Hospital da Feira com falta de médicos para assegurar urgências

Administração e direcção clínica do Hospital da Feira vão pedir reuniões à Ordem dos Médicos e à ARS Norte para resolver carências. “Recurso sistemático” a internos na urgência contraria legislação, alerta Ordem e Sindicato Independente.

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A tutela tem feito orçamentos rectificativos para ajudar os hospitais a saldar as dívidas Paulo Pimenta

A administração do Hospital de S. Sebastião (Santa Maria da Feira) admite o recurso “pontual” a médicos internos (que estão ainda em formação e não podem trabalhar sem supervisão) para assegurar o funcionamento do serviço de urgência geral, mas garante que estão a ser acompanhados por especialistas. Em comunicado, a Ordem dos Médicos e o Sindicato Independente dos Médicos/Norte mostram-se preocupados com a situação que se vive naquela urgência e avisam que, “em última análise”, ponderam denunciar “amplamente junto das populações” a “existência de risco no recurso àqueles serviços”.

O conselho de administração e a direcção clínica decidiram pedir reuniões com a Administração Regional de Saúde (ARS) do Norte e com a Ordem dos Médicos para “esclarecimento das medidas tomadas para assegurar o funcionamento do serviço de urgência no Hospital de S. Sebastião” durante este mês.

“Face à situação de carência registada na constituição das equipas", e para assegurar as necessidades da urgência geral, "foi solicitada a colaboração pontual de médicos do internato da especialidade (...) sob a supervisão de especialistas de medicina interna em funções no serviço de urgência”, assegurou o hospital, em resposta escrita enviada ao PÚBLICO.

É a resposta à notícia avançada nesta terça-feira pelo Jornal de Notícias, que adianta que a carência crónica de médicos nesta unidade de saúde (integrada no Centro Hospitalar de Entre Douro e Vouga), agravada no período de férias, está a fazer com que a a administração recorra a internos e desvie médicos dos seus serviços nos períodos mais complicados para poder assegurar o serviço de urgência.

Mesmo assim, as equipas estão a trabalhar com um número reduzido de profissionais. Segunda-feira, segundo o jornal, só estariam a trabalhar dois dos três especialistas necessários e, como consequência, um interno terá estado toda a noite a trabalhar sem supervisão da sua especialidade. “Estão a pedir-nos para ver doentes de áreas em que não nos sentimos preparados. É a segurança dos doentes que fica em causa”, disse ao jornal um médico interno não identificado.

O presidente da Secção Regional do Norte da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, avisou que, se a situação não for alterada, o organismo pode retirar a idoneidade formativa (capacidade de formar internos) a este hospital, enquanto Jorge Silva, do Sindicato Independente dos Médicos, considerou que, "por falta de planeamento, pode estar em risco a qualidade dos cuidados prestados à população".

Ordem e sindicato reagem
O Conselho Regional do Norte da Ordem dos Médicos e o Sindicato Independente dos Médicos/Norte consideram que “o recurso sistemático” ao trabalho de internos para “assegurar o serviço de urgência” de “forma indiscriminada e sem a devida garantia de tutela e de qualidade de formação, contraria fortemente” a legislação relativa ao internato e ao código deontológico. Caso a situação se mantenha, ponderam, “em última análise”, denunciar “amplamente junto das populações” a “existência de risco no recurso àqueles serviços”.

Num comunicado que enviaram ao conselho de administração e aos responsáveis clínicos daquele centro hospitalar, consideram que se está perante “uma violação grosseira dos princípios e valores que devem presidir à organização do trabalho médico e aos cuidados de saúde”.

Garantem que tiveram “conhecimento do conteúdo da comunicação normativa” do presidente do conselho de administração daquele centro, “relativa à situação insustentável e inaceitável de carência crónica de médicos” na urgência, mas defendem que as medidas propostas “não resolvem a situação de insuficiência de médicos já denunciada” e “comunicada pela directora do serviço de urgência às autoridades competentes”.

Argumentam que “não é sério rotular a situação de emergente quando já era previsível há vários meses, já tinha acontecido no ano anterior e nada foi feito entretanto para a resolver”. Consideram que “os tempos de espera mais prolongados” na urgência “estão a ter consequências negativas na relação médico-doente, pondo em risco a segurança dos profissionais e aumentando o risco de erro médico”. E acusam a administração de não lutar “junto da tutela pela abertura de concursos de recrutamento de médicos qualificados”.

Além disso, referem que “atribuir funções e responsabilidades díspares e no mesmo horário de trabalho” a especialistas, “numa espécie de dois em um, é contrário às regras mínimas de segurança”.

Ressalvam ainda que, “dentro dos limites legais, os médicos internos podem ser chamados a prestar trabalho suplementar” na urgência, mas “não podem ser utilizados como mão-de-obra indiferenciada, permanentemente disponível”, que “colmate as carências de recursos humanos e organizacionais” que são “responsabilidade das administrações e direcções hospitalares.”

Na nota enviada também à imprensa, consideram que a situação “afecta de forma inaceitável os médicos em formação e os cuidados de saúde”, garantem que estão a acompanhar o caso e que “não gostariam de ter de accionar medidas” para “garantir a idoneidade formativa” da instituição ou para salvaguardar os direitos dos médicos.

O PÚBLICO pediu uma reacção à ARS/Norte, mas ainda não obteve resposta.

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