem atempadamente. O líder da bancada socialista trouxe perguntas também: “Porquê este montante? Porquê esta taxa de juro? Quais são as garantias do Estado? As acções do Novo Banco são dadas como garantia?”

A ministra voltava a sacudir a responsabilidade do Estado e afastava o fantasma do BPN. “O sistema financeiro, no seu conjunto, tem de pagar todo o montante que o Estado adiante, independentemente do montante ou do prazo da venda do Novo Banco (…) Não queremos ficar com as acções de um banco para não ficar com o prejuízo. O Estado não é accionista do Novo Banco. O Estado não vai ser chamado a pagar eventuais prejuízos do Novo Banco”, afirmou Maria Luís Albuquerque.

A primeira ronda pelos partidos coube ao PSD. Duarte Pacheco fez pedidos de "serenidade", reconheceu que a crise no BES terá repercussões na economia e pôs o dedo nas duas feridas do PS. Irritou os socialistas com uma referência à “simples” nacionalização do BPN e ao facto de "portugueses ainda estarem traumatizados com o BPN". E terminou a intervenção a apontar para as “lutas internas” que se vivem por estes dias no maior partido da oposição. Contudo, pediu “serenidade”.

Cecília Meireles, pelo CDS, foi mais fundo: “No caso do PS, foi um trauma tão profundo que provocou amnésia. Sabem o que fizeram? É bom que sim, porque os portugueses ainda estão a pagar o que os senhores fizeram no BPN”.

PSD e CDS insistiram na mesma ideia de que a solução adoptada para o BES é “a melhor solução” de entre as possíveis: nacionalização, recapitalização pública ou falência. “Perfeito seria nada disto ter acontecido”, assinalou a deputada centrista. Luís Montenegro, líder parlamentar do PSD, insistiu: "Chegam à demagogia de virem com a ladainha que estamos a ajudar os banqueiros, os poderosos, quando isentámos de responsabilidade os contribuintes, ao invés do que aconteceu no o BPN".

De ambiente crispado até ao fim, os socialistas defenderam-se com uma possibilidade que não existia aquando da nacionalização do BPN, em 2008: o fundo de resolução bancária, criado em 2012. Agora, no caso do BES, contra-atacou Alberto Martins, “as campainhas já tinham soado” há mais de um ano. “Poderá dizer que desconhecia, mas tinha a obrigação de conhecer”, atirou à ministra, que durante uma hora e vinte não parou de tirar notas.

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