Conhecer as guerras, aprender a evitá-las

Aprender com a I Guerra Mundial é acautelar o futuro. Para evitar um novo “monstro” à escala planetária.

Hoje, há precisamente um século, o Império Austro-Húngaro declarou guerra à Sérvia, desencadeando a que ficou conhecida como I Guerra Mundial. Partindo da morte de um só homem, o arquiduque Francisco Fernando, assassinado em Sarajevo por nacionalistas sérvios, saldou-se por 8 milhões e meio de mortos, 20 milhões de feridos e um rasto de destruição, dor e sofrimento até aí em precedentes na Europa e no Mundo.

Embora esta carnificina tivesse, depois, apenas um interregno de duas décadas (terminada em 1918, seria retomada com igual ferocidade em 1939 por Hitler até ser finalmente estancada em 1945, com um saldo mundial superior a 50 milhões de mortos, metade deles civis), as suas lições ainda hoje precisam ser lembradas e estudadas, pelas gerações posteriores.

Por esta razão, e juntando-se aos que, em todo o mundo, assinalam a data de uma forma não apenas evocativa como interpretativa, o PÚBLICO dá hoje início à publicação de um destacável diário e a um espaço próprio no seu site dedicados à I Guerra Mundial. Um espaço onde, além da evocação de datas-chave e episódios a elas ligados, abordaremos, através de entrevistas, reportagens e artigos de especialistas, vários aspectos da guerra menos divulgados, em particular os relativos ao envolvimento de Portugal no conflito.

Hoje, mostramos (através de uma reportagem de Manuel Carvalho e Manuel Roberto) como em Moçambique se tentou abafar e esquecer aquele que foi um dos maiores desaires portugueses em campos de batalha, a segunda maior derrota do exército português depois de Alcácer Quibir; frente às balas alemãs, sim, mas também por impreparação e total falta de planeamento. Fome, sede, paludismo, disenteria, febres, fizeram milhares de mortos. Os seus cemitérios foram profanados ou são hoje lixeiras, mas persiste a memória desses homens enviados para a guerra como para matadouros. Isso e a forma como os nativos foram forçados a tormentos para sustentar uma campanha condenada à partida. Morreram dezenas de milhares. A violência contra civis é também abordada hoje, numa entrevista com Jay Winter, um dos mais importantes historiadores do século XX, que fala de atrocidades cometidas por soldados, até contra os seus povos.

Como escrevem Aniceto Afonso e Carlos de Matos na apresentação do I volume de Portugal e a Grande Guerra (obra que o PÚBLICO tem vindo a editar, em banca, junto com o jornal): “Todos pensaram a guerra como uma acção rápida, fulminante, com a ideia de ‘passar o Natal em casa’. Contudo, não fosse o Armistício ter sido assinado em 11 de Novembro de 1918, as tropas teriam passado cinco Natais nas trincheiras. Mesmo tendo sido quatro, oito milhões e meio de vítimas ficaram nos campos de batalha, por onde passaram mais de sessenta milhões de homens” [seriam 110 milhões em 1939-45]. Números terríveis, que têm por detrás de si muito passos evitáveis. Aprender com eles, a propósito da I Guerra ou de outras, é acautelar o futuro. E, com todos os erros e crimes cometidos noutras guerras pelo globo, evitar um novo “monstro” à escala planetária.

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