Associações de ciclistas querem seguradoras dos carros a pagar acidentes

A questão de quem deve ser responsabilizado pelos sinistros é apenas uma das várias que suscitam a discórdia entre associações de utentes de bicicletas e de automóveis.

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Cada vez mais portugueses usam a bicicleta para as suas deslocações Enric Vives-Rubio

As associações de ciclistas defendem que os estragos causados por um acidente entre um veículo a motor e uma bicicleta devem ser pagos pela seguradora do motorizado, mesmo que a culpa seja do ciclista, e o seguro seja agravado.

A posição é justificada por Mário Alves, representante da Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta (Mubi) com o facto de ser essa a legislação adoptada noutros países da União Europeia.

Segundo referiu, existe uma directiva europeia designada por "responsabilidade objectiva" que já é aplicada noutros países europeus e que determina que, "em caso de colisões, independentemente de quem é culpado, deverá haver uma cobertura dos danos por parte das seguradoras automóveis", mesmo que posteriormente seja agravado o valor pago à seguradora.

Para Mário Alves, é natural que o seguro do automóvel seja agravado, mesmo quando a culpa é do ciclista, já que o carro "é bastante pesado e custoso para a sociedade". "Mais um pequeno agravamento não parece que seja muito grave", afirmou. O carro é "uma arma potencial", frisou, acrescentando que "quem tem uma carta de condução, tem de ter responsabilidades para com aqueles que não têm".

Para o presidente da Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta (Fpcub) o pagamento pelo seguro automóvel dos danos de um acidente causado por uma bicicleta tem ainda uma outra justificação. José Caetano acredita que se fosse obrigatório seguro para os ciclistas "também teria de ser obrigatório para os peões, já que [estes também] atravessam a via pública e usam passeios".

De acordo com o responsável da Fpcub, os problemas de sinistralidade devem ser "responsabilidade dos veículos motorizados, sejam eles motos, automóveis ou veículos pesados" até porque "a utilização de bicicleta é boa para a saúde, ambiente e economia".

Direitos e deveres
A visão de quem representa o sector automóvel é, no entanto, diferente. Para o presidente do Automóvel Club de Portugal (ACP), Carlos Barbosa, o novo Código da Estrada "tem de ser revisto", tendo em conta que os ciclistas "não estão habituados a conviver em ambiente rodoviário" e ganharam direitos.

"Se têm mais direitos têm também de ter mais obrigações", considerou numa altura em que as regras do novo Código da Estrada para as bicicletas estão a causar discórdia nas entidades do sector quanto aos direitos e deveres dos ciclistas e a levantar antigas questões como a necessidade de matrícula e de seguro.

Numa altura em que cada vez mais portugueses usam a bicicleta para as suas deslocações, tornam-se mais frequentes as questões sobre a fiscalização destes veículos. O responsável da Unidade Nacional de Trânsito da GNR Gabriel Barão Mendes admitiu que, "para as entidades fiscalizadoras, seria benéfica a obrigatoriedade de os velocípedes terem uma matrícula", mas, sobretudo, que os ciclistas "tivessem formação [sobre as regras para circular na via pública] como uma licença de condução".

Uma ideia contestada pelo presidente da Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta, José Caetano, para quem a obrigação de ter matrícula "é apenas uma forma de captar impostos" já que "há um número no quadro da bicicleta que serve para a sua identificação".

O possível incumprimento das regras de condução em estrada pelos ciclistas é uma questão que também preocupa o presidente do ACP. "Há ciclistas a passar sinais vermelhos e a andar em cima de passeios", apesar de o novo Código de Estrada ter sido "altamente divulgado", disse, frisando que apenas com uma matrícula "seria possível identificar correctamente essa infracção".

Ter ou não ter seguro
De acordo com Carlos Barbosa, quando o Código da Estrada foi actualizado, em Janeiro, o ACP insistiu com o Governo na necessidade "de [os ciclistas] terem seguro como têm os veículos [motorizados] de duas rodas que se deslocam no ambiente rodoviário".

Mas para Mário Alves, representante da Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta, esse tipo de obrigações seria "um verdadeiro tiro no pé no que toca às políticas públicas", porque as bicicletas "têm tantas vantagens a nível económico, social, ambiental e de saúde que não devem ter quaisquer encargos". Também o vice-presidente da Federação Portuguesa de Ciclismo, Sandro Araújo, defende que a matrícula e o seguro "são indesejáveis" para as bicicletas porque "dificultam a utilização".

Quanto mais bicicletas circularem menos perigoso se torna o ambiente rodoviário "e mais seguro é para os ciclistas", reforçou Sandro Araújo. E acrescentou que "há estudos que demonstram que quanto mais estes [veículos] circularem nas estradas, menor é a quantidade de acidentes gerados".

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