Presidente promulgou Lei do Segredo de Estado mas aconselha o Parlamento a clarificá-la

Cavaco Silva quer ver esclarecida a atribuição, aos vários órgãos de soberania, de competências de desclassificação de matérias classificadas, e também a tipificação do crime de violação do segredo de Estado.

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Mesmo numa conferência de imprensa com o Presidente búlgaro, Cavaco Silva fez questão de sublinhar o teor de alguns recados que tem deixado à oposição de esquerda. Nuno Ferreira Santos

O Presidente da República promulgou a nova Lei do Segredo de Estado, mas numa mensagem ao Parlamento lançou críticas sobre a formulação da atribuição de competências para a desclassificação de documentos e sobre a tipificação do crime de violação do segredo. Cavaco Silva aconselha mesmo os deputados a fazerem alterações ao texto para o tornar mais claro.

Depois de em 2009 ter vetado um diploma sobre o mesmo assunto por discordar da atribuição a um órgão interno da Assembleia da República do poder da desclassificação e ao seu presidente dos poderes de conceder acesso aos documentos, Cavaco Silva volta a ter dúvidas sobre estas competências. E afirma mesmo que só promulgou o diploma porque preferiu olhar para elas com uma interpretação mais aberta.

Por isso, pede que os seus reparos sejam “objectos de uma reponderação” por parte dos deputados, de forma a eliminar as “dúvidas e equívocos interpretativos que possam subsistir numa matéria de tão elevada sensibilidade”.

A nova lei estipula que só pode desclassificar matérias, documentos ou informações sujeitos ao segredo de Estado a mesma “entidade que procedeu à respectiva classificação definitiva ou o primeiro-ministro”.

Se a interpretação a fazer desta regra fosse a de dar ao chefe do Executivo poderes para “desclassificar matérias que tenham sido classificadas por outras entidades, incluindo o Presidente da República e o presidente da Assembleia da República”, então Cavaco avisa que vetaria o diploma. Porque, justifica, “agravaria as dificuldades (…) do relacionamento entre órgãos de soberania”, tal como já avisara em 2009.

Mas como o Parlamento caminha mais na direcção dos avisos que Cavaco Silva fez há quatro anos, o Presidente admite que se pode interpretar a norma como dando ao primeiro-ministro poderes sobre desclassificações de documentos classificados por membros do Governo. E garante: “Só esta interpretação permitiu a minha promulgação.”

Por isso, avisa: “Numa matéria com a importância do regime do segredo de Estado, não devem subsistir dúvidas ou equívocos interpretativos, pelo que esta interpretação deve resultar da lei de modo absolutamente claro, sendo certamente possível encontrar uma formulação que o assegure.”

O deputado José Magalhães, que acompanhou o assunto pelos socialistas, disse ao PÚBLICO que "as duas reservas presidenciais são compreensíveis". E acrescentou que o PS "nunca votaria uma lei que permitisse ao primeiro-ministro desclassificar matéria classificada pelo Presidente" e que a "definição precisa do crime de violação do segredo de Estado pode e deve fazer-se na sede própria, ou seja, no Código Penal" - como o próprio chefe de Estado sugere na mensagem.

O PSD, através da vice-presidente Teresa Leal Coelho, afirmou-se “totalmente disponível” para acolher as sugestões do Presidente da República no sentido uma reponderação de algumas normas da lei do segredo de Estado e elogiou a atitude de cooperação institucional de Cavaco Silva.

A outra matéria que levanta dúvidas ao Presidente da República é a da tipificação do crime de violação do segredo de Estado, que Cavaco Silva diz ser “desejável” que se “tornasse inequívoco”, na redacção do actual diploma, que a criminalização “incide sobre condutas que envolvam a perigosa revelação de informações, factos ou documentos, planos ou objectos previamente classificados como segredo de Estado”.

O Presidente da República realça ainda o “significativo consenso” sobre o segredo de Estado – o diploma foi aprovado com os votos da maioria e a abstenção do PS.

 

Notícia da Lusa substituída às 18h40

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